O Globo |
26/1/2007 |
O presidente Lula chegou ontem a Davos com uma comitiva curiosa: apenas o chanceler Celso Amorim está confirmado no cargo. Os três outros ministros que o acompanham - Luiz Fernando Furlan, do Desenvolvimento; Henrique Meirelles, do BC; e Guido Mantega, da Fazenda - ainda não foram reconduzidos, parece que jogam uma prorrogação sem hora para terminar, e nessa condição serão os negociadores brasileiros no Fórum Econômico. E o prato principal que o país vem oferecer aos investidores, o tal Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), não parece substancial o suficiente para levá-lo a crescer dentro dos padrões das economias emergentes. Enquanto as discussões sobre o papel do Brasil na economia mundial estavam restritas à América Latina, a situação parecia boa, embora nossa taxa de crescimento econômico seja a metade da registrada na região. Afinal, nossos números estão bons - inflação baixa sob controle, juros cadentes, balança comercial com superávit expressivo, reservas suficientes para anular a dívida externa - e as questões políticas dão ao governo Lula, numa região conturbada por populismos revolucionários, a simpatia que evita críticas mais agudas e alimenta a esperança de que um dia as coisas vão melhorar. Mas bastou que questões como competitividade e produtividade entrassem em discussão para que nossos males aparecessem sem disfarces nos debates aqui em Davos. A questão da dosagem das taxas de juros, com que foram confrontados o ainda presidente do Banco Central Henrique Meirelles e o quase certo ministro da Fazenda Guido Mantega, mostrou como estamos longe dos nossos competidores. O presidente Lula mandou que os dois dessem entrevistas juntos, para mostrar a unidade do governo diante do corte de apenas 0,25% da taxa na última reunião do Copom. Com isso, referendou a posição de Meirelles, já que quem estaria em posição constrangedora seria o quase certo ministro Mantega, que pressionara publicamente Meirelles por uma queda de juros maior no lançamento do PAC. Se houve algum problema com a decisão do Copom, ela não parece ter abalado o prestígio de Meirelles, que teve graça até para comentar o protesto do ex-todo poderoso José Dirceu, que em seu blog defendeu sua saída do BC: "Dependendo do ponto de vista, pode ser bom ou ruim", brincou. Meirelles garante que, no avião em que vieram juntos para Davos, ele e Mantega mantiveram um diálogo cordial, como sempre, sem tocar na questão dos juros, sobre o que já haviam conversado anteriormente: "Ele sabia que podia acontecer, o próprio mercado previa isso". O presidente Lula também não expressou diretamente a Meirelles seu descontentamento, e no avião conversou apenas amenidades com os auxiliares. Meirelles acha que o BC ser autônomo de fato, e imune a pressões políticas, "é bom para o PAC. Os investidores podem constatar que estamos cuidando para que a estabilidade se mantenha intacta, com a inflação sob controle". Mas o crescimento de 5% da economia já este ano foi adiado pelo ministro Mantega, que passou a falar em crescimento "na direção de 5%", sem precisar quando. De manhã, o ainda ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, colocou-se em situação de constrangimento ao participar de um debate sobre competitividade entre as nações, onde o professor de economia de Columbia, em Nova York, Xavier Salai-Martin, pôs em discussão os pontos necessários para que um país seja competitivo no mundo moderno. Dos 11 pontos alistados, o Brasil sai-se mal na maioria: 1 - funcionamento das instituições: o governo tem que garantir os direitos individuais, combater o crime organizado e impedir a corrupção; 2 - o país tem que ter um sistema de infra-estrutura adequado para expandir sua economia e se relacionar com outras economias; 3 - uma boa educação primária, e adequado nível de saúde da população; 4 - educação superior desenvolvida; 5 - buscar eficiência através da competição, e não distorcer os mercados através da intervenção do governo; 6 - flexibilidade nas leis trabalhistas; 7 - estímulo à inovação, com as universidades atuando junto com as empresas para aumentar a produtividade. Em apenas quatro itens, a maioria deles relacionados com o setor financeiro, o Brasil apresenta condições de competitividade no mundo atual: sofisticação do mercado financeiro; tecnologia atualizada ( internet, telefones celulares etc..); sofisticação nos negócios, como cadeia de suprimentos, marketing, clusters. O ainda ministro Furlan tentou justificar nossos atrasos em algumas áreas, alegando que, quando as urgências são muitas, o governo tem que ter prioridades. Citou até o Bolsa Família para explicar a que tipo de urgência se referia. Furlan disse que, no Brasil, a produtividade do trabalhador tem crescido mais do que a economia. Como não podia deixar de ser, citou o PAC como esforço para melhorar a infra-estrutura, e outros melhoramentos que vêm sendo implementados e só surtirão efeito dentro de alguns anos, como a reforma do Judiciário, com a adoção da súmula vinculante. Não tendo muito para argumentar, saiu-se com uma definição ao estilo de Geraldo Alckmin antes de ser derrotado por Lula na eleição passada: "Quem está atrás tem muito campo para melhorar, ao contrário de países maduros, que têm um espaço muito pequeno para crescer". Num seminário onde se discutia competitividade, o único argumento que Furlan encontrou para não ser pessimista foi dizer que deveríamos nos comparar com o que éramos há dez anos, 15 anos, e ver o que poderemos ser nos próximos dez anos, em vez de lamentar o que poderíamos ser. Esquecendo-se de que, na competição globalizada, a comparação tem que ser com o seu concorrente, e não consigo mesmo. |
Entrevista:O Estado inteligente
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