O GLOBO
É mais do que a queda de um Boeing. De novembro para cá, morreram pelo menos 307 pessoas em sete estados castigados pelas grandes chuvas que têm marcado os últimos meses. A chuva encharcou o Rio nas últimas horas num índice muito acima do normal, e isso criou o caos urbano. O problema é que o anormal de hoje pode ser o normal de amanhã.
Os climatologistas avisam que eventos mais extremos ficarão mais frequentes. O que será das cidades que hoje já não absorvem a água que cai? Cada evento é tratado como fato isolado, as autoridades demonstram não esperá-lo e dele não tiram lições. Se os eventos vão ficar mais frequentes como parte das mudanças que os climatologistas dizem que estão contratadas, as cidades precisam se preparar para este futuro. Mas o quadro é pior: elas não estão preparadas para o presente.
O Brasil é urbano. O espaço urbano abriga 80% dos brasileiros. As cidades, pequenas, médias e grandes, têm os mesmos defeitos: bueiros entupidos, drenagem deficiente, construções nas encostas, ocupação desordenada do espaço, excessivo bloqueio do solo, concretagem de margens de rios, lixo e esgoto jogados em rios e córregos. Estamos despreparados para qualquer chuva forte nos padrões atuais. Os administradores públicos e as empresas, que não se planejam para os eventos regulares, não têm planos de emergência para o fato extraordinário.
Eventos extremos não são apenas chuvas e enchentes; são também secas mais severas e prolongadas, ciclones mais fortes. O Brasil trata cada caso como se ele fosse uma surpresa, um fato único. Assim que passa a situação emergencial, os governos se desligam do assunto como se aquilo não fosse mais se repetir. Santa Catarina, depois das tragédias das chuvas em 2008, aprovou uma lei que permite mais desmatamento nas encostas. Segundo o site Contas Abertas, o Ministério da Integração, cujo ministro era até a semana passada Geddel Vieira Lima, mandou R$69 milhões para a prevenção e preparação para desastres nos municípios baianos e R$8,7 milhões para os do Rio, São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul, somados.
O Brasil precisa de mais respeito ao dinheiro público, mais rigor nas regras urbanas; precisa equipar a defesa civil, investir em saneamento, drenar as cidades, ter uma matriz energética que não dependa tanto da hidroeletricidade. Isso não significa aumentar as térmicas mas apostar em alternativas limpas para os momentos de secas severas. Elas virão, isso é tão certo quanto as chuvas intensas.
Cada órgão público tem que saber o que fazer em momentos de emergências. Segunda-feira à noite no Galeão não havia um único meio de transporte para sair do aeroporto, nem sinal da existência da Infraero nas longas horas de espera por transporte. Nas emergências, os responsáveis somem, em vez de aparecer para mostrar que têm um plano para enfrentar o problema. A mesma situação de abandono dos passageiros aconteceu em Guarulhos.
Moro no Alto Gávea, e no meu terreno há uma encosta cuja vegetação mantive preservada. Há três anos, uma parte pequena dela desceu, e chamei a Georio para me orientar a conter a encosta da forma correta. O funcionário, para meu espanto, lavrou uma autuação me intimando a resolver o problema. Situação kafkiana. Perguntei ao funcionário o motivo da agressividade já que eu tinha pedido por um conselho. Ele disse que era a única forma de "abrir um procedimento" para que eu fosse orientada. A orientação foi procurar uma empresa de uma lista. Chamei a primeira, e ela me apresentou um projeto ambientalmente errado - fazer um paredão de concreto - e me cobrou um valor extorsivo. Recusei o projeto. Procurei outras, ouvi diagnósticos contraditórios. Fui multada. A multa nunca chegou, fiquei sabendo dela por um funcionário que esteve na casa para "inspecionar" minha encosta. Tive que correr atrás da multa para pagá-la.
A vegetação voltou a crescer e o terreno se estabilizou, até que o vizinho resolveu tirar a parte dele do morro para construir uma área de lazer. A encosta voltou a ficar instável. Como há um novo prefeito, chamei a Georio novamente. Desta vez, foi uma relação normal de munícipe com a prefeitura - sem ameaças, intimações e achaques - mas o problema é a falta do sentido de urgência. Tenho que fazer um projeto, aprová-lo na prefeitura para depois executá-lo.
O Rio, espremido entre mar e montanha, com um terreno específico, em camadas, que parece às vezes se esfarelar, é de extremo risco para seus moradores, se as grandes águas descerem mais frequentemente. No Brasil todo há problemas, cada pessoa tem sua história. A questão é que agora não é mais um aborrecimento individual. Estão se acumulando as tragédias. Quem ouve os climatologistas sabe que o futuro será pior. Nós não estamos preparados para o presente, para um dia de chuva mais intensa, e temos que planejar as cidades para enfrentar um clima mais rigoroso e em mudança. O poder público não está preparado para proteger os pobres, orientar a classe média, impor a lei a todos, usar bem os impostos nem prevenir o previsível.
Entrevista:O Estado inteligente
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