Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, janeiro 30, 2007

Os crediários de Lula 1 - Vinícius Torres Freire



Folha de S. Paulo
30/1/2007

Brasileiros trocam dívidas no cheque especial e no cartão pelo crédito consignado; crédito cresce bem; PIB não

O TOTAL de empréstimos no cartão de crédito e no cheque especial era equivalente ao saldo do crédito consignado, aquele com desconto em folha de pagamento, ali pelo final de 2004, meados do governo Lula. No final de Lula 1, o saldo do consignado é o dobro do total de dívidas tomadas por meio de cheque e no cartão, que são carésimas e receitas quase certas de falência pessoal (se considerados todos esses números como proporção do total de créditos pessoais). É o que se depreende do balanço do setor financeiro, publicado ontem pelo Banco Central.
Seria preciso mais detalhes das operações de empréstimos pessoais a fim de entender melhor como as famílias lidaram com suas dívidas nesses últimos dois anos, mas os números indicam que as pessoas trocaram dívidas caras por dívidas mais baratas. Ainda que as taxas de juros dos créditos consignados sejam de também natureza extorsionária, parece que o cidadão aproveitou a oportunidade para baratear um pouco o tamanho da sua pendura e de seus papagaios.
Apesar de todas as críticas, entre elas a de que o crédito consignado induz velhinhos a se endividar e que estimula endividamentos incontornáveis, a medida do governo Lula pareceu positiva. De resto, o consignado, apesar de ainda carésimo, ressalte-se, é mais uma evidência de que as taxas de juros são menores em empréstimos com maiores garantias -como já podia ver nos financiamentos de automóveis e, recente e timidamente, nos empréstimos para imóveis.
Apesar de alertas meio exagerados, o aumento do crédito não provocou uma explosão nos atrasos de pagamentos e na inadimplência, embora a quantidade de créditos ruins permaneça em níveis algo desconfortáveis desde o segundo trimestre do ano passado. Os juros bancários não acompanharam proporcionalmente a queda dos juros básicos (de mercado e do Banco Central). Desde maio, o aperto no "spread", aliás, foi proporcionalmente maior que a alta na inadimplência ("spread" é a diferença entre a taxa pela qual os bancos captam dinheiro e a taxa pela qual emprestam, grosso modo).
Nos quatro anos do governo Lula, o volume de crédito em relação ao PIB subiu. Isso jamais havia acontecido desde o Plano Real, embora a participação dos financiamentos sobre o PIB seja ainda menor que a de 1995, que pode ser um ano estatisticamente esquisito e de vôo de galinha econômico. Mas desde o Plano Real não tínhamos quatro anos tão calmos na economia brasileira, cortesia da estabilidade mundial.
Enfim, a gente fica imaginando o que foi feito da expansão do crédito: como ele circulou pela economia e a modificou? Os números mais gerais dão a impressão de que a expansão fiscal (dos gastos do governo, em especial com os mais pobres) e do crédito está financiando muito consumo, o que está aparente nas vendas do varejo. Como o brasileiro em geral é pobre, é alta sua propensão a consumir (isto é, gastar cada real adicionado a sua renda). Mas, dados o câmbio, os impostos e outros sabidos rolos da economia brasileira, tal impulso de consumo está pesando na balança do comércio e, por ora, ajudando a puxar o PIB para baixo.

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