Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 11, 2008

Merval Pereira - Rio, entre a beleza e o caos



O Globo
11/4/2008

A crescente importância das cidades no desenvolvimento dos países, e a necessidade de serem redesenhadas as relações intergovernamentais para abrir espaço para uma atuação mais próxima da sociedade civil com os governos locais e a iniciativa privada, foi o tema central da nova edição do seminário "Rio além do petróleo", realizada ontem no Centro Cultural Light. O projeto nasceu com o intuito de buscar alternativas para que o crescimento da economia fluminense, que tem sido maior que o do resto do país há mais de uma década devido principalmente ao petróleo, seja estrutural e se transforme em benefício concreto para a população, especialmente na Região Metropolitana, onde moram três de cada quatro habitantes do Estado do Rio.

Sob o guarda-chuva temático de "Governança", foram analisadas as necessidades de criação de novos mecanismos institucionais e de mudança cultural para levar o Rio à retomada do desenvolvimento sustentado. A necessidade de modernização dos instrumentos de gestão surgiu no centro dos debates, como forma de otimizar os recursos públicos, não apenas em nível local como também federal.

Assim como a agenda das reformas institucionais abrange hoje o que André Urani, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), chama de "reinvenção do futuro das grandes metrópoles", também as reformas estruturais do país precisam estar atualizadas com os novos tempos, nas relações trabalhistas e na desoneração da carga tributária das empresas, por exemplo, para permitir o aumento do emprego e dos investimentos, tanto públicos quanto privados.

Urani fez um amplo apanhado do que poderia ser feito com a interação da iniciativa privada com órgãos governamentais e a sociedade civil, e deu exemplo de como diversas partes do mundo estão encontrando as mais variadas maneiras, desde consórcios intermunicipais até agências de desenvolvimento, para impulsionar o crescimento das metrópoles.

A famosa "maldição do petróleo" foi lembrada pela subsecretária de Desenvolvimento Renata Bezerra Cavalcanti, que destacou o fato de que cidades do Rio que recebem os royalties do petróleo não aproveitam os frutos da riqueza natural para transformarem suas economias.

Em termos nacionais, a mesma maldição faz com que o preço das commodities em alta favoreça a idéia de que a prosperidade independe de reformas estruturais mais profundas, o que pode ser fatal em caso de mudança do cenário internacional, que já dá os primeiros sinais preocupantes, como a alta mundial da inflação.

O secretário de Desenvolvimento do estado, Julio Bueno, deu o tom mais político da mesa, destacando a importância de os governantes terem uma noção clara entre o estatal e o público, otimizando os recursos públicos através de uma gestão moderna e participativa, onde empresas privadas concessionárias dos serviços públicos sejam parceiras do estado para o desenvolvimento sustentado.

A visão moderna de gestão, que já está sendo adotada por diversos governos estaduais, deveria ter uma correspondência, em nível federal, com o estabelecimento de metas e objetivos quantificáveis.

A empresária Celina Carpi, do movimento "Rio Como Vamos", disse que o principal objetivo do movimento no momento é acompanhar os investimentos públicos para medir o impacto de cada um na melhoria de vida da população, e os benefícios concretos que uma obra pode trazer para os moradores da região onde se realiza.

Ela chamou a atenção para a importância do acompanhamento e da cobrança dos políticos e governantes, com a participação ativa da população nesse trabalho voluntário, que infelizmente ainda não é percebido pela maioria como fundamental para a melhoria do bem-estar.

O presidente da Light, José Luiz Alquéres, fez da equalização da informação o ponto central de seu depoimento, defendendo a tese de que quanto mais a informação for difundida, mais o cidadão conseguirá pesar causa e efeito de seus atos e dos atos dos governantes, formando um senso crítico de cidadania que ajudará o desenvolvimento da sociedade.

Seguindo uma tendência internacional de concentração de cidades em uma grande megalópole, Alquéres apresentou o projeto que denominou de "Megalópole Brasileira", que seria formada por 232 municípios dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, interligados por diferentes aspectos, equivalente a apenas 0,97% do território brasileiro, mas, no entanto, abrangendo 41,7 milhões de pessoas, quase 23% da população brasileira, e responsável por 35% do Produto Interno Bruto brasileiro.

O contraponto do debate foi feito pelo professor de história social Giuseppe Cocco, da UFRJ, que defendeu a tese de que é possível avançar na reorganização da sociedade a partir das modalidades de intervenção urbana que já estão em ação no mundo informal das comunidades carentes, queimando etapas do desenvolvimento com o acesso às novas tecnologias disponíveis, como a internet.

Ele deu o exemplo da Cruzada São Sebastião, no Leblon, que é um conjunto habitacional que se organiza como uma favela, embora não seja uma delas. Isso significaria, para o professor, que a questão central não é urbanizar as favelas, ou mesmo construir habitações populares, mas incluir esses cidadãos na sociedade, dando-lhes direitos, entendendo que existe um preconceito racial e social que os leva à marginalidade e à informalidade.

Na sua concepção, não é o excesso de burocracia nem a falta de informações que levam imensas camadas da população a atuarem na clandestinidade, mas sim a maneira como a sociedade se organiza, as excluindo.

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