José Pastore
Essa concepção, ainda existente, deixa de considerar detalhes importantes na comparação como, por exemplo, as diferenças de jornada de trabalho e das regras de aposentadoria.
Para fazer comparações rigorosas, as pesquisas disponíveis usam salário-hora e incorporam os benefícios da aposentadoria no valor presente da remuneração (Nelson Marconi, André Urani, Sigfried Bender e Reynaldo Gonçalves, Gastos Públicos com Pessoal: Uma Análise do Setor Público Brasileiro no Período 1992-2004, Mimeo, 2006; Yoshiaki Nakano, Salários no setor público são muito maiores do que no setor privado, Valor, 21/11/2006).
Além disso, essas pesquisas fazem comparações levando em conta as mesmas profissões, o mesmo tempo de experiência, o mesmo nível educacional e a mesma idade, o mesmo gênero, a mesma cor e as mesma localização geográfica dos profissionais.
Considerando tudo isso, os dados mais recentes (1992-2004) confirmam a diferença salarial em favor dos servidores estatutários. Em média, eles ganham mais do dobro de seus congêneres do setor privado. É uma diferença enorme.
Ao longo do tempo, os aumentos salariais no setor público foram mais generosos do que os do setor privado. Estes, na verdade, sofreram perdas. Entre 1981 e 1993, a média salarial caiu 21% em termos reais e voltou a crescer 20% entre 1994 e 2006. Ou seja, os empregados do setor privado ganham hoje o que ganhavam em 1981 (Naércio Menezes Filho, O mercado de trabalho nos últimos 25 anos, Valor, 30/11). No setor público os aumentos foram muito maiores, o que responde pela diferença de mais de 100% em favor dos servidores estatutários.
Para o lado das finanças públicas, esses aumentos têm efeitos cumulativos expressivos, porque se misturam com benefícios automáticos, como é o caso dos adicionais por tempo de serviço. Por isso, quando se pensa em contratar mais funcionários públicos, não basta calcular o acréscimo na folha do ano da contratação. É preciso levar em conta os efeitos futuros.
Para os cidadãos, o que interessa é saber se a qualidade dos serviços prestados pelos funcionários públicos melhorou com aumentos salariais concedidos e, nos casos de boa comparabilidade, se os serviços prestados pelos servidores são 100% melhores do que os prestados pelos empregados do setor privado.
Estas perguntas ficam sem respostas porque a produtividade é um conceito praticamente desconhecido no setor público. As poucas tentativas de medi-la foram abortadas. A categoria dos servidores públicos se rebelou contra dispositivo da reforma administrativa que previa a demissão por incompetência, incapacidade ou desinteresse do funcionário, tornando-o letra morta.
Bem diferente é a vida no setor privado. A força da concorrência não permite que uma empresa mantenha em seus quadros funcionários pouco produtivos. Isso põe a firma em risco.
Em vista das persistentes reclamações do público nas áreas de saúde, segurança, educação e Previdência, é provável que, se conseguíssemos medir a qualidade dos serviços públicos, a diferença de salários em favor dos funcionários ficaria maior ainda.
O presidente Lula confunde choque de gestão com aumento de contratações como se, ao inchar a máquina pública, estivesse garantido um melhor atendimento da população.
Essa teoria estranha corre a passos largos. No curto período de 2005 para 2006, houve um aumento de 404 mil funcionários públicos no Brasil. Foi o setor que mais gerou empregos, segundo os dados da Pnad publicados em 2007. Só em 2006, as despesas com pessoal aumentaram cerca de 15% em relação a 2005 e assim devem continuar para os próximos anos. O Estado não caberá dentro do PIB.
Não está na hora de se instituir mecanismos efetivos de aferição de qualidade e produtividade no setor público em vez de simplesmente contratar mais e mais funcionários?