O ESTADO DE S. PAULO
Sempre que o dólar desliza no câmbio interno aparecem empresários e economistas pregando a adoção de restrições à entrada de capitais.
O diagnóstico é o de que esses capitais vêm só especular, derrubam as cotações do dólar no câmbio interno e tiram competitividade do produto brasileiro. Por um simples efeito da lei da oferta e da procura, mais moeda estrangeira estimula o produto importado e prejudica as exportações.
Há vários instrumentos que podem desestimular a entrada de moeda estrangeira. Pode-se, por exemplo, impor uma quarentena, ou seja, deixar os recursos parados sem render nada em um banco ou no Banco Central. Pode-se cobrar pedágio (imposto) que reduzirá a rentabilidade nas aplicações feitas por esse capital. Pode-se, ainda, exigir que só sejam investidos nas modalidades previstas pela política de governo.
Em geral, essas restrições não funcionam, ou porque são inócuas ou porque têm efeitos colaterais mais prejudiciais do que o que se pretende evitar. São inócuas porque a globalização inventou e vai inventar mil atalhos que permitem o drible dos capitais a essa marcação.
Mas vamos falar dos efeitos colaterais indesejados. Não dá, por exemplo, para taxar a entrada de capitais de longo prazo, porque são investimentos. O Brasil é uma economia de baixo índice de poupança (cerca de 18% do PIB) e precisa de muito investimento estrangeiro. Tem vários projetos para tocar, tem o pré-sal a explorar, uma enorme infraestrutura a desenvolver e muito emprego para criar. Não pode inibir a entrada de capitais de longo prazo.
Também não se pode prejudicar a entrada de recursos no mercado de ações, porque as empresas brasileiras precisam reforçar seu capital e isso só se consegue com desenvolvimento do mercado secundário de ações (Bolsa), que abre o caminho para novas subscrições aqui e no exterior. Restringir as aplicações na Bolsa seria condenar a empresa brasileira ao nanismo.
O ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira, por exemplo, é um dos que defendem a taxação da entrada de capitais porque entende que o Brasil sofre de doença holandesa. O problema é que, se o mal é a doença holandesa, não pode ter como remédio a taxação de capitais. Doença holandesa é o forte crescimento das exportações de produtos primários (commodities) num volume tal que provoca grandes superávits comerciais, e essa entrada de dólares derrubaria o câmbio, que, por sua vez, tiraria competitividade do produto industrializado. Se fosse para combater a doença holandesa, seria preciso restringir exportações, e não a entrada de capitais.
Mas, em geral, quem quer barrar a entrada de capitais está pensando no afluxo de recursos de curto prazo que vêm para cá, dão uma beliscada e logo vão embora. Restringir esses capitais parece bobagem porque, se são de curto prazo, permanecem pouco tempo por aqui. Na entrada, podem derrubar o dólar no câmbio interno, mas, se forem logo embora, contribuirão, também no curto prazo, para a reversão da excessiva valorização do real.
Por isso, é preciso desconfiar sempre dessas providências artificiais, que não resolvem nada.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, garante que o governo não estuda medidas desse tipo, seja porque podem prejudicar os investimentos para o crescimento econômico, seja porque não há entrada significativa de capitais de curto prazo.
ConfiraUm ano - O estouro da bolha financeira que iniciou a crise global completa um ano. É cedo para conclusões. O que se pode dizer é que nunca o contra-ataque a crises teve tantos recursos e participação do Estado.
As crises anteriores, principalmente a Grande Depressão dos anos 30, foram consideradas devastadoras porque não houve pronta ação dos Tesouros e dos bancos centrais.
Mas não está nem um pouco claro se a pronta intervenção do Estado e a nunca vista injeção terão só consequências positivas. O medo que prevalece é o de que provocarão inflação e destruição de patrimônio
Entrevista:O Estado inteligente
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