O GLOBO - 28/08
Se a sociedade evolui à frente de normas legais, regras que se relacionam de forma direta com a organização social precisam ser atualizadas, de tempos em tempos. Um exemplo cristalino são os sistemas previdenciários, dependentes de maneira crucial do perfil demográfico das populações, e, por isto, sempre revistos para que possam continuar a ser financiados de forma não inflacionária.
Com uma vida crescentemente mais longa, os segurados tendem a manter gastos previdenciários por mais tempo, um problema para os governos, pois é necessário encontrar fontes de custeio para estas despesas. No Brasil, a questão é mais grave, porque a carga tributária no país (36% do PIB) já está acima do razoável.
Série de reportagens do GLOBO sobre novos arranjos familiares traz exemplos de mudanças na sociedade com impacto direto no sistema previdenciário. O constante nas novas famílias é o número menor de filhos, comprovado pelos censos do IBGE.
Em 1940, a mulher brasileira tinha, em média, seis filhos. Hoje, menos de dois. Cresce, também, o número de casais que optam por não ter filhos. Eles já são dois milhões e representam 16% do total das famílias brasileiras.
A demografia e as mudanças sociais pressionam, portanto, a Previdência também pelo lado da receita, com a tendência de haver uma diminuição de contribuintes. Mais despesas, e receitas sem condições de crescer na mesma proporção dos gastos, são fórmula eficaz da falência.
É por isso que o Brasil procura seguir o caminho de países europeus e fazer uma reforma no sistema do INSS, para rever a possibilidade da aposentadoria por idade, conceito anacrônico, em desuso no mundo.
O Brasil, mesmo com uma população mais jovem, tem um gasto previdenciário em relação ao PIB de país maduro europeu (na faixa dos 10%). Já estamos, então, atrasados na tarefa do inexorável ajuste no INSS.
Mas os desequilíbrios previdenciários nacionais não estão apenas na aposentadoria. Não há país que pague pensões tão generosas quanto o Brasil, alertou em artigo recente o economista Fabio Giambiagi, especialista no tema. Só no Brasil a pensão é 100% do benefício recebido pelo segurado. Não é feito um ajuste que, sem penalizar o pensionista, impeça o desequilíbrio a galope do sistema.
Ao contrário do que o discurso populista defende, não há qualquer injustiça em impedir que pensões descabidas continuem a ser pagas - as em vigor não podem ser alteradas, por constituírem direito adquirido. O resultado é que o custo das pensões já chegou a 25% do total dos gastos previdenciários.
Está em jogo uma questão mais ampla de justiça social: a própria sobrevivência do INSS. As pensões não podem ficar ao largo da reforma do sistema.