O Banco Central Europeu (BCE) inundou de dinheiro o mercado europeu nesta quarta-feira, ao distribuir quase meio trilhão de euros em empréstimos de três anos a todos os bancos da área, mais outros 30 bilhões de euros por três meses. As operações foram completadas com objetivo declarado de enfrentar a falta de crédito da Eurolândia.
Para isso, o BCE flexibilizou as garantias (colaterais) desses empréstimos. Aceitou não só títulos de dívidas de países da periferia do euro, mas também créditos a pequenas empresas.
Os juros cobrados nas operações mais longas foram de 1% ao ano. Recomenda-se que os bancos compareçam aos lançamentos futuros de títulos dos países europeus, que pagarão por esse dinheiro juros entre 2% e 5% ao ano.
Depois de ensaiar comemoração por injeção de capital superior à esperada, os mercados voltaram a temer o agravamento da crise por duas razões: os bancos não devem recorrer tão cedo a novas compras de títulos públicos para entregar ao BCE como garantia, o que tende a derrubar esse mercado nas próximas semanas; e a crise de confiança pode ser ainda mais séria, a ponto de levar os bancos à procura recorde de financiamentos do BCE.
Embora crie demanda para títulos públicos europeus – cada vez mais rejeitados no mercado – essa megaoperação não configura mudança de política monetária. Forçado pelas autoridades da Alemanha e da França, o BCE vem se negando a exercer o papel de emprestador de última instância a Estados nacionais – embora continue a prestar assistência financeira ilimitada aos bancos.
Pode-se pensar que o repasse de moeda emitida para que os bancos comprem previa ou posteriormente títulos dos países europeus (para entregá-los como garantia de empréstimos) não passa de emissão disfarçada de moeda – o que, em última análise, financia despesas públicas, prática vedada pelos tratados do euro.
Mas não é isso. O objetivo do BCE, agora comandado pelo italiano Mario Draghi (foto), não é cobrir despesas de governo. É destravar o crédito, já que nem os bancos emprestam recursos entre si – com medo da deterioração da qualidade dos seus créditos, mais e mais sujeitos a calotes. Isto é, não se trata de operação de política fiscal, proibida a bancos centrais; mas de política monetária propriamente dita, atribuição dos bancos centrais.
Mesmo que essa injeção de dinheiro tenha sido programada há meses, é provável que o BCE a tenha aproveitado para colocar mais liquidez no mercado, dada a iminência de rebaixamento da qualidade dos títulos de alguns países cuja dívida era considerada, até então, de primeira linha (o caso da França, em especial).
Esse novo despejo de dinheiro não resolve o principal problema de fundo da área do euro: persistência de endividamento insustentável por grande parte dos países do bloco. Tampouco tira o euro do terreno de areia movediça em que está atolado por insuficiência de fundamentos (falta de unidade fiscal e política entre os Estados da Eurolândia).
Agora é preciso ver até que ponto os bancos agora fartamente irrigados pelo BCE estão mesmo dispostos a usar boa fatia desse volume para refinanciar Estados europeus quebrados – ou se eles darão prioridade para recompor seus caixas num ambiente de escassez de recursos.
Confira
Em outubro, alguns analistas entenderam equivocadamente que a expansão do crédito estava em franca desaceleração. Os números de novembro, divulgados nesta quarta-feira pelo Banco Central, confirmam que a aparente quebra de ritmo de outubro resultou da greve dos bancários, que truncou a concessão de novos créditos.
Mais do que o pretendido. A expansão do estoque de crédito, de 48,2% do PIB em 12 meses (até novembro), foi de 18,2%, algo significativamente acima do desejado pelo Banco Central que, no início do ano, julgava poder contê-lo em 15%.