FOLHA DE SP - 02/12/11
Retorna, por iniciativa do Senado, um debate capaz de suscitar estranheza em qualquer país onde estejam arraigados os princípios da liberdade de expressão.
Trata-se, novamente, da obrigatoriedade de diploma específico para o exercício da profissão de jornalista. O assunto -esperava-se-havia sido definitivamente encerrado por decisão do Supremo Tribunal Federal, em junho de 2009, quando se considerou inconstitucional a exigência.
O mecanismo foi introduzido pela ditadura militar e persistiu, ao longo de décadas, devido a uma dupla distorção ideológica.
A primeira, à qual o mundo político adere de bom grado, é a ideia de que faltam dispositivos para "disciplinar", "regular" ou "organizar" o jornalismo no país.
Tais verbos nada mais são do que eufemismos para o desejo de censura. Nenhum governante ou parlamentar se sente à vontade enquanto vigora, por parte da imprensa apartidária e crítica, um ímpeto genuíno de fiscalização.
A segunda distorção tem origem no corporativismo enquistado em órgãos sindicais, em organizações de estudantes e na burocracia das faculdades de jornalismo.
Mais do que nunca, os jornais necessitam orientar-se para a produção de textos analíticos e aprofundados, que sejam, ao mesmo tempo, de formato ágil e acessível para o leitor contemporâneo.
Bacharéis em direito, pessoas com formação em medicina, especialistas em finanças, geografia ou relações internacionais tornam-se particularmente necessários nesse contexto.
Dispondo de facilidade para a comunicação escrita, nada impede que, mesmo sem o diploma, possam ser contratados pelas empresas de comunicação. E, certamente, capacidade crítica, espírito de contestação e independência não são privilégios dos formados em jornalismo.
A obrigatoriedade do documento serve apenas como reserva de mercado para os egressos das faculdades, restringindo a concorrência no mercado de trabalho -o que resulta, em última análise, em desserviço ao leitor.
Aprovando, por 65 votos a 7, uma emenda constitucional para reviver o velho dispositivo, o Senado Federal certamente sabia o que estava fazendo: atender à pressão corporativista dos burocratas da área e entravar ao máximo a atividade de uma imprensa crítica.