Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 28, 2016

Samuel Pessoa Política esperará inflação ou punição do mercado para arrumar a casa? - 28/08/2016 - Colunistas - Folha de S.Paulo

Política esperará inflação ou punição do mercado para arrumar a casa? - 28/08/2016 - Colunistas - Folha de S.Paulo
O governo interino do presidente Michel Temer tem emitido sinais dúbios. Há o diagnóstico de que é necessário realizar um ajuste fiscal estrutural. No entanto, o governo emite muitos sinais na direção contrária.
Foram aprovados ou estão próximo da aprovação pelo Congresso Nacional 14 projetos que aumentam salários de inúmeras carreiras do serviço público. Desnecessário dizer que, nas atuais circunstâncias de desemprego elevado e salário real em queda para o setor privado, é difícil justificar politicamente o tratamento privilegiado às corporações do serviço público, que gozam de estabilidade e de salários maiores aos pagos pelo setor privado.
Já o projeto de lei complementar que renegocia as dívidas dos governos estaduais com a União foi desfigurado pelo Congresso. A principal contrapartida estrutural era definir melhor o conceito de gasto com pessoal para efeitos da verificação do limite de 60% da receita corrente líquida. Essa definição era essencial para impedir uma série de formas de contornar a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) que foram criadas nos últimos anos.
Adicionalmente, a renegociação das dívidas dos governos estaduais não foca o problema das finanças públicas dos Estados, que estruturalmente gastam mais do que arrecadam. Durante muitos anos essa situação ficou escondida, pois a receita cresceu muito acima da economia.
Ou seja, diferentemente do que boa parcela da classe política pensa, o desequilíbrio das finanças dos Estados não cessará com a volta do crescimento econômico. O crescimento minorará o problema fiscal estadual, mas não inverterá o sinal da equação.
Aparentemente tucanos e democratas reconheceram o tamanho do problema e estão pressionando o governo Temer. Para todos os que conhecem o PMDB, é difícil se convencer da súbita conversão à responsabilidade fiscal.
O senador Ricardo Ferraço, do PSDB do Espírito Santo, apresentou relatório contrário ao projeto de lei que eleva os salários do STF, na terça-feira passada (23), na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos). Valdir Raupp, do PMDB de Rondônia, apresentou voto em separado favorável ao pleito do Supremo.
Já se fala que o projeto de emenda constitucional que estabelece o teto para o crescimento nominal do gasto primário da União ficará para ser aprovado em 2017. Certamente a aprovação da reforma da Previdência ficará para depois.
É possível que a lassidão fiscal verificada até o momento seja reflexo da falta de força que resulta da interinidade.
Outra interpretação é que os políticos –num momento em que a economia ensaia retomada tímida e as expectativas inflacionárias e a própria inflação são cadentes– têm muita dificuldade de enxergar claramente o problema fiscal e consideram que a elevação da receita que virá com a recuperação será suficiente para arrumar a casa. Nunca faltarão economistas para defender essa tese. E, certamente, os políticos preferirão seguir esses economistas com mensagens mais auspiciosas.
Assim, há risco real de termos que esperar alguma punição maior do mercado –como ocorreu com Joaquim Levy a partir de agosto do ano passado– ou o retorno da inflação para que a política pense de fato em arrumar a casa fiscal.

sábado, agosto 27, 2016

Olimpíadas: oportunidades em aberto Josef Barat



O ESTADO DE SÃO PAULO - Economia e Negócios

Quarta Feira , 24 de Agosto de 2016.



Em geral, a importância de sediar os Jogos Olímpicos é medida pelo legado que deixam nas cidades que os recebem. São profundas mudanças na configuração urbana, melhorias nas infraestruturas em geral – particularmente nas de mobilidade – parques olímpicos que se integram ao lazer dos cidadãos, bem como construções e equipamentos esportivos que, em tese, contribuirão para ampliar a cultura do esporte. Outra métrica é a do número de visitantes, principalmente estrangeiros, pelo que aportam de receita para o comércio e serviços, além da ampla divulgação mundial das atratividades da cidade sede.

