Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 17, 2009

O que querem a Fiesp e os sindicatos

Acordo de vida curta

Como uma negociação para reduzir salários e preservar empregos se transformou em histeria contra os juros do Banco Central


Cíntia Borsato

Paulo Pinto/AE

JOGO DE CENA
Sindicalistas e representantes dos empresários se encontram na Fiesp. A proposta de acordo só durou dois dias

No início da semana passada, sindicalistas e empresários pareciam ter dado um raro exemplo de pragmatismo e serenidade diante do fantasma do desemprego. Depois de uma reunião na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), na tarde de terça-feira 13, a Força Sindical e outros representantes de empregados aceitaram discutir um acordo para reduzir os salários e as horas trabalhadas (a CUT negou-se a participar). A notícia ganhou as manchetes dos principais jornais do país, mas teve vida curta. Na quinta-feira, a Força Sindical voltou atrás e decidiu suspender por dez dias as "negociações em andamento". Os sindicalistas, então, pediram para entregar ao presidente Lula uma lista de reivindicações – a principal delas, a redução imediata da Selic, a taxa de juros definida pelo Banco Central. A Fiesp, em vez de lamentar a chance perdida ou criticar o comportamento volátil dos sindicalistas, engrossou o coro da crítica aos juros do BC. O balé transformou-se no conhecido carnaval de lamúrias que normalmente antecede a reunião periódica do Comitê de Política Monetária (Copom), responsável pela definição da Selic, hoje em 13,75%.

Por mais que trabalhadores e empresários tenham o direito de protestar contra o Banco Central, o Copom é uma instância eminentemente técnica que tem como objetivo manter a inflação sob controle. É assim que tem ocorrido, com sucesso, desde a introdução do sistema de metas inflacionárias, há exatos dez anos. A eventual alteração nos juros será decidida nesta quarta-feira. A expectativa, segundo economistas, é que ocorra uma redução da taxa. "As queixas de empresários e centrais sindicais seguem uma lógica que não é necessariamente técnica", diz o ex-presidente do BC Gustavo Loyola. "Se o BC se curva diante desse tipo de pressão, ele não faz uma política monetária que atenda aos interesses do país no longo prazo." Isso sem contar o óbvio. A mera redução da Selic não significa juros menores para os tomadores de crédito. A taxa definida pelo BC é uma referência, mas outros fatores são levados em conta. Desde setembro, por exemplo, a Selic permanece estável em 13,75%. Isso não impediu que os bancos brasileiros, atingidos pela crise externa, subissem os juros cobrados das empresas e dos consumidores (veja o quadro).

Redução de jornada e de salários é um recurso extremo em tempos de crise. Quando os choques do petróleo de 1973 e 1979 provocaram uma retração de 13% no comércio internacional e fizeram o desemprego na Europa quase triplicar, o governo britânico determinou que a indústria funcionasse apenas três dias por semana. O Brasil ainda não chegou a esse ponto. O desemprego passou de 7,5% para 7,6% em novembro (os números de dezembro ainda não foram fechados) e a economia brasileira está entre as poucas com projeção de crescimento no mundo para este ano. De qualquer maneira, o país registrou uma forte desaceleração no fim de 2008 e, de acordo com estimativas preliminares do governo, mais de 600 000 postos de trabalho formais foram cortados em dezembro. Para o economista Fábio Romão, da LCA Consultores, a renegociação de contratos seria a maneira mais eficiente de preservar o maior número possível de vagas, até que a crise ceda: "É melhor reduzir os dias de trabalho e investir em qualificação profissional para evitar o desemprego". Ex-sindicalista, o presidente Lula tem todas as credenciais para julgar a conveniência dessa proposta. Só não se deve usá-la como forma de coagir o Banco Central.

Com reportagem de Benedito Sverberi

 
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