Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, abril 13, 2010

Celso Ming -Inconsistências


O Estado de S. Paulo - 13/04/2010
 

Um festival de inconsistências e de falsas soluções vem sendo detonado no governo e fora dele com o objetivo aparente de impedir que o Banco Central puxe os juros básicos (Selic) na sua reunião de 28 de abril.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, por exemplo, anunciou sexta-feira que está disposto a reduzir as alíquotas do Imposto sobre Importação (tarifas alfandegárias) para derrubar os preços finais do produto importado e, assim, aumentar a concorrência interna, de modo a conter a disparada da inflação e evitar a alta dos juros.

Os dirigentes da Fiesp, que não devem ter gostado dessa ideia, argumentam agora que o ritmo dos investimentos conseguirá garantir a normalização da oferta e, assim, dispensar o ajuste dos juros. No entanto, não conseguem ver que boa parte das pressões inflacionárias está concentrada nos serviços, que não se aliviam com investimentos em máquinas e ampliação de fábricas.

O ministro entende, corretamente, que o produto brasileiro está perdendo competitividade e que, por isso, é preciso tomar medidas para neutralizar esse efeito, que prejudica as exportações e estica o déficit em conta corrente. Mas ele próprio é um dos obstáculos a que o governo baixe um pacote de estímulo às exportações porque sabe, também corretamente, que o Tesouro está sendo bastante pressionado e que, nessas condições, não pode ser ainda mais sangrado. Mas, quando avisa que pode amolecer as tarifas alfandegárias, tende a aumentar a perda de competitividade do exportador brasileiro.

Quando insiste em que esta é a "inflação do tomatinho", Mantega está tentando dizer que o principal componente do atual strike inflacionário são fatores sazonais, como o excesso de chuvas em fevereiro e março, que derrubaram a produção e elevaram os preços dos alimentos.

Por trás desse diagnóstico está a conclusão de que, uma vez chegada a meia-estação, os preços do tomate voltarão ao normal e, com ele, a inflação recuará. Mas, se insiste em que é preciso derrubar as tarifas alfandegárias, Mantega reconhece que o principal componente da inflação não é sazonal, mas sim a forte demanda que precisa ser atendida com mais oferta.

É que nenhum piloto de política econômica reduz Imposto de Importação para combater "inflação do tomatinho". Nem o ministro da Fazenda de 1983, Delfim Netto, reduziu as tarifas aduaneiras para combater o que identificou então como a "inflação do feijão-preto", nem antes dele, em 1977, o então ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, fez o mesmo para combater a "inflação do chuchu".

De todo modo, a área fiscal, que Mantega comanda, pode fazer muito mais para evitar a alta da Selic e até mesmo para forçar sua baixa, desde que também faça o diagnóstico correto. Há, sim, forte componente de demanda na inflação atual.

Todos sabemos que o principal fator que pesa hoje na inflação é a disparada do consumo, que, por sua vez, tem a ver com o excesso de despesas correntes do governo, que saltaram 17% neste ano. Quando ameaça baixar as tarifas aduaneiras, Mantega está admitindo o fator demanda. E, se der um jeito de sentar-se sobre o cofre de maneira a que o governo deixe de fazer as extravagâncias que faz, certamente estaria colaborando mais com a redução da escalada dos preços do que estaria com a redução do Imposto de Importações.

Confira
Crime sem castigo
Está fechado: a Grécia receberá pelo menos ? 30 bilhões em empréstimos dos membros da União Monetária Europeia, a juros de 5% ao ano. Fica estabelecido o precedente que qualquer país da área pode fazer todo o tipo de lambança fiscal. Se tudo der errado, terá o socorro que merece, a juros de apenas 5% ao ano. Falta saber quando será a vez de Portugal, Espanha, Itália, Irlanda e quem mais entrar nessa fila.

O curso do Titanic
Artigo publicado ontem no New York Times, assinado por Frank Rich, comenta afirmação feita no Congresso americano por Alan Greenspan, ex-presidente do Fed (o banco central dos Estados Unidos). Ao ser questionado por não ter previsto e por nada ter feito no Fed para conter a crise, Greenspan se justificou assim: "Eu estava correto 70% do tempo e errado em 30% do tempo." O comentário de Frank Rich foi o seguinte: "Se seguisse o modelo Greenspan, o capitão do Titanic poderia ter alegado que o curso do seu navio estava correto 70% do tempo."

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