Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, dezembro 28, 2005

Editorial da Folha de S Paulo

O VERDADEIRO MURO

 
A aprovação de uma lei pela Câmara dos EUA que prevê a construção de um muro ao longo da fronteira com o México foi classificada pelo presidente mexicano, Vicente Fox, como uma "vergonha". Pelo projeto, a imigração ilegal torna-se crime (sujeitando os infratores a penas de prisão), e os empregadores terão de responder pela situação de seus funcionários estrangeiros.
A idéia de erguer barreiras entre povos desperta justificada indignação, ainda mais depois que a destruição do Muro de Berlim foi celebrada como prenúncio de uma "nova ordem" mundial. Mas os artífices desse novo ordenamento -os líderes do capitalismo global- parecem ter uma visão particular sobre as fronteiras. Elas devem ser apagadas para favorecer a livre circulação de mercadorias e capitais, de preferência em benefício das economias mais poderosas, mas realçadas para impedir o trânsito de pessoas em busca trabalho.
Trata-se menos de um impulso de segregação étnica -embora ele exista- e mais de uma tentativa de proteção econômica. Embora imigrantes sejam úteis para as economias desenvolvidas, a partir de um certo ponto tornam-se uma fonte de problemas. E não há dúvida de que as ações do terror islâmico em países ocidentais têm ajudado a recrudescer o sentimento antiimigrantes.
Estima-se que existam nos EUA 11 milhões de estrangeiros em situação irregular. Ainda que a maior parte dos clandestinos latino-americanos provenha do México, pessoas de diversas origens cruzam a fronteira entre os dois países -e o número de brasileiros é crescente.
Não há como negar o direito dos EUA de deterem esse fluxo ilegal, mesmo que para isso recorram a um muro. Como escreveu nesta Folha o filósofo esloveno Slavoj Zizek, "a única solução real é derrubar o verdadeiro muro, não o político, mas o socioeconômico: mudar a sociedade para que as pessoas não tentem mais desesperadamente escapar de seu próprio mundo".

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