O Globo - 04/01/12
Com a severa tempestade que desabou sobre a Serra Fluminense no início do ano passado, ficou à vista de todos o que a incúria administrativa e a corrupção podem produzir. Entre Petrópolis, Teresópolis e Friburgo, foram mais de 900 mortos - nem todos resgatados -, estradas, pontes, casas e toda uma infraestrutura destruídas.
Num enredo conhecido, autoridades de todos os níveis administrativos se solidarizaram com as vítimas, prometeram investir na recuperação das cidades, alguns governantes até foram aos enlameados locais. Também como sempre acontece nessas situações, ficou evidente que faltou cuidado com a prevenção por parte de todos os governos - federal, estadual e municipais.
Mas foi tão grande a tragédia - considerada a maior catástrofe natural ocorrida no país - que se esperava alguma mudança de postura do poder público. Em vão. Há um ano da enxurrada, quando nova temporada de chuvas se inicia, os mesmos problemas voltam a ocorrer, em Friburgo e Teresópolis. Pelo menos até agora.
A lição não foi aprendida, apesar do número de vítimas, da pulverização de patrimônios público e privado. Se algo positivo aconteceu no decorrer de 2011, naquela região, foi o afastamento dos prefeitos de Teresópolis e Friburgo, Jorge Mario (ex-PT) e Demerval Moreira Neto (PTdoB). O primeiro, cassado; o segundo, destituído pela Justiça Federal, a partir de ação proposta pelo Ministério Público Federal.
Os dois mantinham esquemas de corrupção detectados assim que foi exigido das prefeituras agir de maneira rápida e eficiente na aplicação de recursos federais e estaduais liberados na tragédia.
Mas foi só. As chuvas destes dias encontram áreas das cidades atingidas com rigor em 2011 quase do mesmo jeito que ficaram depois da passagem das águas há um ano. No momento, os problemas mais graves ocorrem em Friburgo.
O governo federal tem parte ponderável da responsabilidade em todo este drama. Se, em 2011, descobriu-se que o ministro Geddel Vieira (PMDB), da Integração Nacional na fase final do governo Lula, privilegiara sua base eleitoral, a Bahia, na distribuição das verbas federais para obras de prevenção contra este tipo de desastre, sabe-se agora que Fernando Rezende (PSB) seguiu Geddel e concentrou a mesma verba em Pernambuco. Em artigo publicado ontem no GLOBO, o economista Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, registrou que dos R$155,6 milhões do orçamento para obras de prevenção, a maior parte, R$34,2 milhões, 22%, foram para o domicílio eleitoral do ministro.
O poder público nada aprendeu com a catástrofe de 2011. Por determinação da presidente Dilma, a ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, suspendeu as férias e voltou ao gabinete, ontem, no Planalto, para tratar de ações de emergência em áreas de enchentes em Minas e no Rio de Janeiro. Noticia-se, também, que serão definidos critérios técnicos na distribuição de verbas que Geddel e Rezende usaram com fins clientelistas.
Tudo pirotecnia. Mais uma vez, o Estado apenas tentará apagar incêndios mais do que previsíveis, pois não consegue agir na prevenção. Por deficiência administrativa e/ou má-fé.