Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, dezembro 17, 2007

ENTREVISTA Arthur Virgílio

'Se são candidatos, vão compreender'
Líder defende decisão de derrubar CPMF, contra vontade de Serra e Aécio

O GLOBO

O senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) entrou em guerra aberta no partido e fora dele para evitar que os tucanos saíssem da batalha da CPMF como adesistas de última hora, rachados e patrocinadores da maior vitória política do presidente Lula.

Passados os momentos tensos, ele admite que houve uma séria briga com o governador de São Paulo, José Serra, mas diz que, se ele é candidato à sucessão de Lula em 2010, o tempo vai mostrar que estava certo.

Adriana Vasconcelos e Maria Lima
BRASÍLIA

 Como o senhor avalia a atuação do PSDB, que criou a CPMF e se tornou o principal responsável pela sua extinção?

VIRGÍLIO: O raciocínio de que teríamos de votar a favor da CPMF porque supostamente o PSDB a criou me obrigaria a voltar ao passado e casar com a minha primeira namorada. Se o governo não fosse perdulário e irresponsável fiscalmente, não precisaríamos dar tanta importância à CPMF. Vamos ver as vantagens do fim da CPMF: o Brasil amanheceu mais alegre. O preço dos alimentos tende a cair. A ata do Copom, que alerta sobre pressão inflacionária por causa de alimentos, tem o reforço da queda da CPMF. Não me digam amanhã que os juros pararam de cair por causa da CPMF, porque já haviam parado de cair há muito tempo. Vai desonerar o cidadão comum, que não tem conta em banco e o que tem, o empresário e os produtos que terminam mais caros e reduzem a competitividade da economia.

 O senhor se lembra de um presidente que tenha feito o que Lula fez para evitar a derrota no Senado, como mandar uma carta, lida antes da votação?

VIRGÍLIO: Um grande amigo no governo me disse que o governo não travou uma batalha fiscal, mas política. Porque se precisasse tanto do dinheiro da CPMF, não daria toda a receita para a saúde, como propôs no final. Se não dava tempo de negociar essa proposta antes, como tentamos lá atrás, como dava na última hora? Havia uma proposta maliciosa, sibilina, de ver o PSDB dividido, de procurar dividir para para reinar. Um Maquiavel, um tanto personagem de Gabriel García Márquez, mas meio estilizado para o nosso subcontinente.

 Apostou no racha do PSDB...

VIRGÍLIO: E procurou a partir daí ter uma oposição desmoralizada, esfrangalhada. Se nós recuássemos, o PSDB estaria hoje desmoralizado no país. Estaríamos com nossa relação atritada com o DEM, que também não seguraria seus senadores, e haveria uma queda tipo dominó. E não teríamos autoridade moral para pedir mais nada aos nossos companheiros dissidentes do PMDB como Jarbas Vasconcelos (PE), Geraldo Mesquita (AC) e Mão Santa (PI).

 O senhor temia o racha?

VIRGÍLIO: Temia que o meu partido se dividisse e o governo tivesse como lucro a divisão do meu partido e o enfraquecimento dos governadores, que, mais hora ou menos hora, vão compreender que, se são candidatos a presidente, precisavam da atitude que tomamos.

 Com mais R$ 120 bilhões da CPMF nos cofres, o senhor acha que o candidato de Lula seria imbatível em 2010?

VIRGÍLIO: Eu nem pensava nisso. Pensei, sim, na nossa dignidade e em manter a cabeça erguida diante dos dissidentes do PMDB, dos companheiros do DEM e dos cidadãos da base do governo que sustentaram o não contra todas as propostas que lhes fizeram. Aí eu chegava lá com cara de tacho, de Madalena arrependida e dizia: “Olha, pessoal, houve uma proposta muito boa para os nossos governadores, o governo prometeu, eu não sei se vai cumprir, mas eu sou bobo e vou acreditar que vão jogar tudo na saúde, que vai ser só por mais um ano a CPMF, embora a gente vá aprovar hoje por quatro anos a prorrogação”. E continuaria: “Por favor, vocês sejam piedosos e, se puderem, continuem me respeitando”. Eu não consigo imaginar que eles continuassem a me respeitar. E a pior pessoa a me julgar seria eu próprio, eu não me respeitaria.

 A unidade do PSDB não deixou um racha dentro do partido? Do senhor com o Serra?

VIRGÍLIO: Houve uma conversa dura em que ficou bem claro o interesse dele em que nós mudássemos de posição e a minha determinação de não mudar de posição. Mantenho por ele carinho, e vamos ver quem está certo no final. Com acerto ou erro, iríamos os 13 juntos. Aécio e Serra são candidatos a presidente. Eles precisam de um partido desmoralizado? Desmentido? Desmontado? Ou precisam de um partido afirmativo, debatedor, que provoque sonhos em seus militantes? Senti que esse gesto do Senado provocou sonhos na nossa militância, o partido voltou a ter utopia e as pessoas voltaram a acreditar que o PSDB é um partido firme. Isso é ruim para os governadores? Eles têm de procurar proximidade administrativa com o governo federal. Nós, ao contrário do que fazia a bancada do PT, aprovamos aprovamos quase tudo que Lula quis, desde que permitissem que interagíssemos e melhorássemos a qualidade dos projetos. Nunca fomos de tudo ou nada. Agora foi uma hora de tudo ou nada.

 O governo está ameaçando retaliar o setor produtivo, congelando, por exemplo, o pacote de política industrial. A líder do PT disse que sem CPMF não será possível aprovar a emenda 29 para a saúde.

VIRGÍLIO: Agindo com irresponsabilidade, gracinhas e retaliações, eles podem provocar uma nova reação do plenário. Não sou contra a aprovação da DRU, um instrumento importante de governabilidade. Mas eles ainda precisam da gente para aprovar no segundo turno. Se não quebrarmos os interstícios, o governo não aprova a DRU este ano. Isso criaria dificuldades para a formação do superávit, o que não quero, mas sobraria dinheiro para jogar na saúde. Se continua no jogo da mentirada, a nossa paciência continua enchendo de novo.

 O governo aprendeu com a derrota?

VIRGÍLIO: Eles são prepotentes. Raiva é problema dele. Não tenho nada a ver com o humor dele. Não sou psiquiatra, não sou lexotan. Agora, espero que não fale abaixo do que deve falar um presidente da República, porque se falar haverá reação. Se fizer o jogo da reação, não terá diálogo conosco. O que ele precisa mesmo não é ameaçar ninguém, mas fazer um ajuste fiscal de qualidade, com um corte de gastos de custeio. Se fizer isso e não for suficiente, a gente discute uma alternativa.

 Qual foi o papel do ex-presidente Fernando Henrique?

VIRGÍLIO: O presidente Fernando Henrique agiu com a consciência do homem de Estado que é. Ele é o meu principal conselheiro. Ele acha que agimos correto, que dando uma carta aberta ao Lula, para que continue gastando tudo e arrecadando tudo, só criaríamos um problema fiscal para o próximo governo. O resultado da votação pode propiciar agora a possibilidade de fazermos uma grande reforma tributária. Não é justo pensar que o presidente Fernando Henrique ficou, açodadamente, procurando impor uma derrota ao adversário. Isso seria apequenar o papel dele e ele não é uma pessoa pequena, mas grande.

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