Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, abril 08, 2008

Dora Kramer De casuísmo em casuísmo

Há dois anos, durante a campanha da reeleição do presidente Luiz Inácio da Silva, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso alertou o PSDB para que parasse de defender o fim da reeleição e a mudança do mandato presidencial de quatro para cinco anos.

Ele achava melhor o partido evitar o vexame de passar recibo à acusação de que a criação do instituto da reeleição em 1997 fora um casuísmo sem retoques.

Mas, FH achava mais. Acreditava que o debate sobre mudanças institucionais poderia ensejar a chance esperada pelo PT para propor o terceiro mandato de Lula.

Era novembro de 2006 e o ex-presidente dizia o seguinte: da mesma forma que o Plano Real demarcou um "ponto zero" na economia, transferindo as regras do real aos negócios regulamentados em cruzeiro, a alteração das condições da eleição de 2010 daria ao PT o argumento de que, zerado o jogo, todos poderiam concorrer em condições de igualdade, inclusive Lula.

Os tucanos - os governadores José Serra e Aécio Neves à frente - não deram atenção ao alerta e foram em frente abrindo no ano passado negociações explícitas com interlocutores do PT (um deles, o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel) para aprovar o fim da reeleição e os cinco anos de mandato logo após o pleito de 2008.

No afã de levar adiante a proposta, Aécio e Pimentel chegaram a aventar a hipótese de prorrogar em um ano o atual mandato de Lula a fim de facilitar a aprovação da emenda.

Não havia, nesses entendimentos, a idéia de abrir espaço para um terceiro mandato completo. Isso poderia figurar nas articulações como "bode" a ser posto na mesa e mais à frente retirado "em troca" dos cinco anos com prorrogação.

O governador José Serra também chegou a conversar com Pimentel a respeito no Palácio dos Bandeirantes, mas nega que tenha sequer cogitado de prorrogação. "Cinco anos sem reeleição valeria para o sucessor", afirmava.

Os negociadores contra-argumentavam: sem algum benefício para Lula, a proposta não passaria. Ou seja, se os tucanos quisessem reduzir de oito para cinco anos o período de espera para a alternância de seus candidatos, teriam de aceitar o adiamento da eleição para 2011.

À época houve, claro, desmentidos. Mas o tempo passou, as coisas se precipitaram para antes da eleição municipal e agora os temores de Fernando Henrique Cardoso começam a se confirmar.

A emenda que o deputado Devanir Ribeiro, do PT, promete apresentar amanhã acaba com a reeleição, estabelece cinco anos de mandato e permite que Lula concorra. Sob qual alegação?

Exatamente: a de que a implantação da nova regra zera o jogo e dá a Lula o direito de disputar.

A idéia original de Devanir era tosca: mudar a lei para conferir a Lula a prerrogativa de convocar um plebiscito e a partir do resultado exercer pressão sobre o Congresso.

A turma de elaboração mental mais refinada entrou em campo, fez ver ao deputado que dessa maneira o presidente seria apontado como aprendiz de Hugo Chávez e o convenceu a optar pela emenda do fim da reeleição.

Aproveitando, inclusive, o fato de a bandeira ter sido levantada pela oposição, que, agora, não teria argumento coerente para mudar o discurso.

Seria realmente uma sinuca, caso os políticos no Brasil não alimentassem especial desapreço pela estabilidade institucional. Assim, com a mesma veemência que defendiam uma tese ontem, passam a defender sua antítese para escapar das armadilhas surgidas no caminho.

O governador Aécio Neves mesmo, antes arauto do fim da reeleição, agora diz que não é o momento para discutir o assunto. "O debate ficaria contaminado pelo ambiente eleitoral", alega.

Contaminação esta desde sempre previsível. O dado novo - a possibilidade de entrada em cena de Lula como candidato em 2010 - é que parece provocar mudanças de opinião e muito provavelmente nos permitirá assistir muito em breve a uma sensível alteração de humores nas relações de adversários até agora muito cordiais.

Itararé

Surpreendente não foi o desempenho da ministra Dilma Roussef na entrevista de sexta-feira para falar sobre o caso do dossiê. Ela apresentou-se no figurino de sempre: confusa, enfadonha, artificialmente enfática e ríspida no limite da falta de educação.

Surpreendentes foram as avaliações críticas sobre sua performance como se só ali, naquela entrevista, a ministra tivesse dado a conhecer sua incompatibilidade com a atividade política.

A entrevista não serviu para esclarecer nada a respeito do dossiê, mas teve a utilidade de evidenciar o truque da candidatura que foi sem nunca ter sido.

A menos que o presidente Lula planejasse esconder Dilma durante a campanha e, nos debates, aparecer em seu lugar alegando ser ele o melhor defensor de seu governo.

Como tudo tem sido possível, não convém duvidar de nenhuma possibilidade.

Arquivo do blog