Ministro diz que entrada de recursos em sua consultoria se deve à
rescisão de contratos antes de sua ida para o governo
A consultoria que Antonio Palocci manteve antes de se tornar ministro
da Casa Civil do governo Dilma prestou serviços para pelo menos 20
empresas, entre as quais bancos, montadoras e indústrias, informam
Leandro Colon e Fausto Macedo. Em esclarecimentos ao procurador-geral
da República, Roberto Gurgel, por causa das suspeitas sobre a evolução
de seu patrimônio, Palocci disse que rescindiu todos os contratos no
final de 2010, antes de assumir o ministério. Segundo ele, houve
ingresso de volume considerável de recursos no caixa da empresa nas
semanas que antecederam sua nomeação ao cargo justamente em razão da
rescisão dos contratos. Alguns clientes de Palocci avisaram o ministro
que não querem ter seus nomes envolvidos e cobraram silêncio absoluto
sobre os documentos. Para evitar qualquer tipo de quebra ilegal do
sigilo fiscal de sua empresa, Palocci acionou o prefeito de São Paulo,
Gilberto Kassab. O petista quer evitar que funcionários de escalões
inferiores da administração deixem vazar informações sobre a
consultoria.
Pressionado, Palocci revela à PGR alta movimentação financeira após eleição
Ministro se antecipa a pedido de informações do procurador-geral sobre
seu patrimônio e em documento que deve ser enviado hoje a Gurgel
explica que rescindiu contratos com empresas no final do ano passado;
a Projeto tinha pelo menos 20 grandes clientes
Fausto Macedo e Leandro Colon
No centro da primeira turbulência política do governo, o
ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, decidiu enviar um
esclarecimento espontâneo à Procuradoria-Geral da República (PGR) para
justificar as atividades econômicas da sua empresa, a Projeto
Consultoria Financeira e Econômica Ltda., e o alto volume de recursos
que recebeu no fim de 2010, após a eleição de Dilma Rousseff à
Presidência da República. O ministro foi o principal coordenador da
campanha da petista.
No documento, que deve ser enviado hoje à PGR, Palocci informa que
trabalhou para pelo menos 20 empresas, incluindo bancos, montadoras e
indústrias, e que boa parte dos pagamentos foi concentrada entre
novembro e dezembro do ano passado quando anunciou aos clientes que
não mais atuaria no ramo de consultoria. Na ocasião, segundo a
justificativa do ministro, pelo menos 70% dos serviços de consultoria
e análises de mercado já estavam concluídos, o que explicaria o
pagamento nesse período.
O faturamento milionário no fim do ano serviu para ajudar a comprar o
apartamento de R$ 6,6 milhões num bairro nobre de São Paulo, cuja
aquisição foi concluída em novembro.
Somente uma dessas empresas que contratou a Projeto, segundo fonte
próxima ao ministro, fatura cerca de R$ 350 milhões por mês. Palocci
se nega a divulgar o nome de seus antigos clientes, sob a alegação de
que respeita cláusulas de confidencialidade e também mantém sob sigilo
o valor faturado.
Palocci alterou o objeto social da empresa do ramo de consultoria para
o de administração imobiliária em 29 de dezembro de 2010, dias antes
da posse de Dilma Rousseff.
A turbulência política vivida pelo ministro nos últimos dias se deve a
questionamentos sobre o aumento significativo de seu patrimônio.
Investigação. A PGR é o único órgão com prerrogativa para investigar
um ministro de Estado. Além de tentar explicar os recursos recebidos
após a eleição, Palocci quis também se antecipar a um eventual pedido
de informações do procurador-geral, Roberto Gurgel, que foi provocado
pela oposição a investigar o enriquecimento do ministro em 20 vezes,
num período de apenas quatro anos. Em declarações recentes à imprensa,
o procurador-geral adotou um discurso cauteloso, mas afirmou que o
caso merece um "olhar cuidadoso".
Histórico. No comunicado a ser enviado ao Ministério Público Federal,
Palocci faz um histórico da empresa Projeto, desde sua fundação, em
agosto de 2006, voltada para a "prestação de serviços, palestras,
análise de mercado", até a alteração do objeto social.
Palocci afirma que o fato de ser médico de profissão não o impede de
exercer o comando de uma agência de consultorias porque seu sócio,
Lucas Martins Novaes, é economista.
Três anos depois do início das operações, informa o ministro à
Procuradoria-Geral da República, a empresa passou a ocupar o
escritório avaliado em R$ 882 mil, situado na Alameda Ministro Rocha
Azevedo, em frente ao edifício-sede da Justiça Federal em São Paulo.
"Incompatibilidade". Em julho de 2010, quando convocado para coordenar
a campanha de Dilma à Presidência, Palocci alterou o contrato social
da Projeto, "tendo em vista a incompatibilidade", explica nos
esclarecimentos prestados à PGR.
Ele renunciou ao cargo de administrador, nomeando no lugar Celso dos
Santos Fonseca, que não é sócio da empresa.
Naquele mês, segundo registros da Junta Comercial de São Paulo,
Palocci alterou ainda o capital da empresa de R$ 52 mil para R$ 102
mil.
Hoje, a Projeto Administração de Imóveis gerencia os bens adquiridos
pelo ministro que incluem, além do apartamento, um escritório, também
na capital, avaliado em R$ 882 mil.
A gestão financeira da empresa do ministro foi entregue a uma
subsidiária do Bradesco. No jargão de mercado, trata-se de uma
"administração cega", em que as decisões sobre o futuro do patrimônio
são tomadas de maneira independente da posição de Palocci como
ministro da Casa Civil.
Na Ásia. Entre as empresas clientes da Projeto constam uma do setor
imobiliário e outra que trata de investimentos na Ásia. Neste último
caso, Palocci teria sido contratado para opinar sobre a viabilidade
financeira de negócios na região e estabilidade da moeda no respectivo
país.
Desde a divulgação do patrimônio adquirido em 2010 - que teria
aumentado 20 vezes em relação ao valor da declaração de bens de
Palocci quando candidato a deputado federal em 2006 - o ministro tem
se manifestado apenas por intermédio de assessores de imprensa. Ele
contratou uma empresa especializada em assessoria de imprensa para
gerenciar a crise. Apesar de não se pronunciar publicamente, Palocci
tem mantido conversas diárias com aliados e com a presidente Dilma
Rousseff.
Números da Projeto
R$ 350 mi é o que fatura, por mês, apenas uma das empresas que
contrataram a Projeto
70% é o porcentual de serviços de consultoria que já estavam
concluídos quando Palocci comunicou a seus clientes que a sua empresa
não prosseguiria naquela atividade