Apesar das divergências, ou até por causa delas, o PSDB saiu de sua convenção nacional sábado passado melhor do que estava. Isso porque conseguiu não apenas expor suas diferenças de maneira aberta, o que anteriormente só aparecia por baixo dos panos ou em fofocas de bastidores, mas definir uma linha de orientação.
Ficou claro que, no momento, o grupo majoritário do partido apoia o ex-governador de Minas e atual senador Aécio Neves, e a direção política será dada a partir de agora por esse grupo.
Ao mesmo tempo em que teve que aceitar essa hegemonia, o ex-governador José Serra teve força suficiente para ganhar um papel de relevância na direção partidária, deixando explícito que sem São Paulo não é possível se pensar em um projeto viável na sucessão presidencial, assim como, nas três últimas vezes, não foi possível vencer sem o apoio de Minas.
Escantear deliberadamente uma liderança política como Serra, como setores do partido desejariam, seria suicídio, assim como não tinha o respaldo da realidade o sonho do grupo serrista de dominar o partido.
Se tentasse impor sua vontade - que primeiro foi ser presidente do partido, e por fim assumir a direção do Instituto Teotônio Vilela (ITV) para, a partir dali, fazer sua campanha para ser mais uma vez candidato a presidente -, Serra constataria que já não tem a maioria do partido a seu lado.
Pelo menos no momento.
Não chegou a haver uma disposição real de a representação paulista boicotar a convenção caso Serra não fosse aquinhoado com uma boa posição, pelo simples fato de que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador paulista Geraldo Alckmin atuaram sempre de comum acordo e na base da temperança, não permitindo que predominasse a tentativa dos mais radicais, nem de um lado nem de outro.
A partir de agora, a realidade pautará as ações do partido e de cada uma de suas forças políticas. O ex-governador e candidato duas vezes à Presidência da República José Serra terá uma exposição política, se não à altura de seus sonhos, condizente com sua importância no cenário político brasileiro, de onde poderá ajudar o partido e ajudar-se, reorganizando seus contatos nas bases, à espera de uma mudança de ventos.
Já o PSDB começa uma nova fase claramente sob a liderança política do senador Aécio Neves, que manteve o controle da direção nacional e colocou no ITV o ex-senador Tasso Jereissati, recuperando para a vida pública uma das maiores lideranças do partido, e dando a ele uma tarefa a que está acostumado, com sucesso: reunir técnicos e pensadores para balizar as ações partidárias.
O senador Aécio Neves sai do embate como o provável candidato do PSDB à sucessão de Dilma Rousseff, retemperado pela vitória.
Mas também precisará demonstrar que está preparado para o papel que almeja há tanto tempo.
Com a manobra política que lhe assegurou a maioria partidária, Aécio Neves reafirmou sua capacidade de costurar acordos políticos nos bastidores, que já demonstrara em ocasiões anteriores.
Especialmente quando surgiu como fato consumado a preferência dos tucanos e de outros partidos da base em vêlo presidente da Câmara em vez de Inocêncio de Oliveira, do então PFL, como estava combinado com o presidente Fernando Henrique.
O ex-governador José Serra, um especialista em manobras de bastidores, e político ousado e temido, negava a Aécio Neves essas habilidades, e tentou enfrentá-las, sem sucesso, nessa empreitada de agora.
A política, no entanto, volúvel como as nuvens do mineiro Magalhães Pinto, não dá a ninguém vitórias antecipadas, e nem declara a morte de véspera de qualquer político, especialmente da categoria de José Serra.
A partir de agora, ele terá de se adaptar à realidade que superou seus desejos, mas pode também aguardar em boa posição para ver como ficarão as coisas a longo prazo.
Tem tempo e paciência para tal.
Se decidir concorrer à prefeitura de São Paulo, que não era sua escolha até recentemente, Serra estará deixando o caminho livre para Aécio Neves.
O fim de sua carreira política no cargo de prefeito paulistano não é uma opção ruim, pois estará à frente do terceiro cargo mais importante politicamente do país, perdendo apenas para a Presidência da República e o governo de São Paulo.
Desse cargo, terá influência política de sobra, seja qual for o presidente eleito em 2014. Especialmente se ele for do PSDB.
Mas, se persistir na tentativa de disputar a Presidência da República, a presidência do Conselho do PSDB lhe dará uma exposição pública, e meios de manobras internas, desde que tal conselho venha realmente a funcionar.
O fato de ele ter ganhado poder deliberativo foi sem dúvida uma vitória de Serra, embora não tenha sido uma decisão de última hora como está sendo divulgado.
Já na sexta-feira estava claro que só faria sentido oferecer esse conselho a Serra se ele tivesse funções práticas. Porque seria suicídio político abrir mão de sua real contribuição ao partido.
Assim como não queriam que Serra assumisse o ITV para que não tivesse verba e autonomia para fazer dele seu palanque político, também o conselho não poderá ser usado com interesses eleitorais.
Da mesma maneira, Aécio Neves terá que se conduzir com cautela mineira para não usar a estrutura partidária em benefício próprio.
Fazer com que os interesses do partido estejam representados nos diversos estados, e levar a discussão dos temas nacionais para as bases partidárias, a partir da eleição municipal do próximo ano, será a tarefa principal da nova direção.
A candidatura de Aécio à Presidência terá que vir como decorrência desse trabalho, e não como imposição dele.
Mesmo porque as negociações mostraram que há outro líder que tem que ser levado em conta, o governador Geraldo Alckmin.
Com a ida de seu vice Afif Domingos para o PSD, Alckmin ficou um pouco preso à sua própria sucessão, para não deixar o governo nas mãos do partido de Kassab.
Mas, de novo, este é um retrato do momento. Até 2014 muita água vai rolar.
E Aécio terá de utilizar todos os truques que aprendeu na política mineira para manter a posição de favorito ao posto de candidato tucano na sucessão de Dilma Rousseff