Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 11, 2008

Comida, inflação, civilização

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Há uma perspectiva nada animadora para a economia mundial, que ocupa hoje as páginas dos jornais — e não só do Brasil. Ela que combina, por motivos diversos, um crescimento menor da economia mundial, em razão da crise americana, com inflação mais alta em razão, vejam só, da oferta de alimentos menor do que a procura explosiva. Em menos de um ano, os preços subiram em torno de 40%. O do trigo dobrou.

Razão básica pra isso? Em pouco mais de duas décadas, a China, por exemplo, produziu 400 milhões de novos consumidores. Mas não é só isso. Europa e EUA estão direcionando parte de sua produção de grãos para o etanol. Os americanos consumiam 15 milhões de toneladas para fazer o álcool combustível do milho; hoje, são 90 milhões de toneladas.

E o álcool combustível, vejam só, passou a ser visto como o vilão da baixa oferta de alimentos, o que levou o presidente Lula, na Holanda, a dizer um “não me venham culpar o etanol”. Disse a coisa certa neste caso: há mais demanda porque há mais gente comendo. Não em razão de políticas assistencialistas, mas da expansão da economia de mercado, especialmente na Ásia. E, em seguida, saiu-se com uma daquelas obviedades assustadoras: “Se todo mundo voltar a produzir mais, a gente vai ter mais riqueza, mais alimentos e menos inflação”. Bidu! O problema é como botar o guizo no pescoço do gato.

Economistas passam boa parte do seu tempo tentando resolver esses desequilíbrios que volta e meia sacodem o mundo e ganham ares de mistério. Mistério nenhum. Se mais gente está entrando no mercado, é preciso cuidar da oferta. Se há proporção entre uma coisa e outra, há equilíbrio. Não é que a oferta de alimentos tenha diminuído. Ela também cresceu, Mas não o suficiente. E, acreditem, o etanol — não o brasileiro — responde em parte por isso, sim.

A fala de Lula, já disse, está essencialmente correta. O pecado está em fazer parecer simples, rápida e mera questão de escolha o que é uma dinâmica da economia mundial que não tem solução imediata. Talvez o Brasil pudesse produzir mais alimentos do que produz hoje em dia. Se vocês fizerem uma pesquisa no noticiário de sete ou oito meses passados, a impressão que se tinha era a de que o país se transformaria num imenso canavial para suprir o mundo de etanol. Afinal, era preciso salvar o planeta.

Aquele aluvião passou, e a agricultura brasileira seguiu seu curso. Continua muito produtiva, sim. A “culpa” pela crise não é do Brasil. A Europa, subsidiando os seus agricultores, e os EUA, que preferem fazer seu etanol estupidamente caro, respondem pela produção insuficiente de grãos (os voltados para a alimentação). E se tivéssemos ainda mais soja, mais milho, mais comida e menos cana? Hoje, sem dúvida, isso seria muito bom. Mas a gente não é obrigado a se comportar como o celeiro do mundo, enquanto os fraceses, por exemplo, com pesados subsídios, tratam suas vaquinhas a pão-de-ló.

Primeiros efeitos
O que há de interessante em todo esse debate é que, queiram ou não, gostem ou não, os primeiros efeitos da paranóia — e o nome é este — do aquecimento global e da obsessão de reduzir a dependência do petróleo começam a surtir os seus efeitos. Como desconfiavam as pessoas sensatas, os que primeiro arcarão com as conseqüências serão os mais pobres. Eles pagarão — ou não pagarão porque não terão como — mais caro pelos alimentos. A inflação, é claro, afeta toda a economia. E será combatida, em vários países, com a elevação da taxa de juros — que, de novo, pune quem tem menos chances de se defender.

Que é que há? Teorias apocalípticas que varrem o planeta não são em vão. E reparem que isso que se vê é só um primeiro desdobramento, minúsculo, mínimo, quase nada, da pauta dos valentes. Decidiu-se fazer só um pouquinho de etanol a mais. Imaginem se todo o ideário — ou bestiário — fosse posto em prática. Os “humanistas”, como se vê, acenam com a morte em massa dos pobres.

Na contramão
A propósito de o mundo produzir mais comida, Lula deveria levar a sério a sua proposta. No Brasil, um movimento como o MST vive aterrorizando justamente quem produz. Os rizicultores da tal reserva Raposa/Serrado Sol (ver acima) são, claro, um pequeno grão de arroz na produção mundial de alimentos. Mas produzem. O governo do Brasil os está ameaçando com bala e cadeia.

Os que defendem que se dê a 15 mil índios um área do tamanho de Portugal são os mesmos que disseram que o mundo acabaria derretendo. Antes disso, não duvidem, muitos milhões morrerão é de fome, deixando a Terra mais "limpa", como quem os "poetas"...

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