Pelo menos no tocante à candidatura presidencial adiante, é sincero. Por enquanto, Lula é candidato agora mesmo, em 2008.
O que à primeira vista parecia ser uma imprudente antecipação do debate sucessório com mais de dois anos de antecedência, vai assumindo a feição de uma estratégia de Lula para usar a eleição municipal como instância intermediária para se submeter ao julgamento do eleitorado. Saindo-se bem, pode apresentar ao País uma prova de força política mais consistente que os índices de popularidade nas pesquisas de opinião.
E para quê ele precisa disso? Por mera vaidade não é. Para sair dando pontos sem nó, tampouco.
Uma vitória espetacular depois de uma campanha em que ele figure como o protagonista absoluto da cena engordaria substancialmente o capital político do presidente, criando no ambiente terreno fértil para fazer prosperar a idéia do plebiscito com vistas ao terceiro mandato.
Não por acaso, o presidente Lula se empenha em nacionalizar o pleito municipal tanto na abordagem dos temas quanto no esforço para reproduzir regionalmente a aliança partidária que lhe dá sustentação no âmbito federal.
Não é por outro motivo que chama a oposição para a briga num tom veemente e se conduz como se jogasse uma batalha de vida ou morte em cada um dos palanques que tem percorrido, seja nas capitais ou em longínquos municípios.
Os presidentes, em geral, fazem o contrário: procuram se distanciar das disputas locais, não se envolvem diretamente nas querelas e têm uma conduta mais discreta. Lula, aliás, comportou-se assim na eleição municipal de 2004.
Cumpria sua agenda normalmente e, de vez em quando, dava uma força para seus candidatos prediletos. Mas nada como agora, quando praticamente transferiu-se do palácio aos palanques, numa evidente tentativa de construir uma vitória arrasadora em outubro.
Se conseguir, seus aliados estarão aptos a comparar o resultado da eleição a um plebiscito tácito e deflagrar um movimento em prol da consulta popular de fato.
Restaria a dificuldade de justificar a mudança das regras no meio do jogo. Mas, na realidade, pode ser a parte mais fácil. O PT já se notabilizou por absolver deformações do passado como salvaguarda a desvios do presente.
Como o Brasil é pródigo em alterações de mandatos presidenciais, o "todo mundo faz" está garantido. A estabilidade nas normas é exceção. Desconsideremos a República Velha, os presidentes anteriores ao regime militar, tantos são os exemplos de maleabilidade de mandatos.
Fiquemos no período da redemocratização para cá: José Sarney tinha seis anos, quase fica com quatro e terminou levando cinco; Fernando Collor governou só dois e Fernando Henrique Cardoso assumiu com direito a quatro e os transformou em oito.
E o PT ainda poderá alegar a quem reclamar que cobrar respeito à Constituição na vez de Lula é preconceito.
Valentia seletiva
A oposição mostra as garras para a ministra Dilma Rousseff porque não tem coragem de mostrá-las ao presidente Lula.
O dossiê sobre os gastos da Presidência da República anterior era uma arma de defesa para evitar investigações sobre os gastos da Presidência da República atual.
Visava, portanto, a proteger o sigilo das despesas do presidente Lula. Nem por sonho Dilma lhe criaria constrangimentos, pois é confiável ao ponto de ser escolhida para cumprir o papel de candidata "fake" à Presidência em 2010, enquanto Lula prepara o campo para escolher o melhor plano.
Dilma, no caso, é o elo mais fraco. Não tem vida política própria, diferente de José Dirceu. Concentrar nela os ataques é apenas uma maneira que a oposição encontrou de brigar com o governo sem bater de frente com Lula.
Atacá-la não rende prejuízo nem representa risco. Já com Lula, falam fino porque o feitiço não tem sido benevolente aos feiticeiros.
No figurino
É o que se diz em Brasília: o presidente Lula está tão afiado na montagem do cenário de 2010 que escolheu para o papel de "poste" uma especialista no setor elétrico.
Obsessão
O presidente do Senado, Garibaldi Alves, não acredita que o vice-presidente José Alencar tenha defendido o terceiro mandato a título de "senha" para o início de qualquer movimento politicamente mais alentado.
Na opinião de Garibaldi, foi fruto de paixão. Segundo ele, o vice-presidente está absolutamente convencido de que Lula é a salvação do Brasil, quiçá do mundo. "Se José Alencar fosse jovem e mulher, eu diria para dona Marisa se cuidar", brinca.