O ESTADO DE S. PAULO
O senador Marco Maciel, sabe-se, não é homem dado a contundências.Trabalha na maciota, escolhendo sempre o gesto mais brando, o termo mais ameno.
Por isso, começa a articular o fim das medidas provisórias sem pronunciar a palavra "revogação" nem partir para uma ação categórica.
Prefere dizer que está "pensando alto" sobre a necessidade de se "repensar" o instituto da medida provisória, um instrumento típico de regimes parlamentaristas que no presidencialismo já deu o que tinha de dar (não fala desse modo assertivo, mas o recurso da tradução facilita a compreensão do argumento).
E deu em quê? Na opinião de Marco Maciel, basicamente na captura dos poderes do Parlamento. De legislar e, em consequência, também de fiscalizar e debater.
Ao funcionar referido no Executivo, o Legislativo, no raciocínio do senador, acaba se distanciando da agenda da sociedade, incorpora o desestímulo, tende à passividade e faz do Palácio do Planalto o protagonista quase absoluto da República.
A situação piorou bem, na opinião do senador Marco Maciel, a partir de 2001, quando da aprovação da Emenda 32, que alterou a sistemática das MPs. Desde então, passaram a trancar a pauta do Legislativo quando não votadas em determinado prazo.
Maciel acompanhou de perto aquela modificação. Era vice-presidente da República. Contrário à ideia, patrocinada pela base governista de Fernando Henrique Cardoso, que tinha, assim, a expectativa de que o Congresso, sob a ameaça da obstrução das votações, seria forçado a examinar as medidas.
Até então, eram editadas e reeditadas indefinidamente, vigorando pela força da inércia, sem que o Congresso deliberasse a respeito. Na prática, onde se pretendeu celeridade obteve-se paralisia e mais submissão.
De um lado o Executivo exacerbou no poder de editar MPs e, de outro, o Legislativo simplesmente abriu mão de vez da prerrogativa de examinar a constitucionalidade das medidas e devolver aquelas sem urgência ou relevância.
"Faltou a percepção correta da realidade."
Um retrato desta, Marco Maciel foi buscar antes de iniciar sua jornada. Pediu à Mesa do Senado um levantamento sobre a relação entre a quantidade de sessões deliberativas realizadas sob o império da pauta trancada e as ocorridas com a agenda livre.
Constatou o seguinte: o trancamento não apenas tem prevalecido, como tende a aumentar. Nos últimos três anos e meio, o porcentual de sessões deliberativas (sem contar as extraordinárias) com a pauta trancada nunca foi inferior a 65%.
Em 2005 o Senado teve 113 sessões, sendo que em 75 nada pôde votar; em 2006, do total de 83 sessões, em 58 a pauta esteve trancada; em 2007, a relação foi de 127 para 83; em 2008, das 115 sessões, 82 foram realizadas sob a preferência de MPs; em 2009, de fevereiro a maio houve 34 sessões deliberativas, 29 com a pauta trancada, o equivalente a 85%.
"A tendência de crescimento do trancamento da pauta é evidente, contribuindo fortemente para a percepção de que o Congresso não decide. Logo, também se fortalece o entendimento de que o Executivo precisa mesmo se valer do uso abusivo de medidas provisórias."
Fica, assim, estabelecida a confusão: o Congresso não decide por causa do abuso nas MPs e a ausência de decisão serve de pretexto para o excesso. E, qualquer modo, o Parlamento é quem paga o pato do desgaste.
Medidas como a adotada pelo presidente da Câmara, Michel Temer, de considerar o trancamento válido apenas para o exame de projetos de leis ordinárias, "amenizam, mas não resolvem".
A solução seria revogar?
"Bem, sim, mas talvez isso não tenha bom acolhimento no Executivo. Quem sabe não podemos pensar no uso da urgência constitucional acrescido de algum outro mecanismo?", pondera naquele jeito totalmente Marco Maciel de ser.
Contracorrente
O requerimento aprovado pela Comissão de Relações Exteriores do Senado, pedindo ao chanceler Celso Amorim que o Brasil retire seu apoio à candidatura do ministro da Cultura do Egito, Farouk Hosni, para a diretoria-geral da Unesco é a face pública de uma movimentação de bastidor envolvendo gente de alta patente.
Há, no governo e na oposição, inconformismo crescente com a decisão de apoiar Hosni - alvo de repúdio internacional por suas posições antissemitas - em detrimento do cientista brasileiro Márcio Barbosa, atual diretor adjunto da Unesco.
O vice-presidente José Alencar, cujo cargo o impede de manifestar-se oficialmente, dias atrás emprestou solidariedade a Márcio Barbosa em caráter pessoal, mas de maneira enfática.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi além: ofereceu-se para conversar a respeito com Bill e Hillary Clinton, ele ex-presidente, ela atual secretária de Estado dos EUA.
Não por coincidência, a Comissão de Relações Exteriores do Senado é presidida por Eduardo Azeredo, do PSDB.
