Ai, Deus nosso, em que podemos pensar? Imagino que devamos ser compreensivos e caridosos com o prefeito. Compreensivos porque há os que dizem que ele é maluco, embora eu não tenha condições de comprovar e muito menos endossar o diagnóstico. E caridosos porque certamente tem problemas um prefeito que passa o tempo todo diante do computador e, contra todas as evidências de uma epidemia com mais de mil notificações por dia até agora, nega airadamente sua existência. E, quanto a ele não aparecer na rua, pode haver explicações bastante singelas e de certa forma aceitáveis. Ele não sai porque o mosquito não gosta de ar-condicionado e ele não quer pegar dengue, é claro, tinha graça ele pegar dengue num ano eleitoral - nem tudo é como a gente pensa, a posição dele requer manobras muito sutis.
Além disso, não estamos utilizando a famosa criatividade nacional, talvez porque se desenrolem no momento as complicadas manigâncias envolvendo d. Dilma, imperdoável ex-pedetista rejeitada pelo partido, que - isto digo eu, podem anotar na conta de besteira, só que não é besteira -, se pensa que é candidata de Lula à sucessão, está muito enganada (isto, repito, digo eu), porque está na cara (ele talvez pense que tudo não está estampado na cara dele; para quem já viveu uns 50 anos, está tudo escritinho lá) que o candidato à sucessão de Lula é ele mesmo. Não assim direto, na grossura, mas com categoria, como, aliás, já andei prevendo aqui. E como mais ou menos sugeriu o vice-presidente (que de fato tem razão ao dizer que não merece o ''de'' que às vezes lhe metem no nome), entrando quiçá para a História como o primeiro vice-presidente legítimo a sugerir um golpezinho. A tentativa de queimar d. Dilma com o tal dossiê veio lá de dentro. Quem quiser que se engane, ela está tomando cafezinho com o inimigo. Mas, cala-te, boca, há caroço demais nesse angu para tratar dele com brevidade excessiva. Podem deixar que esse terceiro mandato só não rola se não der mesmo, e pode perfeitamente dar, está ficando muito bem armadinho, sob certos aspectos.
Voltando à dengue, é difícil resistir - e nem tento - a soltar um bocadinho a imaginação, à luz de nossa experiência como brasileiros. Claro que, se as condições no Rio não melhorarem muito e rapidamente, a epidemia vai intensificar-se. Como a doença não tem vacina, não se pode imunizar quem viaja. Além disso, há um período de incubação, durante o qual os sintomas não se manifestam. O camarada pode viajar aparentemente sadio e assim permanecer dias, até a doença se declarar. Se isso acontecer com um número significativo de viajantes (para não falar em quem viajará com dengue ou não, para ver mamãe, ou nos mosquitos turistas dos quais há vastos contingentes que gostam muito de um avião) e houver uns aedes dando sopa nos destinos deles, a coisa pode ficar feia no País todo, até porque não é somente o Rio que tem um número incontável de focos de mosquito. A miséria e a indiferença com o próximo vivem em todas as cidades brasileiras.
Dirão vocês: então o negócio é fumigar aviões, ônibus, paus-de-arara, tudo. Talvez, mas não há a mínima condição técnica, a não ser aqui e ali. E ia ficar chato ver os cariocas descendo na Ponte Aérea para serem imediatamente engolfados por nuvens de fumacê, o temível Bafão Nove de Julho. Sairia barato, porque o número de voluntários ia exceder o de vagas. Claro que haveria retaliação, com os cariocas recebendo entusiasticamente os paulistas a mangueiradas de uma mistura horrenda, o Chopes Quentes Japonês. O clima se alastraria por todo o País e terminaria em guerra civil, a tremenda Guerra do Borrifo, na Bahia complementada por borrascas de farofa de dendê e pipoca.
Mas aí é que está o aspecto positivo para vencer logo a epidemia, porque bastaria muito pouco para o Nosso Guia resolver tudo com praticamente um só gesto. Podia ser na hora em que Bush lhe estivesse telefonando para cumprimentar o excelente método de controle demográfico posto em prática pelo Brasil, até porque morriam principalmente pobres, assim também aliviando as despesas que eles vivem dando.
Nada disso. Nosso Guia, aproveitando sua conhecida ascendência sobre o presidente americano, lhe daria outro esbregue. ''Olhe aqui, ô panaca, ou você manda logo resolver esse pepino aqui, ou é guerra. Nós já temos dengue de destruição em massa e lhe dou uma semana pra quebrar este galho aqui.''
- Sim, senhor - responderia Bush, já pegando outro telefone para mandar um vasto contingente militar americano vir aqui, vencer a dengue. Talvez depois resolvesse permanecer por um tempo indeterminado, mas isso já é outro problema, uma coisa de cada vez.