O Globo - 27/05/2009 |
As minorias organizadas estão em destaque no Congresso. Na Câmara, a utilização da tática da obstrução parlamentar serviu para controlar a tentativa da maioria numérica de se impor, acima das negociações políticas. No Senado, a mesma tática, se não serviu para mudar a postura inflexível do governo de controlar com mão de ferro a CPI da Petrobras, dará à minoria oposicionista instrumentos de retaliação política. Na Câmara, o projeto de lista fechada com financiamento público de campanha foi enterrado diante da postura firme de oito partidos da base do governo, entre eles o PSB, PCdoB e PDT, que se dispunham a obstruir os trabalhos enquanto não fosse firmado um compromisso de que PT e PMDB, as maiores legendas da base, não tentariam aprovar mudanças eleitorais com o apoio da oposição. DEM e PPS estavam empenhados na aprovação do voto em lista fechada, e o PSDB se preparava para aderir ao movimento, quando a pressão dos pequenos e médios partidos governistas implodiu a manobra. No Senado, o DEM, ao ser informado de que o PMDB não mantinha a proposta de dar a presidência da CPI da Petrobras à oposição, anunciou que se manterá em obstrução, como maneira de responder ao rolo compressor governista. A votação do Fundo Soberano, importante para o governo, estava ameaçada pela posição da minoria no Senado. Se continuar sem ser votado até o dia 1º de junho, perde a validade. Ontem, por exemplo, nenhum dos integrantes dos oito partidos que se rebelaram na base do governo contra a lista fechada assinou presença na Câmara enquanto estavam reunidos com os líderes do governo e do PT para resolver a situação. Com isso, deixaram claro que não estavam preocupados em perder eventual remuneração da sessão, pois nem sequer comunicaram formalmente à Mesa da Câmara que estavam em obstrução. "Entrar em obstrução" na linguagem parlamentar significa se ausentar do plenário para impedir que as votações prossigam, por falta de número mínimo. Ou impedir votações com recursos regimentais que prorroguem indefinidamente a sessão. "Fazer obstrução" é uma manobra prevista nos regimentos internos da Câmara e do Senado, assim como nas diversas casas legislativas regionais. É uma maneira de demonstrar que a maioria numérica não se sobrepõe à negociação política, que nem sempre funciona a tese do mais forte esmagar o eventualmente mais fraco. Isso já foi chamado de "ditadura das minorias", mas é uma manobra política legítima para impedir que a maioria esmague a minoria, assim como a CPI é um instrumento típico da oposição. No Senado, onde a maioria governista é mais frágil ainda que na Câmara, o Palácio do Planalto está tentando controlar a CPI da Petrobras para não ter surpresas, abrindo mão de uma tentativa de negociação com a oposição para que os trabalhos da Comissão não se transformem em uma luta sangrenta às vésperas da eleição. Na Câmara, a maioria esmagadora do governo cindiu diante da polêmica das listas fechadas, e deu-se um fato curioso: o PT e o PMDB unindo-se ao DEM e ao PPS, com o apoio possível do PSDB, teriam maioria para aprovar as mudanças. Mas o governo perderia sua maioria, com muitos partidos pequenos e médios ameaçando partir para a retaliação parlamentar. A insegurança política seria tremenda, mesmo que conseguissem aprovar os pontos da reforma que queriam, como o voto em lista e o financiamento público de campanha. A saída política para o impasse foi tentar aprovar, ainda nesta legislatura, uma emenda constitucional dando ao Congresso a ser eleito em 2010 poderes constituintes em relação à reforma político-eleitoral, enumerando os artigos da Constituição que poderão ser revistos. Mesmo essa mudança dificilmente encontrará consenso para ser aprovada, e o mais provável é que fique para o próximo Congresso a decisão sobre o que mexer para realizar a reforma política. No Senado, o impasse sobre o controle político da CPI da Petrobras não inviabilizará sua implantação. A oposição decidiu participar dela mesmo com o governo controlando a convocação de testemunhas e dando o rumo às investigações. Se o governo achou que com a exigência de ter o comando da CPI a inviabilizaria, enganou-se, mesmo que a mobilização de setores dos chamados "movimentos sociais" em vários pontos do país possa preocupar setores da oposição. O senador José Agripino Maia, líder do DEM, acha que coonestar uma CPI "chapa branca", em que nada será investigado, só desgastará a oposição. Mas conta com o que chama de "evidências dos fatos" e com a opinião pública para tentar mudar a maioria governista em eventuais votações contra o governo. Na verdade, a decisão da oposição de participar de qualquer maneira da CPI, ao mesmo tempo em que obstrui no plenário matérias de interesse do governo, deixou a maioria em uma situação delicada, pois interessaria aos governistas atrasar ao máximo a instalação da CPI, quem sabe até jogando para o segundo semestre o começo dos trabalhos. A convocação do recesso em julho serviria para esfriar os ânimos políticos, sendo quase certo que o presidente do Senado, José Sarney, um aliado de primeira hora do governo, não autorizará o funcionamento da comissão no período de recesso. Participar de uma CPI que terá um amplo controle do governo, sem muita convicção sobre seu resultado, não é uma boa perspectiva política para a oposição. Mas os choques entre PT e PMDB, que não foram superados, podem abrir brechas na armadura governista no decorrer dos trabalhos da CPI. |
Entrevista:O Estado inteligente
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