Ao dizer que o DEM está contra a CPMF porque não tem relevância política, carece de perspectiva de poder e forma fileira entre os sonegadores - os únicos adversários do imposto do cheque, no dizer de Lula -, o presidente carimbou na testa do partido o selo da oposição intransigente e radical.
Tudo o que os democratas queriam. Principalmente agora, quando estão perto de realizar uma convenção nacional (12 de dezembro) para oficializar as mudanças já decididas há meses e, convenhamos, andavam meio sem assunto para tratar no encontro.
Planejavam, claro, uma sessão de pancadaria verbal no governo. Programaram também mostrar o novo logotipo do partido, divulgar um lote de três ou quatro bandeiras de luta sob o guarda-chuva da palavra-chave "segurança" e apresentar como estrelas convidadas um grupo de estudantes venezuelanos integrantes do movimento de oposição a Hugo Chávez.
José Maria Aznar, ex-primeiro-ministro espanhol e pivô do "por que não te calas?" do rei Juan Carlos a Chávez, viria, mas não vem. Entre outros motivos porque não quer mais polemizar sobre o assunto.
Nada de muito extraordinário. Um domingo de convenção em Brasília de um partido que já mandou no País e há algum tempo míngua nas águas da oposição. Tem um governador, um prefeito de capital importante e, no total, apenas 6 dos 100 prefeitos das cidades mais populosas do País.
Agora o partido fará isso na condição que lhe forneceu Lula: a de "enfant terrible" da oposição nacional.
O ganho muito provavelmente não será imediato. Ou talvez nem aconteça. A posição do presidente tampouco dará ao Democratas a robustez que ele não tem, muito menos a perspectiva de poder. Mas, exatamente por não tê-la, está muito mais à vontade que o PSDB para buscar sem freios caminhos que possam levá-lo ao eleitor.
Despojado de compromissos muito rígidos. Como dizia o PT antigamente, sem medo de ser feliz. Mas, até então, agia muito a reboque do antigo companheiro de governo; mais por não ter onde se escorar do que por gostar do modo tucano de fazer oposição.
Lula deu de presente um nicho, com divulgação nacional gratuita e direito a garoto-propaganda de primeiríssima grandeza.
E os eventuais prejuízos de servir de "sparring" a um presidente popular?
Na ótica do Democratas, nenhum. O partido não disputa o eleitorado preferencial de Lula, quer nadar nas águas da classe média e daí para cima. Exatamente onde se concentram os 60% da população contrários à CPMF e chamados pelo presidente de "sonegadores".
Para quem ainda transitava num limbo entre um novo nome não muito assimilável e a velha denominação (PFL) carregada do ranço do coronelismo, do apoio à ditadura e do fisiologismo foi uma bênção.
Oportunidade única de aparecer no noticiário, lançar nota oficial respondendo ao presidente, posar de ofendido e ainda ganhar destaque com a pecha de intransigente num período em que um dos defeitos apontados na oposição é o de ser transigente.
O fico
Em tese, a eleição para o novo presidente do Senado será para quarta-feira, dia seguinte ao julgamento do presidente licenciado, Renan Calheiros, na terça.
Mas isso só ocorrerá se ele renunciar ou for cassado. Se, como indicam todas as previsões, for absolvido, deve estender sua licença até o prazo legal, no fim do ano. Inclusive porque ainda há outras três representações contra ele na Casa e, além disso, o PMDB não chegou a um acordo sobre o substituto.
Resta, ainda, a hipótese de Calheiros renunciar preventivamente para facilitar a preservação do mandato. Decisão a ser tomada na última hora, em função do clima do dia e do transcorrer da sessão, desta vez aberta.
A temperatura, hoje, é amena. A maioria acha que a perda da presidência já é punição suficiente e foi o bastante também para melhorar a imagem do Senado junto ao público.
Paz na terra
Os correligionários do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), acham improdutiva a briga dos tucanos de São Paulo, divididos entre o apoio a Kassab e a candidatura própria de Geraldo Alckmin.
No conflito, o Democratas enxerga a possibilidade de perder. Na base da negociação, no entanto, acredita ser totalmente possível "integrar" Alckmin ao projeto Kassab.
Assegurando a ele desde já apoio à candidatura ao governo de São Paulo em 2010. O grupo do governador José Serra, favorável à reeleição do vice eleito com ele em 2004, atua na mesma linha.