Entrevista:O Estado inteligente

domingo, junho 14, 2009

Os perigos do "pior já passou" Yoshiaki Nakano

 FOLHA DE S. PAULO

Se houver uma reversão prematura das políticas monetária e fiscal, novas crises poderão ocorrer
A MAIOR PARTE das economias apresenta hoje sinais de que o pior já passou. Houve desaceleração no ritmo de deterioração econômica nos EUA e na Europa, e retomada do crescimento, ainda que em ritmo muito menor, na China e na Índia. No Brasil, os indicadores são ainda ambíguos. Estamos entrando em um momento perigoso, com o surgimento da sensação de que o pior já passou, o que pode levar ao relaxamento e à reversão nas ações de políticas anticrise, ou ao retorno das práticas financeiras que desencadearam a própria crise.

Além do mais, não há ainda informações suficientes para crer que tenhamos passado o ponto de inflexão nas citadas economias e iniciado uma recuperação duradoura. Muito menos que a crise financeira esteja se resolvendo. Nesse quadro, novas crises ou deteriorações tanto financeiras como econômicas poderão ocorrer, pois a sensação de otimismo infundado fortalecerá os grupos que se opõem, ideologicamente, às medidas intervencionistas dos governos, forçando a reversão prematura das políticas monetária e fiscal.

Em resposta à crise, os governos injetaram trilhões de dólares de recursos fiscais. O crescente déficit e o endividamento público já começaram a pressionar a taxa de juros. Nos EUA, o Estado é hoje dono de empresas-símbolo como a GM, dos principais bancos, da maior seguradora e das duas maiores e mais importantes instituições de crédito imobiliário. Isso fere os valores de um cidadão típico americano e tem forte oposição ideológica dos republicanos. Num país onde há forte consciência tributária, a sensação de que o pior já passou pode levar a população a pressionar para que esses programas de socorro sejam interrompidos -e os recursos injetados sejam recuperados pelo Tesouro.

Os bancos centrais, para evitarem o colapso do sistema financeiro, provocaram forte expansão monetária em todo o mundo. Nos EUA, a base monetária chegou a se expandir em mais de 350%. Assim, se depois de iniciada a recuperação não houver o recolhimento rápido dessa injeção monetária, a inflação certamente retornará. Com a sensação de que o pior já passou, não faltarão pressões para que a política monetária se torne contracionista. Se as políticas monetária e fiscal forem revertidas e se tornarem contracionistas, poderemos assistir a um novo agravamento do setor real das economias. Isso aconteceu em 1936 nos EUA, em plena crise de 30, levando sua economia à profunda depressão.

Aconteceu também em 1997, na crise financeira japonesa dos anos 90.

Podemos ter uma nova crise financeira dentro da crise atual, causada pelas próprias reações dos governos. Com a injeção de trilhões de dólares pelos BCs, com as taxas de juros muito baixas e com a sensação de calma, o mercado já volta a especular com algumas moedas e nas Bolsas dos países emergentes. Isso poderá resultar em novas bolhas e em novas crises dentro da crise.

Só com a reestruturação do sistema financeiro, de modo que se evitem os excessos das últimas décadas, com a redução dos desequilíbrios globais e com a definição de novas ondas de inovação e de investimentos, a economia mundial iniciará a verdadeira retomada do crescimento.

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