Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, dezembro 11, 2007

Remuneração nos setores público e privado

José Pastore



Um estudo publicado por Nelson Marconi em 2003 mostrou que os funcionários públicos estatutários ganhavam mais do que seus congêneres do setor privado (A evolução do perfil da força de trabalho e das remunerações nos setores público e privado na década de 1990, Revista do Serviço Público, Ano 54, nº 1, janeiro-março, 2003). O achado ocasionou uma grande polêmica, pois, na concepção convencional, prevalecia o inverso.

Essa concepção, ainda existente, deixa de considerar detalhes importantes na comparação como, por exemplo, as diferenças de jornada de trabalho e das regras de aposentadoria.

Para fazer comparações rigorosas, as pesquisas disponíveis usam salário-hora e incorporam os benefícios da aposentadoria no valor presente da remuneração (Nelson Marconi, André Urani, Sigfried Bender e Reynaldo Gonçalves, Gastos Públicos com Pessoal: Uma Análise do Setor Público Brasileiro no Período 1992-2004, Mimeo, 2006; Yoshiaki Nakano, Salários no setor público são muito maiores do que no setor privado, Valor, 21/11/2006).

Além disso, essas pesquisas fazem comparações levando em conta as mesmas profissões, o mesmo tempo de experiência, o mesmo nível educacional e a mesma idade, o mesmo gênero, a mesma cor e as mesma localização geográfica dos profissionais.

Considerando tudo isso, os dados mais recentes (1992-2004) confirmam a diferença salarial em favor dos servidores estatutários. Em média, eles ganham mais do dobro de seus congêneres do setor privado. É uma diferença enorme.

Ao longo do tempo, os aumentos salariais no setor público foram mais generosos do que os do setor privado. Estes, na verdade, sofreram perdas. Entre 1981 e 1993, a média salarial caiu 21% em termos reais e voltou a crescer 20% entre 1994 e 2006. Ou seja, os empregados do setor privado ganham hoje o que ganhavam em 1981 (Naércio Menezes Filho, O mercado de trabalho nos últimos 25 anos, Valor, 30/11). No setor público os aumentos foram muito maiores, o que responde pela diferença de mais de 100% em favor dos servidores estatutários.

Para o lado das finanças públicas, esses aumentos têm efeitos cumulativos expressivos, porque se misturam com benefícios automáticos, como é o caso dos adicionais por tempo de serviço. Por isso, quando se pensa em contratar mais funcionários públicos, não basta calcular o acréscimo na folha do ano da contratação. É preciso levar em conta os efeitos futuros.

Para os cidadãos, o que interessa é saber se a qualidade dos serviços prestados pelos funcionários públicos melhorou com aumentos salariais concedidos e, nos casos de boa comparabilidade, se os serviços prestados pelos servidores são 100% melhores do que os prestados pelos empregados do setor privado.

Estas perguntas ficam sem respostas porque a produtividade é um conceito praticamente desconhecido no setor público. As poucas tentativas de medi-la foram abortadas. A categoria dos servidores públicos se rebelou contra dispositivo da reforma administrativa que previa a demissão por incompetência, incapacidade ou desinteresse do funcionário, tornando-o letra morta.

Bem diferente é a vida no setor privado. A força da concorrência não permite que uma empresa mantenha em seus quadros funcionários pouco produtivos. Isso põe a firma em risco.

Em vista das persistentes reclamações do público nas áreas de saúde, segurança, educação e Previdência, é provável que, se conseguíssemos medir a qualidade dos serviços públicos, a diferença de salários em favor dos funcionários ficaria maior ainda.

O presidente Lula confunde choque de gestão com aumento de contratações como se, ao inchar a máquina pública, estivesse garantido um melhor atendimento da população.

Essa teoria estranha corre a passos largos. No curto período de 2005 para 2006, houve um aumento de 404 mil funcionários públicos no Brasil. Foi o setor que mais gerou empregos, segundo os dados da Pnad publicados em 2007. Só em 2006, as despesas com pessoal aumentaram cerca de 15% em relação a 2005 e assim devem continuar para os próximos anos. O Estado não caberá dentro do PIB.

Não está na hora de se instituir mecanismos efetivos de aferição de qualidade e produtividade no setor público em vez de simplesmente contratar mais e mais funcionários?

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