Pela primeira vez, desde a década de 50,
São Paulo tem um dia sem assassinatos
Wanderley Preite
João Wainer/Folha Imagem |
UM POUCO DE PAZ |
A cidade de São Paulo viveu um dia histórico na sexta-feira 7 de dezembro: foram 24 horas sem um único assassinato. Fazia muito tempo que isso não ocorria. O último registro de um dia de paz como esse data da década de 50. A melhor notícia, no entanto, é que não se trata de um episódio fortuito: a cidade e também o estado de São Paulo vêm registrando índices declinantes de criminalidade. De 1999 para cá, a taxa de homicídios caiu 79% na capital e 69% no estado. Atualmente, contabilizam-se onze assassinatos por ano para cada 100.000 habitantes no estado (veja quadro), taxa bem inferior à do Rio de Janeiro e à do Brasil, de 39 e 22 mortos para cada 100.000 habitantes, respectivamente. Se o governo estadual conseguir reduzir esse número para dez homicídios – o que espera fazer já no ano que vem –, São Paulo passará a ter índices aceitáveis desse tipo de crime, segundo os padrões da Organização Mundial de Saúde.
Não se trata do único recorde no combate à criminalidade que o estado comemora. De janeiro último até sexta-feira passada, 280 municípios paulistas não haviam registrado nenhum homicídio. A melhor marca da década era a de 2004, ano em que 253 municípios ficaram sem assassinatos. O crime de homicídio foi um dos que mais caíram, mas não foi o único. Também sofreu forte redução a quantidade de latrocínios, roubos e roubos de veículos (veja quadro). Essa melhora nos indicadores da criminalidade se deve a um conjunto de medidas que o governo paulista começou a colocar em prática em 2000 e foi aprimorado na gestão do tucano José Serra. O marco inicial desse projeto é o Infocrim – sistema eletrônico que, inspirado no modelo nova-iorquino, interligou os distritos policiais da capital (e que, atualmente, inclui outros oito municípios do interior e litoral). Por meio da análise dos boletins de ocorrência lançados na rede pelas delegacias, policiais traçam um mapa detalhado de cada tipo de crime, incluindo informações como local e horário em que ele ocorre com mais freqüência, situações que costumam propiciá-lo e vítimas preferenciais. De posse desses dados, a polícia pode agir de modo mais cirúrgico. Os carros de patrulha, por exemplo, que antes rodavam a esmo, começaram a seguir uma rota determinada, e os cruzamentos de trânsito com maior número de assaltos receberam reforço na vigilância. Bairros como o Capão Redondo, na periferia da Zona Sul de São Paulo, tiveram os índices de homicídio reduzidos em 75%, depois que a polícia passou a realizar batidas sistemáticas em bares e outros locais que o Infocrim identificou como focos de crimes.
Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem |
O secretário de Segurança, Ronaldo Marzagão, ao lado do governador José Serra: ação policial firme e investimento em inteligência |
O investimento nas ações de inteligência (escuta telefônica, infiltração de policiais em quadrilhas, rastreamento dos criminosos e cruzamento de dados) foi responsável por uma das maiores vitórias recentes da polícia: a retomada do controle dos presídios, a prisão de mais de 400 membros de facções criminosas e a neutralização da maior delas, o Primeiro Comando da Capital – o hoje asfixiado PCC, que aterrorizou a cidade no ano passado com atentados que resultaram na morte de 152 pessoas. A favela Elisa Maria, na Zona Norte da capital paulista, era uma das áreas dominadas pela facção. Após um cerco que durou 81 dias, com um saldo de 105 prisões, ela registrou uma queda de 80% nos casos de homicídio. Melhor que isso: os índices não aumentaram depois que os policiais deixaram o lugar. Para o secretário de Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, isso se deve ao fato de o governo ter aliado à repressão ações de caráter social. "O estado ocupou rapidamente o espaço deixado pelos traficantes", afirma.
A favela recebeu um mutirão de dentistas para atender os moradores e foram organizadas palestras sobre saúde e planejamento familiar. Coube à prefeitura investir em calçamento e iluminação pública. "Substituir o assistencialismo do tráfico com ações eficazes de governo é uma prática mundialmente consagrada", avalia Robson Sávio, pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública. Reprimir o crime e fincar a bandeira do estado onde antes reinava a bandidagem é diferente de achar que políticas sociais, por si sós, são a panacéia para a criminalidade. Antes de mais nada, como prova São Paulo, é preciso unir ação policial firme a investimentos em inteligência.
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