Entrevista:O Estado inteligente
Quanto maior, pior - EDITORIAL O GLOBO
O Globo - 28/11/2011
A crise econômica e financeira que o chamado mundo desenvolvido atravessa certamente tem várias causas, mas é curioso que a falta de intervenção do Estado seja apontada como a principal. Ora, uma intervenção do Estado está entre as causas da confusão (subsídios imobiliários a famílias americanas de renda mais baixa).
Graças à nova dinâmica criada pelos processos de privatização ao redor do planeta, a partir dos anos 80, a economia mundial se tornou mais eficiente e permitiu que diversos países emergissem de uma situação de pobreza crônica e sem perspectivas. O socialismo, sistema baseado no planejamento central no qual o Estado se encarrega de definir o quê produzir e quem deve consumir, se degradou a ponto de o império soviético ruir por ele mesmo, na ausência quase total de sustentação econômica.
Mas, se o sopro de renovação propiciado pelas privatizações conseguiu abrir uma série de comportas que reprimiam forças produtivas latentes e criativas, por outro lado o Estado não chegou a encolher como deveria. Políticas de compensações sociais e subsídios diversos (com propósitos supostamente nobres) se multiplicaram, e o Estado continuou a crescer na maioria dos países. Em alguns, pelo avanço da carga tributária sobre a renda gerada, e em outros pelo excessivo endividamento.
No caso da Europa, do Japão e dos Estados Unidos, o financiamento de déficits públicos elevados e o endividamento excessivo serviram de lastro para a hipertrofia de sistemas finananceiros. E, por isso, quando a crise estourou, os governos saíram em socorro de instituições ameaçadas de quebrar, pois eram parte do problema.
Tanto os Estados Unidos como a Europa têm dificuldade para sair da crise porque não encontram espaço para reduzirem o déficit público. Não há mais quem queira financiá-lo a custos módicos. Para recuperar o crédito, os governos desses países terão de apresentar propostas viáveis, e críveis, de ajuste fiscal, o que até agora não ocorreu. Daí a crise se arrastar, sem que surja uma luz no fim do túnel.
O Brasil desta vez não foi arrastado pela crise porque felizmente promoveu um forte ajuste nas contas públicas desde 1998 e refez outros pilares da política econômica (adotando, por exemplo, os regimes de câmbio flutuante e de metas de inflação). A manutenção desses pilares - "neoliberais" ou não - é que tem permitido à economia brasileira conviver com a crise, da mesma maneira que outros países emergentes. Não somos mais devedores crônicos, dependentes de programas internacionais de assistência financeira.
Quando a política econômica se afastou desses balizamentos, no ano passado, devido às eleições, a inflação ameaçou sair de controle e outros desequilíbrios afloraram. O governo Dilma, diante do risco desse desvio, reassumiu o compromisso público de recolocar as finanças governamentais em ordem (promessa que efetivamente foi cumprida em 2011).
Mas a economia brasileira não terá fôlego para continuar a crescer se não houver um esforço para se aumentar a poupança doméstica e o investimento. Para isso, o déficit público tem de continuar a ser reduzido, de modo a liberar a poupança disponível para investimentos que deem mais competitividade ao país.
Se o Estado se mantiver como tal, o ajuste será muito difícil, assim como acontece hoje nas grandes economias. E perderemos uma ótima oportunidade.
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