Quando a gente pensa que já ouviu de quase tudo em matéria de insolência, e vai querendo mudar de assunto à espera da investigação da Polícia Federal, vem o ministro da Justiça, Tarso Genro, confessa um delito de conduta e cria uma nova doutrina à qual não se pode deixar de dar atenção.
Diz respeito ao dossiê dos gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na versão palaciana, até sexta-feira o que existia era “um banco de dados” de onde foram extraídas informações sigilosas, repassadas à imprensa com o intuito de pôr o governo sob a insidiosa suspeição de tentar intimidar a oposição na CPI dos Cartões Corporativos.
Mas, a partir da entrevista do ministro Tarso Genro ao Correio Braziliense, cujos termos seriam por ele confirmados na tarde do mesmo dia, ficamos sabendo que houve mesmo a coleta de informações escolhidas sobre o governo anterior e que o ministro da Justiça acha isso muito natural.
“Todo governo tem o direito de coletar dados e compará-los com os de governos anteriores para mostrar a lisura de seu comportamento.” Foi além: segundo ele, o direito de fazer dossiês é irrestrito, todo mundo pode fazer, governo, oposição e imprensa.
Na argumentação do ministro, “não existe no Código Penal brasileiro um crime chamado dossiê”. E, sendo assim, transgrediu quem deu publicidade e não quem produziu a peça a partir de agora liberada para ser denominada dossiê sem a companhia do adjetivo “suposto”.
A respeito do Código Penal certamente Tarso Genro sabe o que diz. Na parte relativa a dossiê como figura criminosa em si, bem entendido, porque não deve ter examinado detidamente o trecho da tipificação de chantagem mediante o uso de informações para constrangimento de outrem.
Na elaboração de sua tese, o ministro da Justiça tampouco levou em conta o princípio da impessoalidade e da probidade consagrado na Constituição como pressuposto ao exercício da função pública.
Os dados sobre os quais o ministro Tarso Genro acredita que o governo tenha plenos direitos para manejar como bem lhe aprouver não pertencem a ele, ao presidente, ao PT, nem a ninguém em particular. São patrimônio do Estado e, portanto, da sociedade.
Os ocupantes temporários do poder só podem fazer com o bem público o que a lei permite. E esta não autoriza a manipulação de informações confiadas à guarda do governo da ocasião.
Mas não houve essa manipulação, defendia-se o governo. Como, não? Vamos repetir o que disse o ministro da Justiça: “Todo governo tem o direito de coletar dados e compará-los com os de governos anteriores para mostrar a lisura de seu comportamento”.
Ou seja, Tarso Genro admite que o intuito da “coleta” era “mostrar” uma comparação entre os gastos de Fernando Henrique e as despesas do presidente Luiz Inácio da Silva.
De fato, “amostras” vinham sendo divulgadas aqui e ali em notas de jornais, em conversas particulares e até em manifestações públicas de ministros e líderes governistas no Parlamento.
Não houve, como quis fazer parecer Tarso Genro, uma comparação transparente e impessoal entre as contas dos dois governos.
Primeiro, porque sendo sigilosos, os dados não poderiam ser exibidos nesse modelo. E segundo, porque só poderia haver comparação se as informações relativas aos gastos da atual Presidência também estivessem relacionadas na planilha feita nos computadores da Casa Civil.
Só é possível comparar uma coisa à outra e o dossiê em questão relaciona FH, Ruth Cardoso e ministros, mas não lista Lula, Marisa Letícia e companhia.
Trata-se, portanto, de um inédito e criativo ato de comparação unilateral.
Ao admitir que a idéia era cotejar dados para mostrar a “lisura” do atual governo, Tarso Genro confessa a existência de um plano para desarmar os argumentos da oposição na CPI. Mas diz que a intenção era comprovar equanimidade nos provimentos.
Não convence, porque houve ameaças anteriores e zero isonomia de procedimentos. Boa-fé seria abrir os gastos da Presidência, ressalvados os justificadamente sigilosos, no lugar de recorrer ao subterfúgio da compilação de despesas escolhidas do governo anterior só para constranger.
Se dissesse “eis aqui alguns exemplos de despesas feitas com cartões corporativos e contas tipo B” até 2002 e de 2003 em diante, o governo teria jogado limpo.
Mas, não, preferiu tentar a desmoralização, a insinuação, recorrer ao velho truque de socializar os prejuízos e faturar sozinho os benefícios: divulgam-se os gastos de FH com “uiscão” no Alvorada e invoca-se a segurança nacional ao esconder as despesas de Lula com picanha na Granja do Torto.
Não admira que o governo tenha se enrolado. Ao ponto de o ministro da Justiça defender o uso político de informações sob a guarda do Estado só para conferir um habeas-corpus preventivo ao autor, ou autores, do dossiê.
Entrevista:O Estado inteligente
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domingo, abril 13, 2008
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