Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, dezembro 11, 2007

Celso Ming Efeitos colaterais

O consumidor está feliz da vida com os prazos a perder de vista dos financiamentos bancários. Mas alguém precisa mandar fixar nos contratos de crédito um aviso, como o dos maços de cigarro. "O Ministério da Fazenda adverte: crédito a prazo longo demais e a juros fixos pode fazer mal à saúde econômica do devedor."

- Com 200 contos por mês a gente pode comprar um carro zerinho - comemorou na sexta-feira um taxista de São Paulo. O consumidor pensa do mesmo jeito: coube no salário, tá beleza! Desacostumado, se lambuza com o melado do crédito.

O problema é que os juros estão em queda. Mesmo que o Banco Central não baixe os juros básicos (Selic) nos próximos seis meses, é provável que a simples concorrência entre os bancos diminua os juros ao tomador de crédito. Quem toma um financiamento por até 84 meses se compromete a pagar os juros de hoje por sete anos. Bem antes disso, as taxas terão caído ao menos um terço.

Desde que as finanças do setor público começaram a descarrilar, nos anos 80, a prioridade macroeconômica foi garantir financiamento para o Tesouro. A dívida foi lá para cima e os juros também. A maioria dos recursos com que os bancos trabalhavam então era canalizada para a compra de títulos do Tesouro (aplicações de tesouraria). Os bancos desaprenderam sua principal função, que é de conceder crédito. Com os juros proibitivos, o mercado evitou recorrer aos bancos.

Com o Plano Real e depois que as finanças do setor público foram enquadradas pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pela observância de um superávit primário (sobra de arrecadação para o pagamento da dívida), reduziu-se a pressão para emissão de títulos públicos, os juros começaram a cair e passaram a sobrar recursos para o crédito. Desde 2004, as operações de crédito pela rede bancária aumentaram 86%, ou 23% ao ano. Hoje, as pessoas físicas ficam com 34% de um total de R$ 880,8 bilhões (até outubro).

A expansão do crédito é um dado positivo. Mostra o desenvolvimento de um setor antes atrofiado. Para comparar, em 2005, o crédito no Brasil correspondia a 26% do PIB (hoje está um pouco mais alto), enquanto nos Estados Unidos era de 284%; na Coréia do Sul, de 98%; e no Chile, de 67%.

Mas, quando se expande descontroladamente, traz dois efeitos colaterais : gera excesso de demanda, que, por sua vez, provoca alta da inflação, quando o consumo não é todo atendido pelo setor produtivo e pelas importações; e compromete o consumo futuro, na medida em que deixa o orçamento do consumidor sobrecarregado com dívidas.

Sempre vamos encontrar gente defendendo o ponto de vista de que é preciso deixar que o consumidor encontre seus limites e decida que prazo de financiamento assumir. O problema é que a falta de traquejo por desuso do crédito por tanto tempo deixou o consumidor abandonado. Ele precisa ser avisado das conseqüências de seu endividamento de longo prazo. Se estiverem dispostos ao fair-play com seus clientes, os próprios bancos poderiam se encarregar dessa tarefa educativa. Mas, se não tomarem a dianteira, o Banco Central e o Ministério da Fazenda deveriam exigir esse comportamento.

CONFIRA

O ministro Mantega disse ao jornal Financial Times que a principal função do fundo soberano que o governo vai criar é conter a valorização do real.

É a primeira vez que o governo Lula confessa que é preciso conter a valorização do real com compra de dólares. Até agora, o Banco Central só admitia essas compras "ou para compor reservas ou para reduzir a volatilidade no câmbio".

Conclusão - Se é assim, o patrimônio do fundo não poderá se limitar aos US$ 10 bi a US$ 15 bi admitidos. Será o que vier a ser necessário para evitar a valorização do real.

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