Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, maio 01, 2009

Congresso O fim da mordomia aérea

SINAIS DE VIDA

Os deputados finalmente reagem à pressão da opinião
pública e correm a disciplinar a farra das passagens aéreas


Diego Escosteguy

Ed Ferreira/AE
ESPASMO O presidente da Câmara, Michel Temer: ato mostra que os deputados ainda preservam alguma sensatez


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Chore por nós, senador (29/4/2009)

Foi preciso uma avalanche de revelações sobre toda sorte de prevaricações seguida de uma vigorosa reação da opinião pública para que, finalmente, na semana passada, os deputados dessem sinal de que não vivem em Marte. Na terça-feira, numa tensa reunião a portas fechadas, depois de ainda tentarem pôr a culpa na imprensa e na opinião pública, os líderes da Câmara dos Deputados anunciaram o fim da farra com as passagens aéreas pagas pelo contribuinte. A partir de agora, os senhores deputados estão proibidos de usar dinheiro público para custear viagens de namorada, esposa, filhos, amigos, seja no Brasil ou ao exterior. O presidente da Câmara, Michel Temer, assinou um ato limitando o uso das passagens a parlamentares e assessores. A decisão merece tímidos aplausos. A Câmara manteve, por razões que agridem as leis da física, a cota de passagens aéreas para os deputados do Distrito Federal. Também anistiou os parlamentares que embarcaram na farra. Apesar da natureza estritamente pragmática do ato da Câmara, cuja origem se encontra no instinto de preservação política dos parlamentares, e não em qualquer vestígio de preocupação republicana, a proibição é um bom sinal. Um sinal de que ainda existe uma réstia de vínculo entre a vontade dos eleitores e as atitudes de seus representantes.

Nenhum deputado ilustra com mais nitidez a força desse pequeno vínculo do que o pernambucano Silvio Costa, do PMN, um daqueles micropartidos que habitam as beiradas da Câmara. Nas últimas semanas, desde que a imprensa começou a revelar a nova safra de pilantragens dos deputados, Silvio Costa emergiu como o Dom Quixote do baixo clero, provando o valor do seu braço na defesa incondicional dos privilégios de seus pares. Depois de ser hostilizado em Pernambuco, resolveu mudar o comportamento e apoiar as restrições anunciadas. Diz que está arrependido: "Eu estava falando com o meu coração, mas percebi que fiz besteira". Prometendo não fazer mais besteiras, a cúpula da Câmara montou uma comissão para estudar cortes adicionais nas despesas da Casa. Um grupo de parlamentares ficou encarregado de entregar resultados em um mês. À primeira vista, a medida pode parecer louvável, mas é preciso cautela.

Em Brasília, quando alguém fala em coisas como "montar uma comissão" para "estudar o assunto", é grande a chance de não dar em nada. Designou-se como chefe dessa comissão o deputado tucano Rafael Guerra, de Minas Gerais, primeiro-secretário da Câmara – uma espécie de síndico da Casa. Ele garante que a comissão não é apenas fumaça e espelho para iludir a plateia: "Vamos propor redução de gastos e transparência total". Uma das propostas que encabeçam a pauta é o aumento do salário dos deputados, que passaria dos atuais 16 500 para 24 500 reais, como forma de compensar as perdas com o corte de "extras", entre as quais as cotas de passagens e as verbas de gabinete. A promessa de discutir o reajuste foi uma forma de aplacar os ânimos dos parlamentares do chamado baixo clero – uma turma nanica que já consegue confundir-se com a imagem do próprio Congresso. São pequenos avanços rumo à moralidade e à racionalidade e já quase podemos dizer a eles: bem-vindos ao planeta Terra!

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