Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 26, 2008

Homem de Ferro, com Robert Downey Jr.

Prova de resistência

Depois de quase uma década no fundo do poço,
Robert Downey Jr. dá uma espetacular volta
por cima em Homem de Ferro


Isabela Boscov

Fotos divulgação
Downey com sua armadura e, à direita, com Howard, Gwyneth e Bridges: aventura com agenda política

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Trailer do filme

Encarcerado numa caverna no Afeganistão, o bilionário fabricante de armamentos Tony Stark (que herdou do pai o negócio e a filosofia de que arma boa é aquela que manda seu recado já no primeiro disparo) passa por um rude despertar: foi usando produtos com o seu selo de qualidade que os terroristas islâmicos o seqüestraram, e é com eles também que massacram civis em aldeias como aquela de onde veio o médico que está preso junto com ele (o excelente ator anglo-iraniano Shaun Toub) e que o salvou da morte certa, implantando um ímã junto ao seu coração. Em Homem de Ferro (Iron Man, Estados Unidos, 2008), que estréia nesta quarta-feira no país e é adaptado do quadrinho homônimo da Marvel, Stark é pintado como uma espécie de Steve Jobs da indústria bélica – um prodígio de inteligência, e um playboy. Mas, num lance que o roteiro gentilmente pede que se aceite, ele é também um patriota, que acredita estar defendendo os americanos com suas criações. Assim, quando efetua sua fuga extraordinária, protegido pela armadura que construiu na caverna, ele já está decidido: esse será o seu adeus às armas. A única a que ele se dedicará a partir daí será essa armadura revolucionária, com a qual pode voar em velocidades supersônicas e que pretende usar para destruir aqueles seus armamentos que caíram em mãos erradas. Bom seria se tudo fosse tão simples, e se ele não estivesse assim contrariando os interesses de seu sócio (Jeff Bridges, que acerta em cheio como o vilão afável) e de um amigo militar (Terrence Howard, em participação inexpressiva).

Homem de Ferro, portanto, dobra as fichas colocadas na mesa por Homem-Aranha e Batman – O Retorno: é não só uma adaptação de quadrinhos com consciência, como tem uma agenda política dirigida ao momento. Em relação a Homem-Aranha, falta-lhe um ingrediente importante: a criatividade visual exuberante de um cineasta como Sam Raimi. O diretor Jon Favreau, que começou no cenário independente com o roteiro do divertido Swingers, mantém na interação entre os atores o seu forte; embora se esmere, suas cenas de ação param no competente, sem chegar ao surpreendente. Homem de Ferro, porém, tem algo a mais que os outros exemplares da categoria: tem Robert Downey Jr. no topo absoluto de sua forma e engajado num diálogo instigante com a platéia. "Convenhamos – isto está longe de ser o pior que você já me viu fazer", diz o protagonista, flagrado em sua vida dupla, à sua leal assistente, Pepper Potts (Gwyneth Paltrow, encantadora). Isso, claro, está longe de ser também o pior que o público já viu Downey fazer. Por quase uma década, começando com uma prisão em 1996, o ator foi pouco visto em ação, e inúmeras vezes observado em situações constrangedoras – em órbita, durante suas crises de abuso de substâncias, ou de macacão laranja e algemas, recebendo uma de suas várias sentenças. Downey não visitou apenas o xadrez de delegacias. Passou dois períodos em presídios estaduais, onde acordava de brigas com os outros detentos encharcado em seu próprio sangue. Na crônica recente, nenhuma outra celebridade bateu tão no fundo do poço quanto ele – e nenhuma deu uma volta por cima tão espetacular.

Em sua fase de pesadelo e no início de sua recuperação, há cinco anos, Downey sobreviveu graças à boa vontade de amigos. Entre eles contam-se Curtis Hanson, que o escalou para Garotos Incríveis, o produtor David Kelley, que lhe deu um papel premiado na série Ally McBeal (e depois, cansado de sua instabilidade, o demitiu), e Mel Gibson, que o pôs como o protagonista de Crimes de um Detetive. Esses votos de confiança, entretanto, não teriam bastado para devolver-lhe a carreira não fosse o fato – muito alardeado pelo próprio Downey – de que ele está limpo e sóbrio há tempo suficiente para que se banque o risco de tê-lo numa superprodução. Um mestre do humor seco e das réplicas e tréplicas, Downey faz o filme soltar faíscas nos seus melhores momentos, e obscurece suas falhas nos trechos menos felizes. Mas é essa bagagem que ele leva para dentro da história que faz a platéia se render quando ele anuncia, de forma a não deixar dúvida: "Eu sou o Homem de Ferro".

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