- 26/05/2011 |
A prisão de Antônio Pimenta Neves, 11 anos após ter assassinado a ex-namorada Sandra Gomide no interior de São Paulo, para cumprir pena, representa o desfecho de um caso emblemático dos desvãos judiciais que, bem explorados, se tornam eficaz instrumento para protelar a ação da Justiça no país. Se, por alguma nova manobra, o jornalista voltar a se livrar da obrigação de ajustar contas com a lei, escapando da detenção, isso apenas reforçará uma evidência que todo esse episódio encerra. Quando se tem bons advogados, e obviamente condições financeiras para contratá-los, pode-se postergar o cumprimento de uma sentença até o limite que, não poucas vezes, alcança a prescrição da pena. Embora nem sempre verdadeira, a analogia com a versão popular dessa dedução - no Brasil, só o pobre vai preso - é irresistível. Os advogados de Pimenta Neves souberam explorar à exaustão os descaminhos judiciais em busca da impunidade. Assassino confesso de um crime premeditado e friamente executado em agosto de 2000, quando era diretor de redação de "O Estado de S. Paulo", o jornalista só ficou preso na fase inicial do processo, por poucos meses, de setembro daquele ano a março de 2001, quando o Supremo Tribunal Federal concedeu-lhe habeas corpus, para aguardar o julgamento em liberdade. Seguiu-se, a partir daí, o rito que, pela protelação (por meio de recursos previstos na legislação, registre-se), costuma levar à inimputabilidade de fato. Ele foi, enfim, condenado em 2006, e, desde então, sua defesa impetrou nada menos que 20 recursos junto ao STF e ao STJ. Ao negar agora a derradeira apelação do réu, o Supremo brecou a manobra. Qualquer que seja o passo seguinte desse processo, o longo prazo decorrido entre o crime e o ajuste de contas do jornalista com a sociedade expõe com clareza o lado permissivo (ainda que não desejado) da Justiça brasileira. A morosidade, mal crônico nos tribunais, é aliada da esperteza que se alimenta de dispositivos que permitem a postergação da execução de sentenças. Acrescente-se a isso a existência de um gargalo nas cortes, onde se acumulam incontáveis processos - fruto, entre outras coisas, também da interposição de seguidos instrumentos protelatórios. São iniciativas legítimas, mas que acabam por desfigurar a essência do direito de defesa, cláusula da Constituição: dá-se ao réu a indiscutível presunção da inocência, princípio que, no caso de um assassino confesso como Pimenta Neves, chega ser curioso. A lentidão nos ritos processuais é objeto de seguidas ações do Conselho Nacional de Justiça. O órgão tem cobrado presteza na tramitação de processos e estabelecido metas para desafogar as pautas dos tribunais, com resultados estimulantes. Os tribunais precisam mesmo melhorar seus sistemas administrativos. A protelação de contas a acertar com a Justiça tem repercussões na esfera política. Há casos de réus no gozo do direito a foro especial que a ele renunciam para transferir o processo à Justiça comum. Dessa forma, se beneficiam de novos prazos e da secular lerdeza das Cortes, para alcançar a prescrição. É a cultura da impunidade, com a qual o Judiciário não pode compactuar. Cumpre, portanto, combater o pior da Justiça brasileira, no desestímulo de chicanas como as que, até aqui, beneficiaram Pimenta Neves. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, maio 26, 2011
Caso Pimenta e o pior da Justiça brasileira EDITORIAL O Globo
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