O senador Marco Maciel, sabe-se, não é homem dado a contundências.Trabalha na maciota, escolhendo sempre o gesto mais brando, o termo mais ameno.
Por isso, começa a articular o fim das medidas provisórias sem pronunciar a palavra "revogação" nem partir para uma ação categórica.
Prefere dizer que está "pensando alto" sobre a necessidade de se "repensar" o instituto da medida provisória, um instrumento típico de regimes parlamentaristas que no presidencialismo já deu o que tinha de dar (não fala desse modo assertivo, mas o recurso da tradução facilita a compreensão do argumento).
E deu em quê? Na opinião de Marco Maciel, basicamente na captura dos poderes do Parlamento. De legislar e, em consequência, também de fiscalizar e debater.
Ao funcionar referido no Executivo, o Legislativo, no raciocínio do senador, acaba se distanciando da agenda da sociedade, incorpora o desestímulo, tende à passividade e faz do Palácio do Planalto o protagonista quase absoluto da República.
A situação piorou bem, na opinião do senador Marco Maciel, a partir de 2001, quando da aprovação da Emenda 32, que alterou a sistemática das MPs. Desde então, passaram a trancar a pauta do Legislativo quando não votadas em determinado prazo.
Maciel acompanhou de perto aquela modificação. Era vice-presidente da República. Contrário à ideia, patrocinada pela base governista de Fernando Henrique Cardoso, que tinha, assim, a expectativa de que o Congresso, sob a ameaça da obstrução das votações, seria forçado a examinar as medidas.
Até então, eram editadas e reeditadas indefinidamente, vigorando pela força da inércia, sem que o Congresso deliberasse a respeito. Na prática, onde se pretendeu celeridade obteve-se paralisia e mais submissão.
De um lado o Executivo exacerbou no poder de editar MPs e, de outro, o Legislativo simplesmente abriu mão de vez da prerrogativa de examinar a constitucionalidade das medidas e devolver aquelas sem urgência ou relevância.
"Faltou a percepção correta da realidade."
Um retrato desta, Marco Maciel foi buscar antes de iniciar sua jornada. Pediu à Mesa do Senado um levantamento sobre a relação entre a quantidade de sessões deliberativas realizadas sob o império da pauta trancada e as ocorridas com a agenda livre.
Constatou o seguinte: o trancamento não apenas tem prevalecido, como tende a aumentar. Nos últimos três anos e meio, o porcentual de sessões deliberativas (sem contar as extraordinárias) com a pauta trancada nunca foi inferior a 65%.
Em 2005 o Senado teve 113 sessões, sendo que em 75 nada pôde votar; em 2006, do total de 83 sessões, em 58 a pauta esteve trancada; em 2007, a relação foi de 127 para 83; em 2008, das 115 sessões, 82 foram realizadas sob a preferência de MPs; em 2009, de fevereiro a maio houve 34 sessões deliberativas, 29 com a pauta trancada, o equivalente a 85%.
"A tendência de crescimento do trancamento da pauta é evidente, contribuindo fortemente para a percepção de que o Congresso não decide. Logo, também se fortalece o entendimento de que o Executivo precisa mesmo se valer do uso abusivo de medidas provisórias."
Fica, assim, estabelecida a confusão: o Congresso não decide por causa do abuso nas MPs e a ausência de decisão serve de pretexto para o excesso. E, qualquer modo, o Parlamento é quem paga o pato do desgaste.
Medidas como a adotada pelo presidente da Câmara, Michel Temer, de considerar o trancamento válido apenas para o exame de projetos de leis ordinárias, "amenizam, mas não resolvem".
A solução seria revogar?
"Bem, sim, mas talvez isso não tenha bom acolhimento no Executivo. Quem sabe não podemos pensar no uso da urgência constitucional acrescido de algum outro mecanismo?", pondera naquele jeito totalmente Marco Maciel de ser.
Contracorrente
O requerimento aprovado pela Comissão de Relações Exteriores do Senado, pedindo ao chanceler Celso Amorim que o Brasil retire seu apoio à candidatura do ministro da Cultura do Egito, Farouk Hosni, para a diretoria-geral da Unesco é a face pública de uma movimentação de bastidor envolvendo gente de alta patente.
Há, no governo e na oposição, inconformismo crescente com a decisão de apoiar Hosni - alvo de repúdio internacional por suas posições antissemitas - em detrimento do cientista brasileiro Márcio Barbosa, atual diretor adjunto da Unesco.
O vice-presidente José Alencar, cujo cargo o impede de manifestar-se oficialmente, dias atrás emprestou solidariedade a Márcio Barbosa em caráter pessoal, mas de maneira enfática.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi além: ofereceu-se para conversar a respeito com Bill e Hillary Clinton, ele ex-presidente, ela atual secretária de Estado dos EUA.
Não por coincidência, a Comissão de Relações Exteriores do Senado é presidida por Eduardo Azeredo, do PSDB.