No entanto, os Jogos Olímpicos também têm impactos na economia como um todo, na medida em que estimulam expectativas e confiança nos agentes produtivos. Há toda uma cadeia de produção e negócios que se forma em torno dos Jogos, o que acaba por dinamizar o ambiente econômico. Em países onde prevalece uma visão voltada para estratégias de longo prazo, sediar uma Olimpíada pode ser o detonador de uma multiplicidade de iniciativas nas atividades criativas voltadas para a inovação e o aproveitamento de talentos. Neste sentido, há toda uma soma de esforços coordenados de entidades públicas e privadas, para fortalecer e ampliar o alcance desta cadeia produtiva.

Em um mundo globalizado e competitivo, abre-se assim uma oportunidade única de inserção mais ampla e forte no cenário internacional. O que pode beneficiar, em muito, o comércio exterior, a atração de investimentos, a divulgação de marcas e produtos do país, enfim toda uma gama de possibilidade para atingir um novo patamar de presença mundial. Se as oportunidades são bem aproveitadas, abrem-se perspectivas muito amplas, que acabam por transcender o esporte e a magnitude do evento em si.

Um legado importante, também, é o de todo um esforço coordenado de governos, grupos empresariais, universidades e centros de pesquisa, no sentido de tirar partido dos Jogos Olímpicos para fomentar o esporte. O planejamento de longo prazo e os investimentos voltados para o fator humano – aprimorando atletas e treinadores – acabam difundindo pela sociedade, o interesse e oportunidades para atrair mais atletas. Os exemplos recentes de Pequim e Londres, mostram como, desde os anos 90, a visão de longo prazo influiu decisivamente no posicionamento atual das equipes desses países no ranking de medalhas.

Países que investem na pluralidade das práticas esportivas e no treinamento consistente da escola à universidade atingem níveis de excelência em uma gama mais ampla de modalidades do esporte. Maior o número de medalhas, maior o potencial de disseminação do esporte. O caso dos Estados Unidos é emblemático e demonstra o sucesso da articulação de investimentos privados e interesse público no estimulo à pratica esportiva, modelo que permaneceu e se aprimorou ao longo do tempo. Grã-Bretanha e China são casos bem planejados de sucesso, a primeira estimulando parcerias público-privadas e a segunda driblando a ortodoxia estatal.

O Brasil, com o seu renitente distanciamento em relação ao mundo, não entendeu bem para que serve o privilégio de sediar os Jogos Olímpicos. A atenção – sempre de curto prazo e oportunista – concentrou-se nas obras e nos aspectos mais superficiais e visíveis do legado urbano. Pouco se aproveitou do gigantesco potencial de estimulo econômico e subestimou-se o potencial de maior integração ao circuito mundial da inovação e criatividade.

Do ponto de vista estrito da atividade esportiva, frustrou-se a expectativa de programas bem estruturados e consistentes de descoberta de talentos e treinamento desde a escola até a universidade. Com a exceção de apoios pontuais e meritórios das Forças Armadas e de algumas empesas, nossos atletas tiveram que enfrentar, via de regra, enormes dificuldades para alcançarem sucesso nas competições. Avançamos nas medalhas e diversificamos as participações, é verdade, mas ainda há um longo caminho a percorrer para superarmos a monocultura do futebol e ingressarmos no seleto grupo das potências olímpicas.


Josef Barat - Economista, Consultor de entidades públicas e privadas, é Coordenador do Núcleo de Estudos Urbanos da Associação Comercial de São Paulo. 

 

 

 


quinta-feira, agosto 25, 2016

O reajuste previsto no... déficit - Carlos Alberto Sardenberg

O reajuste previsto no... déficit - Jornal O Globo

O reajuste previsto no... déficit

Indicadores da economia brasileira, nesta véspera do impeachment, podem ser divididos em três grupos:

— os que continuaram piorando, mas estão piorando menos;

— os de estabilidade (pararam de piorar no fundo do poço);

— os que mostram um começo de recuperação.

E há indicadores misturados. Considerem, por exemplo, os salários pagos no setor privado formal. Em maio, segundo a pesquisa Salariômetro, da Fipe-USP, a folha de salários nacional chegou a R$ 99,3 bilhões. É menor do que o número verificado um ano atrás, porém um pouco maior que a folha de abril.

