The Guardian |
O Estado de S. Paulo - 30/06/2009 |
Na semana passada, testemunhamos um acontecimento incomum: a comunidade internacional, reunida na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) para debater a crise mundial e seu impacto sobre países em desenvolvimento, chegou a um acordo consensual. Isso definiu os temas que seriam abordados e estabeleceu um novo rumo para o avanço dos debates. Muitos disseram que seria difícil formar um consenso entre 192 países e, por isso, as negociações deveriam se restringir a um grupo de 20. Mas o acordo da ONU foi mais forte e efetivo do que o comunicado emitido pelo G-20. Foi também uma demonstração da importância de um processo inclusivo: o G-192 estava disposto a levantar questões que a política interna do G-20 trataria com excessiva sensibilidade. Por exemplo, enquanto o G-20 concentrou atenções no papel do sigilo bancário nos casos de evasão fiscal, o acordo da ONU destaca a corrupção. O G-20 reconheceu a necessidade de uma resposta global à crise. Mas as reações ocorrem em nível nacional, e com frequência deixam de levar em conta o efeito sobre os demais países. Além disso, países em desenvolvimento não dispõem de recursos adequados para lidar com a crise. O G-20 se comprometeu a oferecer um auxílio generoso, principalmente por meio do FMI. Mas o grupo não deu a devida atenção aos riscos que os países pobres assumem ao solicitar mais empréstimos - em parte pelo histórico do fundo de exigir que os seus devedores adotem medidas procíclicas contraproducentes. Os participantes da conferência da ONU enfatizaram a importância de um maior financiamento filantrópico. As centenas de bilhões (talvez até trilhões) de dólares empregados no resgate dos bancos conferiram uma nova perspectiva aos gastos governamentais. Esse processo faz as alegações de falta de fundos para financiar a assistência ao desenvolvimento soarem falsas. Mas os países em desenvolvimento enfrentam não apenas a restrição de dinheiro como também a falta de "margem política" para aplicar as medidas solicitadas. A reunião concluiu: "Os países precisam da flexibilidade necessária à aplicação de medidas contracíclicas e à busca de respostas desenvolvidas sob medida como resposta à crise." Entre os fatores que contribuíram para a crise estão antigos desequilíbrios globais, cuja fonte, entre outras, foi o sistema global de reservas estrangeiras com base no dólar. Isso contribui para uma insuficiência na demanda agregada global, e tal insuficiência pode impedir a retomada mundial de ter um crescimento robusto. Apesar de a reunião da ONU não ser a melhor ocasião para estabelecer um novo sistema, ela reconheceu a necessidade de "estudos mais aprofundados sobre a praticidade e as vantagens de um novo e mais eficiente sistema global de reservas estrangeiras". Não é de se surpreender que alguns países detentores de vastas reservas de moeda estrangeira tenham demonstrado sua preocupação diante do sistema atual, com seu baixo retorno e alto risco - crescendo com a dívida americana cada vez maior, e com o inchaço do balanço patrimonial do Federal Reserve. A reunião da ONU sublinhou a necessidade de reformas na gestão das instituições econômicas internacionais - algumas das quais pressionaram pela adoção de medidas de liberalização do mercado financeiro e do mercado de capitais que foram, em parte, responsáveis pela crise e pela sua rápida difusão. Mas também abordou temas controvertidos de grande importância para os países em desenvolvimento, como a migração. A reunião da ONU refletiu aquilo que já se tornou um consenso global: "A crise atual se formou por meio de um equívoco inicial na apreciação da dimensão do risco acumulado nos mercados financeiros e do potencial de desestabilização que representava para o sistema financeiro internacional e para a economia global..." Mas o debate destacou os lapsos das propostas de reforma do sistema regulador - a relutância de alguns países em agir contra os bancos considerados grandes-demais-para-falirem. Apesar de todos falarem em transparência, alguns participantes demonstraram sua preocupação diante de mudanças na contabilidade norte-americana que pioraram a situação. A conclusão mais importante pode ser também a mais óbvia: "A crise atual sublinhou o grau de integração das nossas economias, a indivisibilidade do nosso bem-estar coletivo e a insustentabilidade das metas estreitas que buscam ganhos no curto prazo". Permitimos que o ritmo da globalização econômica ultrapassasse o da globalização política - não contamos com as instituições e nem com a mentalidade para responder coletivamente de uma maneira capaz de promover o bem-estar de todos. A reunião da ONU representou um avanço pequeno, mas importante. *Joseph Stiglitz é Nobel de Economia e presidente da comissão de especialistas em reformas do sistema monetário e financeiro internacional da ONU |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, junho 30, 2009
Joseph Stiglitz,Acordo sobre a crise é um pequeno avanço
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