O ESTADO DE S. PAULO
Amanhã será realizada em Brasília a segunda reunião de cúpula dos Brics. Não se trata aqui de montar um arsenal de decisões econômicas e políticas com consequência para o resto das nossas vidas. Trata-se apenas da retomada de um processo de entendimento que pode, sim, um dia, ter algum significado estratégico que, no momento, ninguém prevê.
Esta é a primeira vez que uma sigla montada sem nenhum conteúdo especial ganha importância pelo sentido que no futuro poderá ter. Bric é um acrônimo. É uma palavra formada com as iniciais de quatro países afastados entre si: Brasil, Rússia, Índia e China.
Foi criado em 2001 por Jim O"Neill, economista-chefe do Goldman Sachs, para designar os quatro países emergentes com mais probabilidade de se transformar em potência econômica.
Bric não estabelece nem mesmo uma ordem entre as letras. Podia ser Cirb, Crib ou Birc. Ficou sendo Bric aparentemente porque lembra tijolo em inglês (brick).
Quando o Financial Times criou o termo Pigs (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha), pelo menos referia-se a certa unidade geográfica (os quatro são da União Europeia) e a uma característica comum: potenciais maus pagadores. Nem mesmo isso pode ser encontrado nos Brics.
Os quatro detêm uma população de 2,9 bilhões de habitantes (43% do mundo), um PIB conjunto de US$ 8,7 trilhões (17% do mundo), exportações de US$ 1,8 trilhão (12%) e reservas externas de US$ 3,4 trilhões (38% do total). No entanto, não apresentam nenhuma unidade, nem política nem geográfica nem econômica.
Não mantêm entre si alianças estratégicas, nem permanentes nem episódicas. Ao contrário, entre eles há notáveis divergências. China e Índia, por exemplo, procuram empurrar produtos fabricados em seus países a preços que muitas vezes são considerados dumping (vendidos abaixo do custo) no Brasil. Apesar dos esforços do ministro de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, de que se construa a sua bombinha, o Brasil é o único que não faz parte do seleto clube nuclear e isso, por si só, o deixa estranho no ninho.
Mas o fato relevante é que Bric foi uma designação que pegou. Todo o mundo a conhece e a toma como referência em qualquer fórum econômico quando se quer designar um conjunto de países que se notabiliza pela atual e, sobretudo, potencial energia econômica, especialmente quando a ele se compara o que hoje acontece nos países de alta renda.
Pó de carvão, enxofre e salitre são materiais que isoladamente não dizem muita coisa. Quando um chinês desconhecido os misturou, inventou a maravilha dos fogos de artifício. Séculos mais tarde, os portugueses viram aquilo a que deram o nome de pólvora e lhe deram outro uso.
Deve ser a expectativa de que um dia aconteça alguma coisa parecida com os Brics que chama atenção para essa reunião. O simples fato de que seus líderes estão agora se falando sugere que o novo agrupamento pode ganhar consistência e, quem sabe, tornar-se um bloco coeso.
Se isso acontecer, será a primeira vez que um exercício despretensioso de um economista ganhará significado.
Escorregando
As cotações do dólar voltaram ao patamar do início de janeiro. De lá para cá, as reservas externas cresceram 2,6%. O Banco Central comprou cerca de US$ 6 bilhões em moeda estrangeira nesse período. Mesmo assim, as cotações do dólar continuam escorregando no câmbio. Em abril (até ontem), a baixa acumulada é de 1,9% e em 12 meses, de 20,4%.
Mostrando o muque
"A força dos quatro" é o título do artigo sobre os Brics que saiu ontem no Times of India. Assina o presidente russo Dmitri Medvedev.
Entrevista:O Estado inteligente
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