Outro dado importante da mesma pesquisa. Em janeiro deste ano, nada menos que 68% dos ajustes salariais negociados ficaram abaixo da inflação — portanto, com perda real para os trabalhadores. Para junho, 37% dos ajustes perderam da inflação. É melhor, indica que a maior parte dos assalariados conseguiu repor sua renda nesse mês, mas continua ruim para boa parte dos trabalhadores com carteira assinada.

Mas, por qualquer lado que se verifique, há uma conclusão comum: a sociedade brasileira já está pagando um preço muito alto pela crise econômica causada pelos enormes erros dos governos Lula (no segundo mandato) e Dilma. A carga maior ficou para os trabalhadores do setor privado: o desemprego chega a 12 milhões de pessoas, e os salários reais caíram.

Não raro, houve queda dos rendimentos nominais. Segundo a mesma pesquisa da Fipe, entre janeiro e junho deste ano, 208 acordos coletivos tiveram redução de salários. Claramente, esses trabalhadores trocaram salário por emprego, entendendo a situação de dificuldade real das empresas, com queda de vendas e aumento de custos.

Pois este é um ponto a ressaltar. As empresas não constituem um grupo de vampiros querendo sugar o sangue dos trabalhadores e dos consumidores. As companhias evitam demitir e fazem esforços enormes para não aumentar preços neste momento de recessão.

Em vários setores, trabalhadores e patrões conseguiram colocar-se de acordo para ao menos amenizar as perdas.

Mas tem uma grande empresa chamada governo, cujos donos, os contribuintes, não comandam a sua gestão. Quem toma as decisões sobre essa grande companhia são deputados e senadores e dirigentes do Executivo.

Essa empresa está quebrada — e por ser a parte dominante da economia brasileira, sua crise se espalha por toda a sociedade. Para simplificar, a causa maior da crise brasileira está na destruição das finanças públicas: despesas crescendo mais do que a receita; estatais endividadas; bancos públicos com problemas de inadimplência; obras inacabadas e muito mais caras que o previsto; má gestão e corrupção; empresas público/privadas, como a Sete Brasil, espalhando prejuízos para o governo e setor privado.

Resumindo: essa companhia, no seu braço federal, vai fazer um déficit de R$ 170 bilhões neste ano e outro de R$ 139 bilhões em 2017.

Faz sentido essa companhia-governo conceder reajustes salariais para as categorias de trabalhadores mais bem remuneradas e com garantia de emprego?

Sim, sabemos o argumento dos dirigentes sindicais e dos políticos e gestores: esses reajustes do funcionalismo apenas repõem a inflação.

Apenas?

Uma companhia quebrada — e cuja situação prejudica toda a sociedade — tem que fazer um baita ajuste, com redução de seus gastos.

Dizem ainda: os novos gastos com a folha já estavam previstos no Orçamento. Mas o Orçamento é deficitário. Logo, estão nos dizendo: tudo bem reajustar os salários do funcionalismo, pois isso já está previsto no... déficit!

Tem mais. Essa companhia-governo pretende cobrar uma conta de parte de sua clientela, os aposentados e pensionistas do INSS. Aprovada uma reforma, esses clientes, todos do setor privado, que já pagam pela crise com salários menores e desemprego — terão benefícios menores e trabalharão mais anos para obter a aposentadoria.

Sim, a reforma da Previdência é uma necessidade. Sem ela, não há ajuste, o que seria ruim para toda a sociedade.

Por isso mesmo, é mais do que necessário, é justo, eticamente indispensável e politicamente obrigatório que se faça também reforma na administração pública, na gestão dessa companhia-governo. Inclusive para ao menos reduzir as distorções que separam elite e base do funcionalismo.

Carlos Alberto Sardenberg é jornalista



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sexta-feira, agosto 19, 2016

Montoro, votos e valores

Montoro, votos e valores

Montoro, votos e valores

Este é o ano do centenário de André Franco Montoro, deputado estadual, federal, senador e governador de São Paulo, um político vindo da Democracia Cristã, então uma corrente ideológica influente. O que se segue é um relato baseado em observações de quem participou da campanha e do governo Montoro.

