O GLOBO - 07/04
A coluna de quarta-feira passada ainda estava quentinha quando chegou o primeiro e-mail me pichando. "Por que tanta má vontade com a cidade? Será que os problemas relacionados só acontecem aqui?", cobrava Sheila Soares. Quase ao mesmo tempo, entrou na caixa de e-mails a segunda crítica. "Você cobra demais, suas críticas são severas, ácidas, são críticas destrutivas e não construtivas, parece que você não gosta da cidade", analisou Rodolfo Diogo Dias.
Os comentários dos leitores foram provocados pela crônica que criticava o hábito carioca que, diante das mazelas da cidade, só se preocupar com os estragos feitos à imagem da cidade no exterior. Tenho obrigação de revelar que a grande maioria dos e-mails gerados pela coluna foram favoráveis. Veio de gente que compartilhava a mesma opinião. Mas as duas opiniões contrárias me abalaram. Má vontade com o Rio? Crítica destrutiva? Há mais de 20 anos, escrevo, pelo menos duas vezes por semana, uma crônica no jornal. Sempre acreditei que fazia uma coluna carioca, de amor ao Rio. Quase sempre, temo ser bairrista. Quase sempre, tenho medo de ser carioca demais. O que mudou? O que aconteceu que fez com que, mesmo que apenas dois leitores, o que escrevo seja interpretado como desamor à cidade?
Até agora, tinha dúvidas, mas hoje tenho certeza: o que mais fez mal ao Rio nos últimos tempos foi ter recebido a honraria de sediar as próximas Copa do Mundo e Olimpíadas. Desde que isso foi anunciado, um oba-oba cercou a cidade que, de uma hora para outra, tornou-se o lugar perfeito, a destino-desejo dos turistas do mundo inteiro, a cidade-fetiche do planeta.
Até há pouco, o Rio parecia ter um único problema: a violência. A gente acreditava que, no dia em que houvesse mais segurança por aqui, as delícias da cidade poderiam ser aproveitadas. As UPPs, criadas com o olho das autoridades nos grandes eventos que se aproximam, não resolveram a questão. Mas é evidente que trouxeram para todos os habitantes do Rio uma sensação de mais segurança. Foi aí que se descobriu ou que se percebeu que as delícias que a gente não aproveitava não eram tão evidentes. O Rio está mais seguro. Mas continua sujo, com serviços abaixo da crítica, com transportes ineficientes, com preços absurdamente caros. A gente só não se dava conta porque a violência encobria tudo.
Vou destacar só um dos muitos pontos negativos que o Rio agora deixa à mostra: o trânsito. Sou de um tempo em que engarrafamentos, congestionamentos, tráfego intenso não faziam parte das conversas cariocas. Isso era coisa de paulista. Hoje, qual é o dia em que você não se pega queixando-se ou ouvindo queixas do tráfego? Uma cidade de distâncias curtas cada vez aproveita menos essa vantagem e torna complicado o que poderia ser simples.
Continuo amando o Rio e torço para que sua imagem seja boa. Mas não vou entrar para o cordão do oba-oba que quer transformá-la, sem merecimento, na melhor cidade do mundo. Não é. Está longe de ser. E não há indícios de que esteja sendo feito algo para que ela um dia receba este título
A coluna de quarta-feira passada ainda estava quentinha quando chegou o primeiro e-mail me pichando. "Por que tanta má vontade com a cidade? Será que os problemas relacionados só acontecem aqui?", cobrava Sheila Soares. Quase ao mesmo tempo, entrou na caixa de e-mails a segunda crítica. "Você cobra demais, suas críticas são severas, ácidas, são críticas destrutivas e não construtivas, parece que você não gosta da cidade", analisou Rodolfo Diogo Dias.
Os comentários dos leitores foram provocados pela crônica que criticava o hábito carioca que, diante das mazelas da cidade, só se preocupar com os estragos feitos à imagem da cidade no exterior. Tenho obrigação de revelar que a grande maioria dos e-mails gerados pela coluna foram favoráveis. Veio de gente que compartilhava a mesma opinião. Mas as duas opiniões contrárias me abalaram. Má vontade com o Rio? Crítica destrutiva? Há mais de 20 anos, escrevo, pelo menos duas vezes por semana, uma crônica no jornal. Sempre acreditei que fazia uma coluna carioca, de amor ao Rio. Quase sempre, temo ser bairrista. Quase sempre, tenho medo de ser carioca demais. O que mudou? O que aconteceu que fez com que, mesmo que apenas dois leitores, o que escrevo seja interpretado como desamor à cidade?
Até agora, tinha dúvidas, mas hoje tenho certeza: o que mais fez mal ao Rio nos últimos tempos foi ter recebido a honraria de sediar as próximas Copa do Mundo e Olimpíadas. Desde que isso foi anunciado, um oba-oba cercou a cidade que, de uma hora para outra, tornou-se o lugar perfeito, a destino-desejo dos turistas do mundo inteiro, a cidade-fetiche do planeta.
Até há pouco, o Rio parecia ter um único problema: a violência. A gente acreditava que, no dia em que houvesse mais segurança por aqui, as delícias da cidade poderiam ser aproveitadas. As UPPs, criadas com o olho das autoridades nos grandes eventos que se aproximam, não resolveram a questão. Mas é evidente que trouxeram para todos os habitantes do Rio uma sensação de mais segurança. Foi aí que se descobriu ou que se percebeu que as delícias que a gente não aproveitava não eram tão evidentes. O Rio está mais seguro. Mas continua sujo, com serviços abaixo da crítica, com transportes ineficientes, com preços absurdamente caros. A gente só não se dava conta porque a violência encobria tudo.
Vou destacar só um dos muitos pontos negativos que o Rio agora deixa à mostra: o trânsito. Sou de um tempo em que engarrafamentos, congestionamentos, tráfego intenso não faziam parte das conversas cariocas. Isso era coisa de paulista. Hoje, qual é o dia em que você não se pega queixando-se ou ouvindo queixas do tráfego? Uma cidade de distâncias curtas cada vez aproveita menos essa vantagem e torna complicado o que poderia ser simples.
Continuo amando o Rio e torço para que sua imagem seja boa. Mas não vou entrar para o cordão do oba-oba que quer transformá-la, sem merecimento, na melhor cidade do mundo. Não é. Está longe de ser. E não há indícios de que esteja sendo feito algo para que ela um dia receba este título