A floresta entrou como moeda de troca para o acordo político que
livrou o ministro Antonio Palocci de ser convocado no Congresso. Tudo
é espantoso. Revelador de como o Brasil não tem oposição, como o
governo é dividido, como se negocia o futuro em troca de uma questão
conjuntural que deveria, em favor do principal envolvido, ser
resolvida de outra forma.
O ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, está convencido de
que nada fez de errado nos negócios que aumentaram em 20 vezes seu
patrimônio em quatro anos. Ótimo. Então nada a temer. Palocci não
deveria se assustar com discursos de oposição, ele foi parlamentar, é
capaz de convencer quando tem bons argumentos, já reverteu muitas
situações políticas delicadas. Protegido pelo biombo construído pela
concessão feita à pluripartidária bancada ruralista, em que está parte
da sua base e parte da oposição, ele ficará ainda mais fraco.
Não é assim que se enfrenta crise. É preciso encarar as dúvidas e
dirimi-las. Fugir delas, proteger-se dos questionamentos é o caminho
para as suspeitas. Sua patética reação de atacar integrantes de outros
governos, em situações bem diferentes, não foi mantida nem por ele
mesmo. Agora, a versão é que aquela argumentação não era para ser
divulgada. A maneira como o ministro Palocci enfrenta mais uma de suas
turbulências é problema que interessa aos seus estrategistas. Às
pessoas do país continuará faltando uma boa explicação para tão bom
desempenho financeiro que o leva a comprar quase à vista imóveis de
R$7 milhões.
A volta de Palocci ao cenário político, depois de sofrer o ostracismo
pelas repercussões do caso da quebra do sigilo do caseiro Francenildo,
foi comemorada na economia. Empresas, economistas, professores,
analistas consideram que ele é um oásis de compreensão dos fenômenos
econômicos no atual governo, mesmo sendo um médico sanitarista. Ele
acumulou informação e sensibilidade que poderiam ser vitais em
momentos de crise e tomadas de decisão relevantes. Qualquer que seja a
evolução dos fatos, mesmo que funcione a blindagem, ele é hoje um
ministro mais fraco do que era há uma semana quando enfrentou a
bancada ruralista.
O episódio enfraquece o governo Dilma porque Palocci era também a
esperança da articulação política, que tem, como se sabe, um ministro
sem senioridade para organizar a fragmentada base política. Estamos no
quinto mês do governo e já há uma série de problemas políticos de
coordenação da base parlamentar. Palocci agora, como é de seu estilo,
vai fazer uma nova imersão na expectativa de que o tempo ajude a
serenar o bombardeio. Fica no governo, mas perde a musculatura que
vinha ganhando paulatinamente. Na economia e na política, um
ministro-chefe da Casa Civil submerso e acuado será ruim. Melhor seria
se ele tivesse prestado todos os esclarecimentos já que, como diz o
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não há nada que o desabone,
ou como disse o procurador-geral da República, "consultoria não é
crime". Como não há ainda informação de que a consultoria que prestava
tivesse qualquer relação com facilitação de negócios no governo - o
que sim, configuraria crime - Palocci deve dizer a quem prestava que
tipo de serviço. A fronteira é clara. Se ele abria portas no governo,
se intermediava negócios, o nome disso não é consultoria. Se o que ele
tratava com seus clientes eram assuntos nos quais adquiriu expertise e
sobre os quais não tinha poder de decisão, tudo se esclarece.
A defesa do ministro parece à deriva. O pior dos lances foi aceitar a
negociação do acordão no Congresso sobre o qual se fala desde
quarta-feira nos meios políticos: o ministro não depõe, o governo põe
em votação o Código, o PMDB apresenta uma emenda que torna ainda mais
ampla e irrestrita a anistia aos desmatadores. E fica assim concedida
a floresta como moeda.
Os dados do Imazon foram infelizmente confirmados pelo Inpe: aumentou
o desmatamento nos últimos meses. O governo como reação criou um
gabinete de crise para tentar reverter a situação. É preciso
urgentemente dizer ao governo o que o governo anda fazendo no mesmo
campo. Tudo se passa como se fossem assuntos estanques. A proposta de
reforma do Código Florestal embute uma anistia e flexibilização da
legislação ambiental do país e o desmatamento aumenta. Claro. É o
moral hazard, ou seja, quem desmata já sabe que o governo que cede uma
vez, cederá sempre. Já desmatam à espera de novas concessões. Perderá
eficiência a mais potente de todas as armas: a que proíbe o
financiamento a quem desmatou.
A oposição joga papel lamentável. Quase todo o PSDB se aliou ao que há
de mais atrasado no ruralismo. Todo o DEM está com o atraso. É da sua
natureza. Eles se juntam aos peemedebistas e integrantes de outros
partidos da base do governo para aprovar projeto que derruba um
movimento que começou no governo Fernando Henrique. Naquele governo,
depois de um número escandaloso e recorde de desmatamento, foi
proposta a ampliação da reserva legal da Amazônia e leis mais duras
contra desmatadores. No período Marina Silva, no governo Lula, foram
dados passos fundamentais no combate ao abate das florestas. É ao
retrocesso que se alia a oposição.