O Estado de S.Paulo - 29/01/12
Com a elite de governos, empresários e economistas mais prestigiados do mundo reunidos em Davos, o Fórum Econômico Mundial discutiu, há dias, saídas para a ameaça de fracasso do capitalismo como sistema econômico. No Brasil a classe média tem crescido e o número de pobres, encolhido, seguindo as regras do capitalismo - e o País sob o comando de uma ex-socialista. Por aqui e em toda a América Latina, a distribuição de renda e a ascensão social da população não chegaram com a revolução nem com a ruptura com o capitalismo, como os socialistas imaginaram no século passado. País com maior crescimento e êxito econômico do mundo, a China é comunista na política, capitalista na economia e quer que o mundo a veja como economia de mercado. Comunistas puros, Cuba e Coreia do Norte são fiascos na economia e na política.
Ao longo do século 20, o mundo dividiu-se entre socialistas e capitalistas. Duas guerras globais foram seguidas por outra latente, tensa, ameaçadora: a guerra fria, que não trocou tiros diretos entre os dois maiores rivais - EUA e URSS -, mas fabricou guerras paralelas em outros países, gastou trilhões de dólares e rublos em armamentos, matou milhões de pessoas mundo afora, espalhou subdesenvolvimento e pobreza. O embate ideológico cul minou com a queda do Muro de Berlim, que separava duas Alemanhas - a comunista, pobre e reprimida; e a capitalista, rica e próspera. A derrota deixou os socialistas perdidos e o capitalismo sem oposição para frear seus exageros.
Triunfante, o capitalismo seguiu em frente, diversificou a indústria da comunicação e com ela sofisticou seus produtos no mercado financeiro, multiplicando dinheiro e... concentrando renda. Chegou a "exuberância dos mercados", na denominação elegante do ex-presidente do banco central dos EUA Alan Greenspan. Sem freios, regulação ou fiscalização, a "exuberância" gerou a destruidora crise de 2008, golpeando grandes bancos e indústrias, sobretudo nos EUA. Desde então os países ricos repetem que o mercado financeiro precisa ser contido, regulado com regras comuns em todos os países e fiscalizado pelos governos. Reuniram-se os países do G-7, ampliados depois para o G-20, e quase nada ocorreu, a não ser uma tímida reforma bancária que os países resistem em implementar. Mas hoje os bancos são mais retraídos e cautelosos.
A retração bancária a clientes com riscos desnudou a contabilidade dos governos da velha Europa em 2011 e tem dificultado sua recuperação econômica. Grécia, Portugal, Espanha, Itália e França passaram anos fazendo com discrição e silêncio o que desaconselhavam aos latino-americanos nos anos 70/80: gastaram mais que arrecadavam e se endividaram demais para cobrir rombos.
De Adam Smith a Paul Krugman, passando por John Keynes, a economia capitalista pressupõe equilíbrio financeiro e endividamento com juízo. E o sistema cobra quando essas regras são violadas com exagero, seja com inflação, retração econômica, desemprego, retrocessos na área social, empobrecimento da população. É o que ocorre na Europa, com ameaça de expansão a outros continentes. Diante desse cenário, a revista Times cuidou de organizar um debate em Davos sobre a reinvenção do capitalismo. Convidou pensadores brilhantes, empresários experientes e uma sindicalista para debater o tema, esperando respostas que recolocassem o capitalismo na direção do homem, do equilíbrio social no mundo, do bem-estar das pessoas, da redução das desigualdades, do freio à ambição desenfreada e antídotos para a fobia por dinheiro.
Como as reuniões do G-7 ou do G-20, a iniciativa fracassou, os debatedores se limitaram a constatar os problemas da crise do capitalismo, mas raros propuseram saídas. Um deles, o economista Larry Summers, ex-conselheiro de Barak Obama, propôs o deslocamento dos desempregados da indústria para setores da saúde e educação, onde a população é mal atendida na maioria dos países. Mas as notícias que vêm de Davos indicam um debate sem rumo. Estaria o capitalismo começando a viver a crise do socialismo dos anos 70/80?