O GLOBO - 19/12/11
Enrascado com a história de consultorias-fantasmas ou apenas suspeitas, Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento, demonstrou há cerca de dez dias ser mais sensato do que a presidente Dilma Rousseff. Em conversa com ela, disse que o melhor a fazer seria pedir demissão. Pouparia o governo de novos constrangimentos. E também se pouparia.
Somente Pimentel sabe o que fez. E também amigos seus, alguns fornecedores e ex-fornecedores da prefeitura de Belo Horizonte que concordaram em sustentá-lo de 2009 a 2010. Naquele período, a Bolsa Consultoria garantida por eles deu paz a Pimentel para que desenhasse o seu futuro político — o governo do estado ou o Senado.
Agora, pragmático por formação, avaliou que não deixará tão cedo de ser investigado pela imprensa. Deu-lhe motivos de sobra para isso. Exemplo? Fechou contratos de boca com três dos quatro clientes que lhe pagaram um total de R$ 2 milhões. E preferiu silenciar sobre detalhes dos contratos e das supostas prestações de serviço.
Um dos seus mantenedores desmentiu que o tivesse contratado. Alegou não dispor de dinheiro para tanto. Seu negócio era modesto. Modestíssimo. Um dia depois recuou do desmentido e anunciou que o contratara, sim. Quer situação mais atraente para uma imprensa inquieta, disposta a fiscalizar o poder público, cair em cima sem piedade?
Esse é um dos seus papéis. E, quando quer, ela o desempenha com mais eficiência do que os órgãos encarregados por lei da tarefa. De resto, a imprensa acreditou no modelito “faxineira ética” exibido por Dilma desde o início do seu governo. Por que não a ajudar a varrer os malfeitos? Nada mais patriótico. Lula deixou que eles se acumulassem.
Na conversa com Dilma em que se dispôs a ir embora, Pimentel lembrou-lhe que ainda é jovem. Amargará um prejuízo maior ficando exposto a tiros do que saindo de cena para quem sabe voltar no futuro. A seu modo reflexivo e delicado, Dilma interrompeu o discurso de Pimentel para descartar de pronto a sua sugestão.
“E você acha que vou continuar fazendo tudo o que a imprensa quer?”, devolveu a presidente. Àquela altura, ela amadurecera a ideia que defenderia com desassombro quando jornalistas lhe perguntassem por que insistir em conservar Pimentel no governo. Vocês sabem a que ideia me refiro. É um tributo ao cinismo, convenhamos.
“Não tem nada a ver com o meu governo. O que estão acusando [Pimentel], não tem nada a ver com meu governo”, repetiu Dilma na última sexta-feira. Dito de outra forma: o eventual malfeito cometido por Pimentel antes de virar ministro não é da conta da presidente e de ninguém. “É um problema pessoal dele”, segundo Dilma. Que tal?
Exercício de lógica só por pura diversão: e se Pimentel fosse suspeito de no passado recente ter sido sócio de Fernandinho Beira-Mar ou de Nem? Ele permaneceria no governo? Ou a suspeita de apenas ter mentido ao distinto, distraído e volúvel público é um malfeito, digamos assim, menor, tolerável? Ou vai ver que nem malfeito é?
A ideia de Dilma para salvar Pimentel da degola foi tomada emprestada à deputada Jaqueline Roriz. O Conselho de Ética da Câmara recomendou a cassação de Jaqueline porque ela se elegeu com dinheiro de caixa dois, como prova um vídeo. A deputada acabou salva por seus colegas sob a desculpa de que o crime ocorrera antes da eleição.
Na última sexta-feira, um jornalista lembrou a Dilma que Antonio Palocci deixou a Casa Civil por ter se negado a dar informações mais precisas sobre consultorias que prestou a empresas — assim como Pimentel. Dilma rebateu: “Ele quis sair”. Registre-se que Pimentel também quis. Por ora, sua sina será viver saindo de perto de jornalistas.
Quanto a Dilma: uma vez livre do avental, está liberada para fazer o que queira, respeitadas as leis e consultado o Ibope amiúde. Pouco importa que seja incoerente ou contraditória. Ou que mande às favas os escrúpulos.
