Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, abril 16, 2008

Merval Pereira - "É a economia, estúpido"




O Globo
16/4/2008

Nunca esteve mais atual a frase "É a economia, estúpido", criada pelo marqueteiro americano James Carville para justificar a vitória de Bill Clinton, em 1992, sobre o então presidente George Bush. Agora, diante da crise financeira dos Estados Unidos que espalhou suas conseqüências pelo mundo, dois países dos mais importantes da Europa, com problemas econômicos agudos, buscam em governos diametralmente opostos soluções que às vezes são surpreendentemente semelhantes. O do socialista José Luis Zapatero, na Espanha, e o do direitista Silvio Berlusconi, na Itália, enfrentarão as conseqüências da crise econômica internacional com algumas receitas semelhantes.

Os dois conseguiram o controle do Parlamento através de acordos com pequenos partidos regionais. O socialista José Luis Rodríguez Zapatero foi reeleito com maioria simples no Congresso, sendo o primeiro chefe de Executivo que não conseguiu a maioria absoluta na Câmara dos Deputados, tendo recebido 169 votos a favor, apenas do PSOE, seu partido, e 158 contrários, sendo 154 do PP, o principal partido de oposição, e mais quatro da esquerda (três representantes do ERC, a esquerda radical catalã, e Rosa Díez, dissidente ex-socialista).

A direita catalã do Convergência e União (CiU) e os membros do Partido Nacionalista Basco se abstiveram, num total de 23 votos. Zapatero, no entanto, em vez de ter que fazer acordo com a esquerda radical como há quatro anos, fez acordos com pequenos partidos regionais.

Já Berlusconi obteve a maioria absoluta nas urnas, com o apoio decisivo da Liga Norte, de extrema-direita, que teve votação duplicada, ocupando agora quase 10% da Câmara e do Senado.

A crise econômica está provocando as mesmas reações nos dois países, sendo a mais imediata o endurecimento com os imigrantes, pela falta de emprego.

Na Itália de Berlusconi, com a forte pressão dos extremistas de direita, os imigrantes serão fortemente reprimidos. Na Espanha do socialista Zapatero, um novo ministério foi criado, juntando Trabalho e Imigração, demonstrando não apenas a ligação entre as duas questões como a preocupação com uma política de imigração mais severa.

As críticas feitas durante a campanha pelo candidato do PP Mariano Rajoy encontraram eco no eleitorado, diante da constatação de que o desemprego só tende a aumentar, sendo a previsão oficial chegar a cerca de 2,5 milhões de desempregados nos próximos dois anos.

Uma das críticas à política anterior era a de que o governo "dava papel a qualquer um", isto é, legalizava qualquer imigrante, e somente para programas de integração dos imigrantes foram distribuídos mais de 300 milhões de euros.

O novo ministro, Celestino Corbacho, é um técnico menos político e mais pragmático, que trata a questão da imigração com uma visão rigorosa de proteção dos empregos para os espanhóis.

Um dos principais pontos da política econômica do novo governo é estimular o regresso de imigrantes a seus países.

As políticas sociais, que anteriormente faziam parte do Ministério do Trabalho, agora estão no Ministério de Educação e Esportes, dando uma pista de como a questão será tratada neste segundo governo.

Os dois governos têm programas para injetar dinheiro para acelerar a recuperação da economia, e, embora se diferenciem no essencial, há um ponto em comum: os dois prometem cortar impostos.

Silvio Berlusconi, cuja máxima é "o problema é o Estado", já anunciou que fará uma política "à la Ronald Reagan", com redução dos encargos do Estado - que, segundo martelou durante a campanha, ao cobrar mais impostos, estimula e justifica a evasão fiscal.

Se juntarmos a essa afirmação à campanha da Liga Norte a favor da evasão fiscal para não favorecer o Sul pobre, teremos no novo governo da Itália uma mudança drástica com relação aos impostos, tanto das pessoas físicas quanto das empresas.

Os dois governos anunciaram planos econômicos de bilhões de euros para aquecer as economias debilitadas de seus países. O presidente do governo espanhol tem um programa de 10 bilhões de euros, metade do superávit fiscal do ano passado, com redução de impostos, aumento da liquidez e facilidade de financiamento para empresas e construção de casas.

Desse total, a metade será para devolver a cada contribuinte uma média de 400 euros de impostos pagos, uma promessa de campanha inusitada para um partido de esquerda, mais acostumado a aumentar impostos. Mas a crise econômica está levando a soluções semelhantes dois governos distantes ideologicamente.

Também Berlusconi promete um orçamento de bilhões de euros para estimular a economia, com uma "revolução" de reformas econômicas, desde a desoneração da folha de pagamento das empresas até uma mudança no sistema previdenciário, que está falido.

Berlusconi promete administrar o Estado italiano como "uma empresa privada", mas adverte que os primeiros anos serão duros.

Na Espanha, a previsão é que a crise seja superada nos próximos dois anos, e o relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgado esta semana, com a previsão otimista de que, das grandes economias, a espanhola será a que se recuperará mais rapidamente, é usado para justificar medidas duras que venham a ser tomadas.

A previsão para o crescimento do PIB este ano é de apenas 1,8%, mas o FMI acredita que já em 2010 o PIB da Espanha esteja crescendo a um ritmo de 3% ao ano.

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