Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 12, 2008

Copom deve subir juros

Terapia de prevenção

O Banco Central se prepara para "tirar o barril
de chope da festa" para conter a inflação


Giuliano Guandalini e Julia Duailibi

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Perguntas e respostas: Taxa de juros

Os bancos centrais são atores coadjuvantes, mas primordiais, de uma economia moderna. Sem um sistema financeiro sólido e saudável, as empresas não dispõem de capital para investir e crescer, nem as pessoas conseguem poupar ou obter crédito. Acima de todas as suas missões, no entanto, um BC deve zelar pelo poder de compra da moeda. Para cumprir tal tarefa, muitas vezes toma medidas impopulares. Quem melhor definiu as agruras dessa incumbência foi William McChesney Martin, que comandou o Federal Reserve (banco central americano) de 1951 a 1970: "O papel de um banco central é retirar a jarra de ponche quando a festa começa a ficar animada". Os economistas brasileiros tropicalizaram essa máxima e dizem que, por aqui, o BC precisa retirar o barril de chope sempre que a animação ameaça fugir do controle – vale dizer, sempre que a economia cresce num ritmo excessivamente acelerado, pressionando uma alta nos preços. Como ele faz isso? Aumentando a taxa de juros, medida que encarece empréstimos e resfria o consumo.

Devido ao repique inflacionário dos últimos meses, tudo indica que chegou a hora de o BC brasileiro ser novamente o chato da festa. O banco deverá elevar a taxa básica de juros da economia – a Selic – na reunião de seu Comitê de Política Monetária (Copom) que ocorrerá nas próximas terça e quarta (15 e 16). A maioria dos analistas estima que os juros vão subir de 11,25% para 11,5% ao ano, na primeira alta desde 2005. Trata-se somente de uma terapia preventiva destinada a evitar uma espiral inflacionária. Com a medida, o banco pretende adequar o ritmo de crescimento à capacidade de produção da economia. Mas esse simples fato – pacífico em qualquer lugar do mundo – não conteve a ira dos loquazes críticos do Banco Central brasileiro. Alguns deles são bem-intencionados. Outros, guiados por interesses de setores que ganham com a inflação. Todos sustentam que a inflação ainda não saiu de controle e que seria melhor aguardar mais um pouco antes de agir. Para eles, seria um erro conter esse momento virtuoso da economia brasileira com juros mais altos.

Edu Andrade/Ag. Free Lancer
Henrique Meirelles, presidente do BC: leniência com a inflação custa mais do que combatê-la

Na semana passada, o presidente do BC, Henrique Meirelles, dirigiu-se assim a alguns desses focos de pressão: "É muito interessante quando eu vejo algumas entidades, muito poderosas e influentes, cujo diagnóstico é sempre na mesma direção: o dólar está barato, os juros estão altos e a atividade tem uma tendência para baixo". Meirelles não direcionou a crítica a nenhuma entidade específica. Mas Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), sentiu-se atingido: "A sociedade brasileira quer juros baixos para manter o crescimento econômico que beneficia a todos", declarou, numa "resposta" a Meirelles. Skaf foi além: disse que o BC conduz uma política monetária desastrosa porque tenta conter, com juros, uma inflação que não tem suas raízes dentro do Brasil, mas fora: "Ou será que o Banco Central do Brasil vai querer controlar a inflação do planeta? Nesse caso, ele deveria mudar de nome, para Banco Central da Terra", disse Skaf, referindo-se à alta mundial do petróleo e dos alimentos.

Em economia, parece haver argumentos para alimentar qualquer opinião. Mas, se a história servir de lição, Meirelles age corretamente. O tempo comprovou, por exemplo, o êxito dos governos que foram austeros para conter o impacto, sobre os preços internos, da crise internacional do petróleo da década de 70. Ficou também demonstrado o custo extraordinário dos países que resistiram a agir por entender que não se combate uma inflação externa com juros internos. Diante dessa experiência (que não é a única, vale dizer), recomendam-se pragmatismo e menos barulho em questões de política monetária. Pela lei mais básica da economia, os preços sobem sempre que a demanda supera a oferta. É o que vem ocorrendo no país. Até o início do ano, havia a expectativa de que a alta fosse transitória e motivada por fatores isolados, sobretudo a alta no preço dos alimentos. Não foi o que ocorreu. Os preços sobem também em outros setores da economia. O reajuste de preços no atacado tem sido forte, em torno de 10%, e cedo ou tarde esses aumentos serão repassados para os consumidores.

Mas por que há países que conseguem progredir numa velocidade muito maior do que a brasileira, expandindo o PIB em 8% ou até 10% ao ano, sem que sofram com o aumento de preços? Nessas economias, o volume de investimentos em infra-estrutura e fábricas novas é bem superior ao brasileiro. A China, que cresce 10% ao ano, investe o equivalente a 40% de seu PIB. No Brasil, essa taxa de investimentos não supera 18% do PIB. Assim, o chamado crescimento potencial do país (aquele que pode ocorrer sem que haja pressão inflacionária) seria da ordem de 4,5%. Sempre que o avanço supera esse número, surgem pressões por reajustes de preços. Cálculos do economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, indicam que, para o país avançar 6% de maneira sustentável e sem inflação, a taxa de investimentos teria de ser de ao menos 22% do PIB. Em vez de dirigir ataques ao Banco Central, os críticos de Meirelles poderiam pedir ao governo que cortasse seus gastos. Seria possível elevar a taxa de investimentos reduzindo a elefantíase estatal e redirecionando o gasto público para os investimentos. Mas o governo tem seguido no sentido contrário. Nos últimos doze meses, os gastos da máquina federal tiveram alta acima da inflação de 10%.

A boa notícia é que Meirelles parece contar com o aval do presidente Lula. Referindo-se às pressões sofridas pelo presidente do BC, Lula declarou na sexta-feira passada: "Os juros vão aumentar quando for necessário aumentar e cair quando for necessário cair. Eu tenho dito ao ministro (presidente do BC) Henrique Meirelles e ao ministro (da Fazenda) Guido Mantega que a tensão não volte cada vez que o Copom for se reunir". O presidente Lula está repleto de razão.

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