REVISTA ÉPOCA
O crescimento irrisório da economia transformou o ministro da Fazenda em anedota - e não demoveu Dilma de sua visão ideológica ultrapassada
Herdeira de uma economia em expansão em 2010, a presidente Dilma Rousseff chega à metade de seu mandato numa situação medíocre. Embora o desemprego esteja baixo e a massa de salários continue em alta - fatos que explicam a alta aprovação popular de Dilma - nossa economia está em situação de risco.
O índice de crescimento tem rotineiramente sido acompanhado do adjetivo "pífio". No terceiro trimestre de 2012, foi de 0,6%, metade do que o governo esperava. Isso sepultou as esperanças de uma virada antes do fim do ano. Numa iniciativa destinada a transformar-se em anedota, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, sugeriu que o IBGE modificasse as regras de cálculo do PIB - uma tentativa de manipulação tão estapafúrdia quanto inábil. Sua demissão foi recomendada por ninguém menos que a revista britânica The Economist- leitura de cabeceira de Dilma, publicação que não cansou de publicar artigos favoráveis a seu governo nos últimos anos.
duzira a previsão de crescimento anual de 2% para 1,5%, Mantega reagiu com brutalidade: "É uma piada". Agora, uma análise do Itaú, nem de longe a mais pessimista, anuncia 0,9% em 2012.
Esses índices são preocupantes. Dilma enfrenta dificuldades que seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, não teve de enfrentar: a queda no valor das commodities, o esgotamento do modelo de crescimento à base de consumo e crédito barato, e a incapacidade de incorporar mais força de trabalho a uma economia que funciona virtualmente a pleno emprego. Some-se a isso a dificuldade das autoridades econômicas para enxergar o que acontece no Brasil real. O índice de 0,6% veio após meses de ativismo febril, quando, semanalmente, eram lançados em média dois pacotes de estímulo, segundo o economista Armando Castellar, da Fundação Getulio Vargas.
Nossa economia não voltará a crescer sem aumentar sua produtividade e seus níveis de investimento - hoje eles estão em torno de 19% do PIB, ante 30% no Peru e 27% no Chile e na Colômbia. Para isso, é preciso acabar com os entraves que emperram qualquer negócio: impostos extorsivos, burocracia infernal, infraestrutura precária e leis trabalhistas e previdenciárias anacrônicas.
Nesse ponto, Dilma tem uma desvantagem em relação a Lula. Enquanto ele era pragmático para tomar suas decisões econômicas - agradava a pobres e banqueiros -, Dilma tem convicções ideológicas paralisantes. Seu dirigis- mo econômico não favorece o diálogo com os auxiliares nem negociações produtivas com os empresários, que não mostram a indispensável disposição de arrriscar nas atuais condições de temperatura e pressão.
Da redução da taxa de juros, em agosto de 2011, à desoneração da folha de salários da construção civil, na semana passada, é possível elaborar uma lista de boas intenções do governo. Mas a falta de diálogo impede o resultado esperado. No maior exemplo, o Planalto fracassou num projeto que deveria agradar a 100% dos brasileiros: reduzir a conta de energia elétrica em 20%. A dificuldade de diálogo com os empresários deriva da dificuldade que Dilma tem para entender que apenas se lucrarem as empresas investirão. E, sem empresas lucrando e gerando riqueza, não há como o país crescer mais. Ao mesmo tempo tão simples - e tão difícil...
O paradoxo dos presídios paulistas
As penitenciárias de São Paulo vivem uma situação absurda. Em vez de funcionar como um local onde criminosos condenados pela Justiça cumprem suas penas em regime fechado, sem contato com o mundo exterior, elas se transformaram no Q.G. do crime organizado. Instalados em suas celas, munidos de telefones celulares, os principais chefes de facções criminosas dirigem os subordinados que atuam do outro lado das grades. Comandam o tráfico de drogas, extorquem famílias de prisioneiros rivais, planejam assassinatos de policiais e negociam armamento pesado com outras organizações, conforme demonstrou reportagem de ÉPOCA publicada na semana passada.
Nesse universo paradoxal, a vida dos chefes de quadrilha parece mais segura, do ponto de vista operacional, quando eles se encontram sob proteção do Estado do que fora dali, quando se expõem ao confronto direto com outras facções criminosas e podem mesmo enfrentar a violência da polícia. A causa dessa situação é menos misteriosa do que parece. Consiste, basicamente, num sistema capilar de corrupção, que transforma os presídios brasileiros num dos mais vulneráveis do mundo.
A consolidação da facção PCC como principal organização criminosa de São Paulo só foi possível graças a uma sucessão de erros. Acreditou-se, numa primeira fase, que seria melhor negociar concessões com a quadrilha do que lhes dar um combate sem quartel. Noutra etapa, vendeu-se a ilusão de que o PCC estava tão enfraquecido com a prisão dos líderes mais conhecidos que se tranformara numa "lenda". As duas atitudes estavam erradas. O crime organizado só pode ser enfrentado com dureza. Isso começa pelo isolamento real dos líderes. Isso implica, acima de tudo, transformar os presídios em prisões de verdade.