Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, dezembro 06, 2007

Dora Kramer - O alvo oculto




O Estado de S. Paulo
6/12/2007

Na articulação pela escolha do novo presidente do Senado, PT e PMDB atiram no que se pode ver, mas miram um alvo mantido convenientemente camuflado. No oficial, sustentam a candidatura do senador Garibaldi Alves, mas, no paralelo, trabalham para dissipar as resistências ao nome de José Sarney, o preferido dos caciques. Do Senado, dos dois partidos e do Planalto.

O assunto seria tratado ontem à noite em encontro do presidente Luiz Inácio da Silva com Sarney e o presidente do PMDB, Michel Temer, organizado pelo ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima. Na pauta, também, o reconhecimento de Temer como interlocutor do partido junto ao governo, em substituição a Renan Calheiros, que ficou com o mandato, mas não dispõe de reputação para continuar nessa posição.

Lula quer Sarney na presidência do Senado, o PMDB, à exceção do grupo de oposicionistas remanescentes, também, o PT - nas figuras de Aloizio Mercadante e Ideli Salvatti - trabalha fortemente por ele, o Democratas aceita, no PSDB Tasso Jereissati já funciona como seu cabo eleitoral, restando a resistência ainda firme do líder do partido, Arthur Virgílio.

O veto de Virgílio é a última barreira a ser transposta para a formação do único cenário no qual José Sarney admite transitar: senão a unanimidade, pelo menos o consenso da maioria.

Nessa situação é que a candidatura de Garibaldi Alves surge ainda como a mais cotada. Funciona como uma espécie de reserva para o caso de não dar certo o jogo em prol de Sarney. Ele já avisou a seus correligionários que não entra em disputas.

A aversão a situações de risco é conhecida em Sarney. Agora, acrescenta-se a ela o desejo dele de se preservar para o projeto de presidir a Academia Brasileira de Letras em 2008, ano nacional de Machado de Assis, em virtude do centenário da morte do escritor.

E por que a predileção por Sarney?

Porque os outros nos quais Lula depositaria confiança têm contas a prestar na Justiça. Tanto Romero Jucá, líder do governo, quanto Valdir Raupp são personagens de processos no STF.

A outra vantagem de José Sarney é que sua “unção” não produziria mágoas capazes de produzir riscos à votação da CPMF nos outros postulantes do PMDB.

Mas, como nada está bem resolvido, Garibaldi Alves - presidente da “CPI do fim do mundo” (bingos) em 2005 - continua a se dedicar com afinco às aulas do intensivão de governismo ministradas pela cúpula do PMDB.

Mímica

Não há mistérios nem divisões no PSDB quanto à CPMF. Ali cada um cumpre um papel: a bancada no Senado segue a posição da Câmara, fazendo jogo duro, pois compõe a face mais visível do partido; os governadores de menor peso político assumem a defesa explícita do imposto; as duas estrelas de grandeza solar, Aécio Neves e José Serra, põem um pé em cada canoa.

Defendem a CPMF para Lula - a fim de evitar retaliações aos Estados que governam -, mas também não interferem na posição dos parlamentares.

Força para isso teriam, como tiveram para influir na eleição da presidência da Câmara. Mas não querem - nem o partido quer - deixar passar uma rica chance de começarem a se destacar, por exemplo, marcando ausência na cerimônia de lançamento do PAC da Saúde.

Factual

O caso da garota estuprada na delegacia no Pará não “parece coisa de ficção”, como diz o presidente Lula. Parece exatamente o que é: um fato. Escabroso, produto da perda de sensibilidade geral para com a violência, da desvalorização da vida, da indiferença aos direitos, da crescente brutalidade dos espíritos e do absoluto descaso do poder público diante de seus deveres.

Entre os quais está o de indutor e condutor de ações para mudar situações adversas. Lula indignou-se a posteriori, mas não disse o que pensa sobre o problema nem indicou disposição de pôr seu cargo, sua figura, sua popularidade, sua capacidade de mobilização a serviço da causa. Dela, o episódio do Pará é mera, e não isolada, conseqüência.

À obra

Entre 57 países, o Programa de Avaliação Internacional de Estudantes põe o Brasil no 52º lugar em ciências, 54º em matemática e 49º em leitura.

Segundo o ministro da Educação, Fernando Haddad, a qualidade da educação não melhorará por obra e graça do divino. “Não cairá do céu.” Verdade.

Tampouco resultará apenas da destinação de mais dinheiro para o setor ou do conceito de “melhoria de gestão” posto de forma genérica.

Dependerá, sobretudo, de uma escolha: encarar, ou não, a questão educacional como assunto de segurança e desenvolvimento nacionais.

Não se faz isso sem primeiro acabar com essa história de que defesa de escolaridade é preconceito de classe.

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