Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, abril 02, 2008

Mosquito globalizado


EDITORIAL
O Globo
2/4/2008

O Aedes aegypti não atazana apenas os brasileiros - particularmente fluminenses e cariocas apanhados numa epidemia de dengue pela combinação das picadas do mosquito com a falta de zelo das autoridades sanitárias. Endêmica, a doença mantém sob risco 2,5 bilhões de pessoas em todo o mundo, ou cerca de 40% da população total. Estima-se que, dessas, cem milhões são infectadas por ano em diversas partes do planeta.

Trata-se, portanto, de uma doença globalizada, e potencializada por agravantes igualmente universalizados, como as desigualdades sociais, que em todo o mundo deixam bilhões de pessoas à margem de benefícios como o saneamento básico e a urbanização, linimentos essenciais contra o mosquito.

Adicionem-se a isso as facilidades de locomoção decorrentes do desenvolvimento dos meios de transporte, e mesmo da extinção de embargos ao livre trânsito entre nações. Na prática, não há mais fronteiras contra surtos. Só para citar um microcosmo dessas incontáveis levas de migração, calcula-se que 35 mil pessoas viajam por mês entre Manaus e a Venezuela, duas regiões potencialmente incubadoras das larvas do Aedes aegypti.

São dados que ajudam a entender as razões de uma doença erradicada nos anos 50 ter voltado a fazer vítimas aqui no país. Mas, no caso do Brasil, há outros elementos a contaminar o simplismo dessa visão determinista. Ao desenvolvimento natural de larvas, aliam-se estimulantes conjunturais como degradação urbana, ocupação desordenada das cidades e precariedade do sistema de saneamento básico.

No Rio, em cujo colo está espetada a maior fatura da conta cobrada pelo Aedes aegypti, esses agravantes chegam ao paroxismo da irresponsabilidade. Como exemplo, cite-se o aumento descontrolado de favelas, sem contrapartidas do poder público para evitar tal proliferação ou ao menos para minimizar os efeitos da degradação decorrente de ocupações ilegais.

Junte-se a isso o descaso do Estado com a prevenção efetiva da doença e a inação irresponsável diante da existência de áreas apropriadas à procriação do inseto; eis a receita para nutrir mosquitos, em vez de eliminá-los.

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