PSDB dividido
O que se pode esperar de um partido que tem os governadores de dois dos principais estados do país como potenciais candidatos à sucessão de Lula em 2010 e lhes nega apoio num momento crucial como o da votação da prorrogação da CPMF? Por outro lado, o que dizer de um partido cujos principais governadores negociam abertamente com o governo ao qual deveriam fazer oposição, contra a posição unânime de sua bancada no Senado, que conta entre seus membros com o próprio presidente da legenda?
Este é o paradoxo político com que os principais líderes do PSDB estão tentando lidar, na ressaca da votação da madrugada de quarta para quintafeira, quando o partido aplicou talvez a maior derrota política no governo Lula, uma vitória incontrastável, mas que, na definição do governador de Minas, Aécio Neves, pode vir a ser uma vitória de Pirro, aquela em que o desgaste é tão grande que acaba derrotando o vencedor.
Por esses sortilégios da política, a divisão partidária que se temia ser provocada pela disputa entre os governadores Aécio Neves, de Minas, e José Serra, de São Paulo, os dois postulantes a candidato à Presidência da República, acabou acontecendo por obra dos senadores do partido, que se recusaram a seguir a orientação dos governadores a favor da CPMF.
Quanto a Serra e Aécio, formam até o momento uma dupla afinadíssima, que já está sendo acusada de querer repetir a política do café com leite, que dominou a cena nacional na República Velha, dividindo o poder político do país entre São Paulo e Minas.
Nos primeiros momentos depois da vitória política sobre o governo, os dois lados continuam vendo os acontecimentos por óticas distintas.
O senador Arthur Virgílio, um adepto da candidatura do governador José Serra à Presidência, já não mantém a mesma afinidade com seu candidato a partir de discordâncias profundas no encaminhamento das negociações sobre a CPMF. As versões dos desentendimentos são desencontradas, os dois garantem que não chegou a haver agressões verbais de parte a parte, mas o fato é que no momento não há condições de diálogo entre eles.
Virgílio está convencido de que o PSDB amanheceu na quinta-feira como um novo partido, exorcizando a fama de ficar em cima do muro, exercendo seu papel de oposição de maneira altiva.
A reação da opinião pública é amplamente favorável, na avaliação inicial do senador, e, segundo ele, os governadores verão que, a médio e longo prazo, ganharão consistência política na campanha sucessória.
“Só não quero acreditar que meu candidato seja ingênuo a ponto de acreditar que Lula o está elogiando com sinceridade. Aí seria o caso de procurar outro candidato”, diz Virgílio, referindo-se ao discurso em que Lula elogiou em público a atitude do governador José Serra.
Os governadores, ao contrário, acreditam que não há o que comemorar, e dizem sentir na pele as primeiras reações de frustração da população de seus estados diante do aumento da verba para a saúde que não mais virá. O governador de Minas, Aécio Neves, diz que o PSDB poderia ter saído dessa negociação com a bandeira de ter injetado mais dinheiro na saúde do país, obrigando o governo Lula a aceitar suas reivindicações.
Na análise dos governadores, enquanto os Democratas agiram dentro de seus objetivos políticos, marcando posição contra a alta carga tributária, o PSDB, que tem responsabilidades imediatas de poder e perspectivas futuras concretas, não deveria ter seguido a mesma inflexibilidade dos liberais.
Os tucanos não deveriam assumir o mesmo tipo de oposição que o PT exercia durante o governo de Fernando Henrique. “Nós tínhamos que ser o partido da responsabilidade e da eficiência administrativa”, argumenta o governador de Minas Aécio Neves, que disse que em alguns momentos da tensa sessão no plenário do Senado se sentiu deslocado em relação às posições radicalizadas que estavam sendo tomadas em nome do PSDB.
Já o senador Arthur Virgílio, um conhecido político passional que colocou sua alma na boca durante toda a sessão e se disse guiado por dois inspiradores, o expresidente Fernando Henrique Cardoso e o falecido governador Mario Covas, afirma que “o partido não existe para ajudar o governo, mas para ajudar o país.
E dar um basta nesta gastança irresponsável é uma maneira de ajudar o país”.
Ele acha que o partido não poderia ceder à maneira como o governo Lula negociou, sob pena de amanhecer “desfigurado, desmoralizado”, fazendo jus à fama de indecisão que o persegue. O governador Aécio Neves reconhece que houve uma vitória política de seu partido, mas desconfia de que ela, se não tiver más conseqüências, pelo menos não terá conseqüências duradouras que tragam benefícios ao partido. “Poderíamos colocar nossos prefeitos de todo o país anunciando que vencemos a batalha da saúde. Agora, podemos falar o que, que derrotamos o governo?”, pergunta.
A visão de Arthur Virgílio, que, ele garante, é majoritária no partido, é que, ao contrário, o PSDB saiu da disputa revigorado, mais respeitado pelo governo e pela população.
E adverte que se o partido for obrigado a obedecer às vontades dos pretensos candidatos à Presidência da República em nome de uma campanha que ainda nem se sabe como será, melhor seria procurar outras alternativas que não as colocadas previamente, pois do contrário o partido perderá sua capacidade de atuação.
Os governadores, por seu turno, acham que o partido terá que se adaptar às circunstâncias, e entenderá com o tempo que tem que se organizar levando em conta também a necessidade de promover condições para que os governadores façam boas administrações, mantendo assim a perspectiva de poder. Por isso, as bancadas no Congresso não podem agir em dissonância com os projetos de seus principais agentes políticos.
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