Dispara o preço dos apartamentos da orla
de Ipanema e Leblon. Uma cobertura chega
a custar mais de 20 milhões de reais
Silvia Rogar
Divulgação/Kitty Paranaguá |
NOVINHA EM FOLHA |
Avenida Vieira Souto, em frente à Praia de Ipanema, no Rio de Janeiro, já teve dias melhores. Nela, agora passam ônibus e lotações para favelas. O calçadão, com pedras soltas e desníveis acentuados, precisa de uma boa recauchutada. Os postos de salvamento estão em petição de miséria, com banheiros quebrados e grades enferrujadas. Aos domingos, caminhões e kombis velhas se amontoam entre as duas pistas, poluindo a paisagem. Com toda essa degradação, era de esperar que a Vieira Souto sofresse uma desvalorização. Mas o que se dá é justamente o contrário. O metro quadrado mais caro do país valorizou-se sobremaneira desde o início do ano. No caso dos lançamentos, ele passou de 16.000 para quase 20.000 reais, um aumento de 25%. Na base de tudo, claro, está o fato de a Vieira Souto – e sua extensão, a Delfim Moreira, no Leblon – continuar linda de morrer, em mais uma prova de que as atrações do Rio parecem imunes aos maus-tratos que lhes são infligidos por cariocas e turistas. As razões de circunstância para tamanha valorização, contudo, não devem ser subestimadas. A primeira delas é o crescente número de estrangeiros à procura de um apartamento na orla de Ipanema, um subproduto da enorme liquidez no mercado internacional. Também cresceu bastante o número de brasileiros de outros estados que querem um lugar ao sol da Vieira Souto, estimulados pela queda das taxas de juro e pela abertura de crédito imobiliário para imóveis de luxo. Poucos apartamentos à venda e muita gente interessada e com dinheiro – eis aí um caso clássico de como a lei da oferta e da procura pode puxar os preços para cima.
Leonardo Costa/MCA Estúdio |
ILHA DE CONFORTO |
Entre os 159 prédios da avenida, o que inclui os imóveis comerciais, o endereço mais cobiçado é o Edifício Cap Ferrat (nome, aliás, do balneário francês com o metro quadrado entre os mais caros do mundo, o equivalente a 78.000 reais). Sua cobertura, um dúplex com 1.300 metros quadrados, foi arrematada há um ano. O comprador, que já morava no prédio, pagou 22 milhões de reais. Hoje, de acordo com corretores, o mesmo apartamento não sairia por menos de 25 milhões. Outras coberturas menos espetaculares não custam menos de 10 milhões de reais. Os estrangeiros pagam sem tentar regatear. "Dos cinqüenta apartamentos acima de 2 milhões de reais que minha empresa vendeu ao longo deste ano, oito foram para pessoas de fora do país", diz Paulo Cezar Ximenes, dono da Ximenes Consultoria Imobiliária, corretora especializada em imóveis de alto luxo.
Stephen Lovekin/Getty Images |
DESTINO DE FAMOSOS |
As pessoas jurídicas também entraram em cena com força. O desembarque de executivos europeus e americanos, que se mudam para o Rio para trabalhar principalmente na indústria de petróleo, fez com que aumentasse o número de multinacionais em busca de apartamentos na orla ipanemense. Os mais bem decorados e localizados atingiram cifras impressionantes, mesmo para aluguel. Um apartamento de 500 metros quadrados, que podia ser alugado por 7.000 reais mensais há uma década, está cotado hoje em 20.000 reais.
Um estudo recente sobre propriedades residenciais de primeira linha, feito pelo Citigroup em parceria com a consultoria britânica Knight Frank, aponta Brasil, China, Rússia e Índia como novas áreas a ser exploradas pelos ricos interessados em bons negócios imobiliários. O estudo levou em conta apenas quem tem mais de 10 milhões de dólares para investir. Entre esses milionários, a orla carioca começou a chamar atenção depois de entrar para o roteiro de personalidades da moda. "É verdade. Foi quando estilistas como Valentino, Calvin Klein e Narciso Rodriguez resolveram bater ponto no Rio que os olhos de todo mundo se voltaram para cá", diz o corretor Oswaldo Affonso de Castro.
Nos apartamentos mais chiques, vigoram o mármore italiano e projetos de iluminação de milhares de reais. Também não podem faltar poltronas do francês Philippe Starck e do brasileiro Sergio Rodrigues. Somente com acabamentos e decoração, os muito ricos costumam gastar mais 1 milhão de reais. "O ideal é fazer poucas intervenções, para não atrapalhar a paisagem", diz o arquiteto Sig Bergamin, autor de decorações normalmente barrocas. Não há comparação possível, entretanto, com os endereços mais caros do mundo (veja quadro) – e com o que há dentro deles em matéria de objetos de arte e bom gosto. O metro quadrado em bairros centrais de Londres, como Knightsbridge e Belgravia, chega hoje a 54.200 dólares. "Para que vire um destino de luxo similar aos do Primeiro Mundo, o Brasil ainda precisa fazer a lição de casa no que diz respeito à violência, principalmente", diz Sérgio Negro, principal executivo do escritório da Knight Frank no Brasil.
Sergio Zalis |
LOTAÇÃO ESGOTADA |
O problema se reflete no dia-a-dia dos apartamentos mais caros da Vieira Souto. Boa parte das altíssimas taxas de condomínio (valor médio: 4.000 reais) é destinada a sistemas de câmeras, alarmes, segurança particular e vidros blindados nas janelas. Quando o Cap Ferrat foi lançado, nos anos 80, Ipanema ainda era uma tranqüilidade. Na ocasião, suas unidades de 630 metros quadrados foram vendidas por 480.000 dólares. Hoje, quem tem uma dificilmente vende. "Ofereci 15 milhões de reais à vista a cinco moradores e ninguém topou fazer negócio", diz o consultor imobiliário Paulo Cezar Ximenes. Não dá para imaginar quanto elas custariam se Ipanema voltasse a ser só felicidade.
Divulgação |