Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 05, 2008

MILLÔR

Pré - e - pós maravilhas

Todo mundo conhece minha posição. Que é como escrevem todos os intelequituais, certos de que o mundo só pensa neles. Haja umbigo!

Qual é a minha posição? Deixa ver se me lembro.

Ah, não acredito em ideologias. No máximo dão arrumação ao já acontecido, à "revolução". Antes que esta dê dois passos atrás dos três que deu à frente (se não ao contrário).

Por instinto sempre funcionei pelo mote de meus ancestrais espanhóis: "Hay gobierno, soy contra". Mas não fiquei nisso. Hoje, se no hay gobierno, também soy contra. Entenda-se como gobierno qualquer espécie de mando, começando e terminando pelo intelectual.

Pois sempre acreditei que o mundo vive a reboque da tecnologia. Quando o cara inventou o fogo, mudou o paleolítico (ou foi o neolítico? Vê aí.), dando origem ao MSF, movimento dos sem fogo.

Acredito mesmo estarmos vivendo no melhor momento da humanidade. A educação melhorou, a saúde melhorou, a indumentária melhorou (vestiam demais, aqueles efeminados franceses dos séculos XVIIl e XIX!), a ciência, medicina com parte ponderável, elevou a expectativa de vida – que era de 41 anos no princípio do século XX – para os 85 anos atuais em seu ponto máximo, japonês. Meus dados são da Enciclopédia Britânica, que o Google me desculpe.

Mas, porque a comunicação deu um salto inacreditável, você vê tudo, a toda hora, e acha que a maldade humana está maior do que nunca – "Nunca houve tanta violência!". Garanto que não.

É verdade que a toda hora vemos o ser humano rico bombardeando o ser humano pobre (States X Iraque), o ser humano refinado arrasando o ser humano grosso (Israel X Palestinos), o ser humano incrédulo tascando o ser humano crédulo (China X Tibete), et cetera. Mas não nos mostram o ser humano-humano, genial (mais ou menos seis milhões de pessoas, não é pouca porcaria), responsável pela comunicação universal, a que comunica de perto até o mais íntimo, e também de longe, materializando o ideal da terra plana (que, em política, se chama nações sem fronteira).

Estou falando de quê? Evidente, do celular.

Mas fique claro: se me maravilho ante o presente, babo com o passado.

Antes de o Celular universalizar o mundo, Edson (o da lâmpada indecente) já fazia experiências, mais radicais, para captar a voz dos mortos. E Arthur Clark apostava que o pontão que os artesãos gregos usavam pra orientar a fabricação de ânforas funcionava como um gravador primitivo. Existe a possibilidade de ainda ouvirmos Platão discutindo com Sócrates e ensinando sacanagens a seus menininhos. Sintetizando: acho a arqueologia a ciência mais moderna de todas.

Defendendo o passado-vivo no presente, já publiquei aqui uma análise do precursor do Computador, o Livro, que muitos julgam extinto:

L.I.V.R.O. Local de Informações Variadas, Reutilizáveis e Ordenadas. É um insuperável conceito de tecnologia de informação.

L.I.V.R.O. não tem fios nem baterias. Não é conectado a nada e facílimo de usar – qualquer criança pode operá-lo. Basta abri-lo.

É formado por seqüência de páginas numeradas, com milhares ou milhões de informações. As páginas são unidas por sistema de lombadas, que as mantém automaticamente em seqüência correta. Dados inseridos nas duas faces da folha duplicam a quantidade de dados e reduzem custos. Um simples movimento de dedo permite o acesso instantâneo à próxima página. Nunca apresenta "erro geral de digitação" nem precisa ser "reinicializado". E a informação fica exatamente no local em que você a deixou mesmo com o L.I.V.R.O. fechado. A compatibilidade dos marcadores de página é total, permitindo que funcionem em qualquer modelo sem necessidade de configuração.

Inseparável do L.I.V.R.O. está o mais simples e prático computador que conheço – o L.A.P.I.S. Numa ponta o Processador de Texto. Enquanto o computador muderno nos permite escolher apenas entre 234 fontes, o L.A.P.I.S. oferece fontes infinitas, pois cada pessoa tem uma fonte, chamada "caligrafia", pessoal. E pra tornar a letra negrita basta a pessoa aumentar a pressão. Tudo muito sensual. Sensualidade inteiramente ausente do Computador atual.

No outro extremo do L.A.P.I.S. você tem o Deletador, chamado borracha, com o qual apaga facilmente qualquer erro cometido.

Em tempo e importantíssimo: tanto o L.I.V.R.O. quanto o L.A.P.I.S. não enguiçam!

P.S. O Lápis que ilustra esta página foi desenhado por um L.A.P.I.S. (instrumento pré-computador).

Se vocês querem gracinhas feitas com o Processador e o Deletador do lápis, podem consultar também o talento de Ross Bollinger, em www.pencilmation.com.

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