Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, dezembro 11, 2012

Impaciências - JOSÉ PAULO KUPFER


O Estado de S.Paulo - 11/12


É possível encontrar método no que alguns consideram loucura, na condução da política econômica pelo governo Dilma Rousseff. São, sem dúvida, tiros para muitos lados, fora de uma moldura clara de reforma abrangente, passíveis de dar suporte a visões de que se trata apenas de uma hiperatividade voluntarista e reativa.

Mas essa pode ser uma maneira no mínimo incompleta de enxergar o momento em que se encontra a economia brasileira.

Acompanhar a transição de um modelo de crescimento concentrado em estímulos ao consumo e nas receitas de exportações de commodities para outro, focado em ampliação dos investimentos e busca de competitividade, não é tarefa tão trivial. Isso fica claro quando se observa que há consenso sobre o diagnóstico, mas resta enorme dispersão de pontos de vista em relação às ações para implementá-lo. O fato de que tantos impulsos teimem em não se transformar em resultados positivos torna a avaliação ainda mais complicada.

Era de se supor que, em tal contexto envolto em névoas, alguma dose de paciência operasse como elemento catalisador das análises. Esse, no entanto, é o item mais escasso do momento.

Há, de um lado, uma carga pesada de impaciência em relação à gestão do governo na economia. Mas, de outro, também é inegável que a impaciência domina a ação e o discurso do governo, explicitamente liderado pela própria presidente.

A reação de Dilma à impaciente reportagem da revista The Economist, que classificou o crescimento brasileiro como "moribundo" e sugeriu que a presidente demitisse o ministro Guido Mantega, por exemplo, foi de uma impaciência a toda prova.

A revista tem sido regularmente afoita nas suas análises sobre a economia brasileira, recorrendo com frequência ao método bem conhecido e em geral arriscado de ir contra a direção do vento, nas avaliações de conjuntura.

Foi assim, por exemplo, na famosa capa "O Brasil decola", de fins de 2009, quando antecipou a explosão de crescimento de 2010 - algo que não passava de um ponto fora da curva e não se sustentava, como a própria revista anotou, com o passar do tempo, em várias edições seguintes.

Existe também visível impaciência no "estilo Dilma" de estimular os investimentos e atacar os gargalos da infraestrutura. Já ficou claro, depois da definição de novos marcos regulatórios e processos de licitação nos setores de energia elétrica, portos, ferrovias, rodovias e aeroportos, o formato do modelo de ação que perpassa, guardadas as especificidades, todas as reformas anunciadas. São repetições da linha de ação que, de certo modo, teve início com o roteiro desenvolvido para reduzir juros e spreads bancários.

Pouca conversa, muita pressão para reduzir tarifas, com recurso para tanto a entes estatais, centralização da gestão, isenções de tributos e linhas de financiamento especiais.

Em idioma simples, um modelo de queda de braço, com base no pressuposto de que as resistências a baixar preços cruciais no esforço de recuperação da competitividade da economia dificilmente serão vencidas apenas com sorrisos e somente incentivos de linha.

Verdade que é preciso tirar setores inteiros da zona de conforto - e ineficiência - a que se habituaram em épocas de rentabilidade extraordinária. Mas, se a causa tem sua nobreza, os riscos do modelo não são pequenos.

Muito fina é a linha que separa o sucesso de uma estratégia de forçar a queima de gorduras, que oneram os custos de produção e a competitividade econômica, do desastre da determinação de taxas de retorno e de compensações irrealistas, capazes de inviabilizar investimentos em manutenção e ampliação dos negócios.

São muitos os efeitos colaterais nocivos que dormitam nessa fronteira tênue. Um deles seria ter de transferir para o Tesouro e para as contas públicas uma carga excessiva de responsabilidade na redução dos custos de produção. Outro, mais grave, seria disseminar a percepção de que estaria aumentando o custo institucional de investir em infraestrutura no Brasil.

O caminho do embate não parece representar uma alternativa para atender ao objetivo de assegurar menores custos de produção sem atropelar a própria viabilidade das operações. Mais negociação - e, portanto, menos impaciência - é de longe a melhor saída.

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