RIO DE JANEIRO - Biografias de Millôr lembraram ontem a passagem do escritor e cartunista pelo antigo "Jornal do Brasil", na década de 80. Ele entrara em atrito com a "Veja", onde trabalhava antes, por causa do seu apoio a Leonel Brizola, que fundou o PDT ao voltar do exílio e disputava a primeira eleição direta para o governo do Estado do Rio.
Em 1982, quase todo o resto da imprensa carioca apoiava a candidatura de Moreira Franco, hoje no PMDB e ministro de Assuntos Estratégicos de Dilma, de cuja "base aliada" o PDT também faz parte. Moreira concorria a governador pelo PDS, que virou o atual DEM, mas era, então, a sigla nova da Arena, o partido situacionista criado pelo regime militar.
O ex-governador gaúcho, cunhado de Jango e líder da Cadeia da Legalidade em 1961, fez uma campanha com poucos recursos e amparada em sua habilidade retórica, reivindicando uma continuidade histórica com a experiência nacional-popular interrompida em 1964.
O momento mais tenso veio após a eleição, quando a Proconsult, empresa contratada para informatizar as planilhas de voto (que ainda era em cédula de papel), passou a divulgar a dianteira de Moreira, contrariando as pesquisas. Uma apuração paralela feita pela rádio Jornal do Brasil provou que votos brancos e nulos eram computados para o governista.
Eleito com o antropólogo Darcy Ribeiro como vice, Brizola construiu Cieps, escolas públicas de horário integral. Autorizou uma linha de ônibus direta do subúrbio a Ipanema, e proibiu que a polícia invadisse casas em favelas -política que muita gente culpa pela entrada do tráfico nos morros, mas que na época era a correta.
Com o tempo, Millôr se tornou crítico veemente de Brizola, que viria a fazer um segundo governo sofrível no Estado, de 1991 a 1994.
Cada um com a seu modo, no entanto, os dois buscaram manter a coerência até o fim.