O desastre do PIB no terceiro trimestre tem impacto político imediato: vai aumentar no governo a pressão contra as políticas fiscal e monetária. Os ministros Dilma Rousseff, Paulo Bernardo e Antonio Palocci ficaram até as dez e meia da noite de terça-feira, em reunião no Planalto, discutindo formas de agilizar a execução do orçamento. Estava tudo bem, até que chegou a informação da queda do PIB maior do que a prevista. Foi a única hora em que o clima azedou.
A ministra-chefe da Casa Civil reclamou do número. Os ministros da área econômica têm atenuantes que foram apresentados na conversa: o quarto trimestre certamente terá um número positivo, o que mostra que o país não está entrando numa recessão; está, sim, num vale. Há questões metodológicas concentrando o peso do PIB agropecuário no terceiro trimestre e isso acentuou o negativo. O consumo das famílias continuou subindo. Nada disso melhorou o clima.
No Banco Central, a explicação que se dá é que a economia vinha crescendo fortemente no terceiro trimestre quando foi colhida pela tempestade política. É a crise política — e não apenas os juros — a causa da queda do PIB além do projetado. Há vários indicadores confirmando isso: o Índice de Expectativa do Consumidor, da Fecomércio do Rio, e o Índice de Confiança do Consumidor, da Fecomércio de São Paulo, mostraram queda justamente no terceiro trimestre. Em novembro, ambos melhoraram, o que pode indicar um quarto trimestre um pouco melhor.
Tudo isso junto não é tempero suficiente para fazer um molho agridoce que seja. A área do governo que criticava o excesso dos juros altos e o excesso dos cortes nos gastos agora vai aumentar o tom e a intensidade das críticas, já que está na confortável situação de poder dizer: "Eu não disse?"
O Banco Central está numa saia justa. Hoje vai divulgar a ata do Copom. Se mantiver a avaliação feita na semana passada, em que a pior previsão de queda do PIB do terceiro trimestre era de 0,5%, vai mostrar que subestimava o processo de encolhimento da economia; se ela for refeita para incluir o quadro que ficou mais claro ontem, então não terá como explicar por que reduziu só 0,5 ponto percentual da taxa Selic. Nem pode incluir na ata nada que explique a queda do PIB como resultado da crise política. Só iria piorar a reação dos que dizem, no governo, que tudo é culpa do Banco Central.
Bancos centrais em regimes de metas de inflação têm que olhar principalmente para a inflação. A meta de 2005 será atingida, mas a maestria está em fazer um ajuste fino para chegar ao objetivo ao menor custo possível em termos de produto. Ontem, a frase mais repetida no governo foi que o Banco Central errou na dose.
Os juros estão altos demais mesmo, e aqui esta coluna ficou rouca de tanto dizer isso. Por outro lado, os empresários, quando levantam a voz contra os juros altos, com a ajuda do vice-presidente José Alencar, e outros menos votados, esquecem de alguns detalhes. Primeiro, 1/3 do crédito no Brasil é TJLP. E quem toma empréstimo no BNDES paga a taxa de 9,75%. Segundo, uma parte do crédito é do setor rural, cuja taxa de juros é de pouco mais de 8%. A enorme taxa de 18,5% é paga principalmente pelo governo. Mas esse assunto não pode nem ser tratado no governo. Quando alguém fala isso, a reação é violenta por parte dos que temem estar atrás disso alguma tentativa de restringir a ação do BNDES.
Para azar da equipe econômica, o resultado do PIB aparece quando estava quase resolvido o pior momento da tensão política interna no governo por causa da política econômica. "Se éramos criticados quando o país estava crescendo, imagine agora", disse ontem um economista do governo.
Para se saber a intensidade da crítica à equipe econômica, é preciso antes entender o que é isso: recessão ou vale? É vale. Mas tem força para achatar o crescimento do ano. Na semana passada, como dissemos aqui, os economistas estavam revendo para menos de 3%. Ontem, eles iam para perto de 2,2%. O melhor cenário era de 2,5%, que só acontecerá se houver um crescimento no quarto trimestre de 2,3%.
Um dado que costuma antecipar o que vai acontecer na economia é o de venda de papel ondulado. Com esse papel, se faz embalagem. Ele só cresce, então, quando há crescimento de produtos a serem embalados. Até outubro, o acumulado no ano foi de apenas 2% de alta. Em setembro, cresceu pouco: 0,11% contra o mês anterior; em outubro caiu bastante: 1,83%. Esse dado mostra que a recuperação do quarto trimestre não será forte. Portanto, o PIB deve ficar mesmo um pouco acima de 2%.
O Brasil está ficando para trás em relação a todo mundo este ano. Para se ter uma idéia. A Zona do euro, que vivia estagnada, cresceu 0,6% no terceiro trimestre comparado ao segundo, o Japão, outro paradão, cresceu 0,4%, os Estados Unidos tiveram um número muito acima do esperado, 1,05%. Enquanto o Brasil despencou 1,2%.
Pior fica a comparação do terceiro trimestre contra o terceiro trimestre de 2004. No Brasil, o resultado foi um magérrimo 1%. No México, 3,3%; Chile, 5,3%; Coréia, 4,4%; Zona do euro, 1,6%; Alemanha, 1,4% e Estados Unidos, 3,7%.
Os números ajudam quem defende a tese de que as políticas monetária e fiscal estão erradas. O clima ficou azedo mesmo em torno da equipe econômica.