O Estado de S. Paulo - 05/10/2010
O mercado pode não ter entendido ainda como vai funcionar o processo de subscrição do monumental aumento de capital da Petrobrás, mas, com certeza, está gostando do que está acontecendo.
Na última sexta-feira, por exemplo, as cotações das ações ordinárias (com direito a voto) da Petrobrás fecharam com alta de 4,7% e as preferenciais subiram 4,2%. (Veja, no gráfico, comportamento dos preços desde agosto.) O volume total das negociações com estas ações ultrapassou o R$ 1,5 bilhão. Nos quatro pregões anteriores, o giro diário não passou dos R$ 30 milhões. Também na sexta, as demais ações da Bolsa ou caíram ou ficaram se arrastando. E isso é sinal de que o investidor entendeu que precisa de duas coisas: (1) aumentar sua posição de Petrobrás em carteira até a primeira data de corte (até dia 10) para ter direito a prioridade na subscrição; e (2) fazer provisões para subscrever a sua parte.
Explica-se esse segundo ponto: se não tem dinheiro em caixa, vai ter de vender outras ações ou desfazer-se de cotas de fundos de investimento. E foi isso que o investidor começou a fazer, porque os prazos já estão correndo. Enfim, é vender Vale e Itaú para subscrever Petrobrás.
Quem está à procura de racionalidade nesse processo talvez fique um tanto decepcionado. A definição do preço dos 5 bilhões de barris de petróleo de propriedade da União, que serão transferidos em cessão onerosa à estatal a título de subscrição da parte do Tesouro, teve um pouco de teatro. Não há densidade de poços nem de conhecimento geológico nos sete reservatórios de onde esse petróleo vai ser tirado. Assim, não foi possível definir, com a consistência desejável, a qualidade e as características do produto, o volume recuperável (dentro dos padrões Petrobrás - porque variam de empresa para empresa), os investimentos necessários em infraestrutura e tanta coisa mais.
Tupi, por exemplo, foi descoberto em 2007 e, no entanto, até agora a Petrobrás não foi capaz de dizer qual é o tamanho real da reserva. Essa imensidão de incertezas deve ter sido a principal razão pela qual duas certificadoras de prestígio internacional chegaram a conclusões tão disparatadas a respeito da avaliação dos barris.
Em compensação, as próprias regras do jogo preveem ajustes ao longo do tempo, quando começar a produção que deverá acomodar eventuais assimetrias não resolvidas. Mas, se é assim, se os preços desses barris acabaram por ser definidos mais a partir de critérios políticos do que puramente técnicos, perdeu-se energia demais com contratação de certificadoras e com os trâmites decisórios.
Finalmente, por mais gigantesca que seja essa operação de subscrição da Petrobrás, o volume de recursos novos com que contará dificilmente ultrapassará os US$ 30 bilhões (ou R$ 52 bilhões, ao câmbio de ontem).
Isso sugere que, antes mesmo de iniciar a etapa de desenvolvimento do petróleo obtido em cessão onerosa (dentro de seis anos), a Petrobrás necessitará de mais aumentos de capital. E aí será preciso saber não apenas se a União voltará a recorrer a jazidas de petróleo ainda em reservatórios inexplorados para subscrever sua parte, mas também se terá condições de remunerar o acionista.
CONFIRA
É a maior
Sexta-feira, a Bloomberg tirou a dúvida. Se concretizada, a operação Petrobrás, que prevê aumento de capital de pelo menos US$ 75 bilhões, não só será o maior lançamento de ações da história; será mais de três vezes o levantamento de capital feito pelo Banco Agrícola da China, de US$ 22,1 bilhões, há três semanas.
Contra o relógio
Os prazos estão curtos. Se não houver complicações judiciais, até final de setembro o processo estará praticamente encerrado. Até lá, o investidor terá de decidir se vale a pena aceitar a oferta pública, definir de onde tirará os recursos para subscrição e completar todos os procedimentos previstos.
Pior para os pequenos
Não é um roteiro que favorece a participação das pessoas comuns ou menos conhecedoras do funcionamento de uma oferta pública de ações. E isso é bom para o Tesouro e para os grandes capitais, que saberão se movimentar melhor e decidir com mais propriedade o que fazer.
Entrevista:O Estado inteligente
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