Enrascado com a história de consultorias-fantasmas ou apenas suspeitas, Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento, demonstrou há cerca de dez dias ser mais sensato do que a presidente Dilma Rousseff. Em conversa com ela, disse que o melhor a fazer seria pedir demissão. Pouparia o governo de novos constrangimentos. E também se pouparia.
Somente Pimentel sabe o que fez. E também amigos seus, alguns fornecedores e ex-fornecedores da prefeitura de Belo Horizonte que concordaram em sustentá-lo de 2009 a 2010. Naquele período, a Bolsa Consultoria garantida por eles deu paz a Pimentel para que desenhasse o seu futuro político — o governo do estado ou o Senado.
Agora, pragmático por formação, avaliou que não deixará tão cedo de ser investigado pela imprensa. Deu-lhe motivos de sobra para isso. Exemplo? Fechou contratos de boca com três dos quatro clientes que lhe pagaram um total de R$ 2 milhões. E preferiu silenciar sobre detalhes dos contratos e das supostas prestações de serviço.
Um dos seus mantenedores desmentiu que o tivesse contratado. Alegou não dispor de dinheiro para tanto. Seu negócio era modesto. Modestíssimo. Um dia depois recuou do desmentido e anunciou que o contratara, sim. Quer situação mais atraente para uma imprensa inquieta, disposta a fiscalizar o poder público, cair em cima sem piedade?
Esse é um dos seus papéis. E, quando quer, ela o desempenha com mais eficiência do que os órgãos encarregados por lei da tarefa. De resto, a imprensa acreditou no modelito “faxineira ética” exibido por Dilma desde o início do seu governo. Por que não a ajudar a varrer os malfeitos? Nada mais patriótico. Lula deixou que eles se acumulassem.
Na conversa com Dilma em que se dispôs a ir embora, Pimentel lembrou-lhe que ainda é jovem. Amargará um prejuízo maior ficando exposto a tiros do que saindo de cena para quem sabe voltar no futuro. A seu modo reflexivo e delicado, Dilma interrompeu o discurso de Pimentel para descartar de pronto a sua sugestão.
“E você acha que vou continuar fazendo tudo o que a imprensa quer?”, devolveu a presidente. Àquela altura, ela amadurecera a ideia que defenderia com desassombro quando jornalistas lhe perguntassem por que insistir em conservar Pimentel no governo. Vocês sabem a que ideia me refiro. É um tributo ao cinismo, convenhamos.
“Não tem nada a ver com o meu governo. O que estão acusando [Pimentel], não tem nada a ver com meu governo”, repetiu Dilma na última sexta-feira. Dito de outra forma: o eventual malfeito cometido por Pimentel antes de virar ministro não é da conta da presidente e de ninguém. “É um problema pessoal dele”, segundo Dilma. Que tal?
Exercício de lógica só por pura diversão: e se Pimentel fosse suspeito de no passado recente ter sido sócio de Fernandinho Beira-Mar ou de Nem? Ele permaneceria no governo? Ou a suspeita de apenas ter mentido ao distinto, distraído e volúvel público é um malfeito, digamos assim, menor, tolerável? Ou vai ver que nem malfeito é?
A ideia de Dilma para salvar Pimentel da degola foi tomada emprestada à deputada Jaqueline Roriz. O Conselho de Ética da Câmara recomendou a cassação de Jaqueline porque ela se elegeu com dinheiro de caixa dois, como prova um vídeo. A deputada acabou salva por seus colegas sob a desculpa de que o crime ocorrera antes da eleição.
Na última sexta-feira, um jornalista lembrou a Dilma que Antonio Palocci deixou a Casa Civil por ter se negado a dar informações mais precisas sobre consultorias que prestou a empresas — assim como Pimentel. Dilma rebateu: “Ele quis sair”. Registre-se que Pimentel também quis. Por ora, sua sina será viver saindo de perto de jornalistas.
Quanto a Dilma: uma vez livre do avental, está liberada para fazer o que queira, respeitadas as leis e consultado o Ibope amiúde. Pouco importa que seja incoerente ou contraditória. Ou que mande às favas os escrúpulos.