         Estamos em 1982. Começam as campanhas para governador em todos os Estados, as primeiras eleições livres  e diretas desde a instalação do regime militar, em 1964. O Brasil está em recessão, logo vai dar um calote na dívida externa e esse fracasso econômico é a pá de cal que enterra o regime. O Movimento Democrático Brasileiro (MDB) vai ganhar. Em São Paulo, o então senador Franco Montoro abre sua campanha como favorito disparado.

         Ainda assim, havia um certo pé atrás em relação a ele, isso no ambiente político profissional. Dizia-se: é muito ideológico, pouco realista; muito visionário, pouco capaz na política do dia-a-dia; sonhador, não pragmático.

         Havia alguma verdade nesses comentários. Montoro colocava temas então inesperados. Por exemplo: meio ambiente, ou a tese segundo a qual o desenvolvimento industrial deveria ser submetido a regras de proteção ambiental. Isso dito em 1982, quando o país precisava justamente de uma retomada da indústria, parecia uma loucura.

         E não era só uma tese. Montoro havia assumido a bronca da população da Baixada Santista com a poluição espalhada pela indústria petroquímica de Cubatão - e prometia mudanças.

         Vai matar a indústria, diziam.

         Também se empolgava com as ideias de economia comunitária. Nos comícios pelo interior, pregava a criação das hortas familiares e comunitárias.

         Ora, diziam, São Paulo precisa é de um baita agronegócio.

         Descentralização era outro tema caro. A ideia: transferir poder e recursos para os municípios, o que seria mais eficiente e mais fácil de fiscalizar.

         Também era criticado por isso: os prefeitos vão gastar tudo em fontes luminosas, diziam.

         Aliás, aqui estava outro ponto crucial, a volta dos políticos ao poder. Depois de 18 anos de regime militar e tecnocrático, os políticos sonhavam com o momento em que poderiam de novo comandar a distribuição de verbas e cargos.

         Muitos dos que estavam na campanha, entre os quais me incluo, demoraram para entender Montoro. Olhando assim de imediato, de fato parecia ridículo falar em hortas comunitárias no momento em que o país passava por uma forte recessão, sendo São Paulo duramente atingido.

         Com o tempo, a gente foi percebendo que Montoro estava longe da ingenuidade. Ao mesmo tempo em que falava das hortas, cercava-se de economistas de primeira linha, aos quais confiou e delegou a gestão da macroeconomia. Falava em dar poder aos políticos, mas acrescentava as restrições orçamentárias e éticas.

         Certo dia, prefeitos do Vale do Paraíba, uma próspera região paulista, foram ao governador exigir a construção de um sistema de viadutos. Montoro dizia que a demanda era justa, mas não tinha dinheiro no orçamento.

         Os prefeitos insistiam: o senhor está agindo como tecnocrata; esta não é uma decisão técnica, é política.

         Montoro: então, está feito; politicamente, o viaduto está decidido; quando tiver dinheiro a gente faz.

         Outra história exemplar: na reta final da campanha, já vitoriosa, o MDB passa a receber uma enxurrada de adesões. Certo dia, há um comício para receber líderes sindicais. Terminando o evento, os militantes mais ideológicos, digamos, questionam: esses caras aí são pelegos, estavam quietinhos até ontem.

         Montoro: bom, se a gente dividir o mundo em pelegos e não-pelegos, eles caem no lado dos pelegos. Mas o mundo não funciona assim.

         Então entra todo mundo neste ônibus?

         Entram muitos, respondeu, mas vamos lembrar durante o governo: esses aí não gostam da gente, muito menos de nossas ideias, gostam do poder.

         O início do governo Montoro foi difícil e tumultuado. Houve pesada oposição do PT, que dizia não haver diferença entre MDB e Arena, o partido do regime militar, e restrições administrativas e econômicas do governo militar. Além disso, a primeira gestão Montoro tinha de fato muitos românticos, mais do que operadores políticos.

         Isso foi balanceado - e a coisa andou. Inclusive com a políticas de municipalização e restrições ambientais, que funcjonaram. E com a horta que se cultivou no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo.

         Na política nacional, lançou as Diretas Já, romântico, e depois lançou Tancredo a candidato nas indiretas, pragmático.

         Fico pensando que o país precisa de mais políticos assim, com votos e valores.  



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